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Manuel de Araújo: "Estas foram as piores eleições de sempre"

12 de outubro de 2023

O autarca de Quelimane e cabeça de lista da RENAMO, Manuel de Araújo, fala à DW sobre a sua detenção durante a madrugada. E diz que as eleições autárquicas em Moçambique foram as piores de sempre: "Parecia uma guerra".

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Autarca de Quelimane, Manuel de Araújo
Foto: Marcelino Mueia/DW

O Secretariado Técnico da Administração Eleitoral (STAE) confirmou hoje que ainda não recebeu qualquer resultado das eleições autárquicas nos 65 municípios, mas a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) já anunciou que venceu em quatro deles: Maputo, Matola, Nampula e Quelimane.

Em entrevista à DW África, o edil de Quelimane e cabeça de lista da RENAMO, Manuel de Araújo, denuncia várias irregularidades no processo, incluindo o enchimento de urnas e a mobilização de tropas e tanques para a cidade. Fala também sobre a sua detenção, na madrugada desta quinta-feira (12.10).

A Polícia da República de Moçambique (PRM) alegou que o autarca estava a "perturbar" as assembleias de voto, por isso conduziu-o à esquadra "para efeitos de triagem". À DW, Manuel de Araújo diz que a "única explicação" que encontra para este episódio é que "Moçambique está a voltar para os tempos do partido único e da ditadura".

DW África: Estas foram eleições livres, justas e transparentes?

Manuel de Araújo (MA): Só alguém estúpido poderia responder afirmativamente, pois acho que estas foram as piores eleições de sempre. Eu já participei em cerca de dez eleições, mas estas – digo-lhe com franqueza – foram as piores eleições, as mais violentas. Isto parecia uma guerra. Havia tanques de guerra e homens encapuzados nas estradas.

A estratégia que a FRELIMO adotou foi a seguinte: onde o partido RENAMO estivesse a ganhar, os presidentes das mesas não deveriam assinar as atas, para não haver elementos de prova e poder anunciar a vitória da FRELIMO.

DW África: Porque é que estas foram as "piores eleições" e as "mais violentas"?

MA: Tenho informação de fonte fidedigna da polícia de que cerca de 4.000 militares foram mobilizados para a cidade de Quelimane. Havia tanques que nunca vi e até fiz uma pergunta: "Se temos tantos militares e tanto armamento, porque é que não vão para Cabo Delgado combater o terrorismo? O que estão a fazer num ambiente de eleições?"

E bateram em muitas pessoas, lançaram gás lacrimogéneo em mais de 15 escolas…

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DW África: Constatou também indícios de outros atos ilícitos?

MA: Nós temos provas. Isso foi provado em tribunal. A secretária provincial da Organização da Mulher Moçambicana (OMM), o braço feminino do partido FRELIMO, foi flagrada com 15 votos já marcados, que pretendia meter na urna. Os nossos jovens, que estavam preparados para isso, identificaram-na, neutralizaram-na e o nosso gabinete jurídico processou-a. Levámos o caso à Procuradoria-Geral da República e ontem mesmo, à noite, ela foi julgada e condenada.

O secretário distrital da Organização da Juventude Moçambicana (OJM), o braço juvenil do partido FRELIMO, na cidade de Quelimane, também foi flagrado. Foi julgado às duas da manhã de hoje e condenado a seis meses de prisão efetiva. Está neste momento na cadeia. Um terceiro jovem também foi condenado a seis meses [de prisão] por tentativa de enchimento de urnas.

Isto não são suposições. São factos provados em tribunal. Eu presenciei os três julgamentos. Houve enchimento de urnas em todas as mesas.

DW África: Você foi detido hoje e depois libertado. Como explica o que aconteceu?

MA: A única explicação que encontro é que Moçambique está a voltar para os tempos do partido único e da ditadura. O comandante da Unidade de Intervenção Rápida chegou ao local onde me encontrava [a conversar] com um pelotão de cerca de 10 agentes da PRM sobre como eles tinham passado o dia. Eles próprios tinham algumas dúvidas sobre o processo eleitoral – como o presidente de uma mesa se recusava a assinar uma ata, e já estavam à espera há várias horas, eles queriam saber se, como polícias, podiam permitir que as urnas fossem levadas para o Secretariado Técnico da Administração Eleitoral. Eu esclareci-lhes que não. Foi nessa altura que chegou o comandante da Unidade de Intervenção Rápida e perguntou aos colegas se eles não tinham trabalho a fazer. Perguntou se o trabalho deles era falar comigo. Eu fiquei boquiaberto, não estava a perceber o que se passava.

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DW África: Foi nessa altura que foi detido?

MA: Ele deu uma ordem [aos polícias que estavam comigo] para que dispersassem, e eles obedeceram. Depois, ordenou a doze agentes - que vinham com as caras tapadas - para me cercarem. Eles pegaram em mim, lançaram-me para a traseira do carro, como se eu fosse um saco. Eu não sabia para onde ia, nem porque me estavam a deter. [Já na esquadra], chegou o procurador provincial e eu expliquei-lhe o que tinha acontecido. Ele disse-me que não via razões para eu permanecer ali. Não me foi dada qualquer satisfação, mas eles libertaram-me.

Entretanto, uma moldura humana - mais de quatro ou cinco mil pessoas, os munícipes da cidade - teve conhecimento da minha detenção e foi em direção à esquadra. Foi nessa altura que me libertaram. Eu fui ter com eles e caminhámos pela cidade para comemorar a minha vitória e a minha liberdade. Mas ontem também foi Dia do Professor e o dia do meu aniversário. Havia muitas coisas para comemorar.

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