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A "guerra santa" das FDLR no leste do Congo

Simone Schlindwein / gcs23 de fevereiro de 2015

A liderança dos rebeldes hutus das FDLR é extremamente católica. Eles lutam para regressar à "terra prometida", o Ruanda. Quem desiste, vai para o inferno, segundo a ideologia. Por isso, muitos não saem da milícia.

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Combatente das Forças Democráticas para a Libertação do Ruanda (FDLR)Foto: DW/S. Schlindwein

Há vinte anos que os rebeldes hutus das Forças Democráticas para a Libertação do Ruanda (FDLR) lutam contra o regime da sua terra natal a partir do leste da República Democrática do Congo. Para eles, esta é uma guerra santa. Os líderes da milícia são extremamente católicos. Rezam todos os dias, sobretudo antes de ir para combate. Com frequência, usam também terços ao pescoço.

Os líderes do grupo rebelde pregam a partir de um livro a que chamam "Profecia" e que reflete a ideologia das FDLR. Sobre o seu conteúdo, pouco se sabe – só são conhecidos alguns trechos.

No seio da milícia há um tenente-coronel a quem os rebeldes chamam de "arcebispo". Ele usa um aparelho de rádio para pregar, conta Alphonse Senyoni, que até há pouco tempo foi responsável pela gestão das tropas no comando das FDLR, mas desertou.

"O mais alto sacerdote das FDLR estudou num seminário ruandês antes do genocídio. Ele auto-intitula-se de 'arcebispo', é esse o seu nome de guerra. Quando os líderes da milícia querem passar uma mensagem a todos os combatentes usam o 'arcebispo', que divulga essa mensagem divina. Eu vi isso acontecer muitas vezes", diz Senyoni.

Kongo FDLR Kämpfer
Combatentes das FDLR rezam frequentemente, sobretudo antes dos combatesFoto: Simone Schlindwein

À espera da terra prometida

Os rebeldes hutus comparam-se com os israelitas, o povo escolhido por Deus nas escrituras. Eles sobrevivem no exílio e esperam ser conduzidos por um profeta de volta à terra prometida, de volta ao Ruanda.

Às unidades de combate, os rebeldes deram o nome de "Canaã" e "Sinai". O homem que comanda a linha da frente da milícia escolheu "Israel" ou "Ómega" como nomes de guerra.

Segundo a ideologia vigente, aqueles que, como Alphonse Senyoni, saem do grupo rebelde vão para o inferno. "Isso é claramente propaganda, mas também uma forma de levantar a moral dos combatentes", afirma o ex-rebelde.

A "guerra santa" e a ONU

Esta ideologia das FDLR é um grande obstáculo ao trabalho dos capacetes azuis na República Democrática do Congo. A missão das Nações Unidas no país tenta convencer os rebeldes das FDLR a entregar as armas voluntariamente e a regressar à sua terra natal, o Ruanda. Nos últimos 13 anos, 10 mil combatentes das FDLR foram desmobilizados, restam entre 1.000 e 1.500. Mas é difícil lutar contra a doutrina radical, admite o chefe do programa de desmobilização das Nações Unidas, Adriaan Verheul.

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"Provavelmente, temos de pensar em trazer líderes religiosos para falar também na rádio e assegurar aos combatentes das FDLR que estão a escolher o caminho certo", diz Verheul. "Mas sobra apenas o núcleo da milícia, a linha dura. No final, restam apenas os extremistas, líderes que temem perder tudo. Por isso eles usam métodos cada vez mais radicais."

Em 1994, muitos padres católicos foram duramente criticados pelo seu papel no genocídio no Ruanda. Houve sacerdotes que denunciaram aos autores do massacre, da maioria hutu, quais as igrejas em que os tutsis tinham procurado refúgio, ficando de braços cruzados perante o genocídio. Até hoje, o Vaticano não pediu oficialmente desculpa pelo sucedido.

Nos últimos anos, representantes da Igreja tentaram com frequência entrar em contacto com as FDLR. A instituição protestante ECC (Eglise de Christ de Congo) tenta convencer os líderes das FDLR a entregar as armas voluntariamente. A Comunidade católica de Santo Egídio, em Roma, tem também tentado organizar conversações entre as FDLR, o Governo do Congo e as Nações Unidas, a última vez em julho de 2014.

Kongo FDLR Kirche im Dschungel
Igreja das FDLR no leste do CongoFoto: Simone Schlindwein