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"Os grandes devedores da LAM são entidades governamentais"

6 de maio de 2022

Economista Thomas Selemane, ouvido pela DW, não tem dúvidas de que a dívida da Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), coloca em risco continuidade da empresa. A resolução depende "de quem dirige o país", afirma.

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Mosambik Fluggesellschaft LAM
Foto: DW/J. Carlos

Em declarações recentes à imprensa, publicadas no jornal "O País", o diretor-geral da Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), João Pó Jorge, assumiu que a companhia aérea de bandeira do país não "está a conseguir sanear a dívida” porque ainda não existe um plano de reestruturação.

Questionado pela DW sobre a atual situação da companhia aérea nacional, Thomas Selemane é peremptório em afirmar que a avultada dívida da empresa - estimada em sete mil milhões de meticais - coloca em risco a continuidade da sua operação e que só o governo pode resolver os problemas da LAM.

Segundo o economista moçambicano, as raízes destes problemas são tão "estruturais" que a resolução "não depende de quem se senta nos escritórios da LAM, mas de quem está a dirigir o país”. Isto porque, acrescenta, os maiores devedores da companhia são ministérios do próprio Executivo ou clientes do Estado.

DW África: Em 2018, o anúncio da nova direção da LAM trazia esperança para a companhia aérea. No entanto, quatro anos depois, os problemas financeiros mantêm-se. A que se deve esta estagnação?

Thomas Selemane Centro de Integridade Pública CIP
Thomas SelemaneFoto: DW/Johannes Beck

Thomas Selemane (TS): Penso que a estagnação deve-se a duas principais razões. Uma primeira que é estrutural, que tem que ver com a falha do Estado moçambicano em não conseguir fazer da LAM uma verdadeira empresa, uma verdadeira companhia aérea, que gera lucros com uma gestão empresarial como deve ser, sem 'politiquices'. A segunda razão que leva a que a LAM esteja nessa situação é a razão de mercado. Diz respeito à falta de capacidade da empresa em responder à demanda do transporte aéreo nos últimos quatro ou cinco anos.

DW África: Portanto, descarta a justificação da empresa que associa este fracasso também à Covid-19…

TS: A Covid-19, no caso de Moçambique, só chegou praticamente em meados de 2020, e já tinha passado metade do tempo de compromisso da equipa de gestão da LAM. É verdade que a pandemia afetou gravemente o desempenho empresarial da LAM, e de várias outras empresas, não só em Moçambique como no mundo. Mas também é verdade que, pelos relatórios e contas da companhia aérea, mesmo sem a Covid-19, não acredito que agora, em maio de 2022, a LAM estivesse numa situação melhor do que a que está. Porque, para mim, as questões fundamentais que colocam a LAM 'na lama' não estão a ser resolvidas.

DW África: E quais são essas questões?

TS: Em primeiro lugar, a ineficiência da empresa, caracterizada pelo excesso de trabalhadores e colaboradores tendo em conta a verdadeira dimensão da empresa. Em segundo, a interferência política que a LAM tem de vários clientes do Governo e do Estado que viajam na companhia, sem pagar, ou acumulam dívidas que nunca são pagas. É extremamente grave.

DW África: O diretor-geral da LAM disse recentemente que ainda não existe um plano de reestruturação para a empresa. É justificável, quatro anos depois da tomada de posse da nova administração?

Aeroporto de Maputo (Arquivo)
Aeroporto de Maputo (Arquivo)Foto: Johannes Beck

TS: Não é justificável do ponto de vista técnico, porque nenhuma empresa do mundo fica quatro anos com as contas 'no vermelho' e sem um plano de reestruturação. Isso simplesmente não existe. Porque é que isso acontece aqui? Acontece porque o Estado moçambicano faz de tudo para fazer da LAM não uma empresa, mas um instrumento de desempenho, fortificação e de manutenção de poder. Não é por acaso que os grandes devedores são ministérios, institutos públicos e outras entidades governamentais.

DW África: Esta dívida da LAM, que ronda atualmente os 7 mil milhões de meticais, pode pôr em causa a atividade da empresa?

TS: Não pode pôr, já põe em causa a continuidade da empresa porque as operações da LAM hoje são minimalistas. Minimalistas no sentido em que a empresa só consegue fazer os voos indispensáveis. Tem um avião que faz, no mesmo dia, três a quatro rotas. Isso é simplesmente insustentável. O risco de falhanço e de quebra de operações da LAM não está distante. É um risco que toda a gente está a ver a cada dia.

DW África: Ainda assim, a administração da companhia aérea voltou a afirmar que prevê aumentar a sua frota e o número de rotas até 2030. Parece-lhe um plano exequível? 

TS: Não me parece. O que a LAM devia dizer é que vai fazer um planeamento da empresa. Não nos pode prometer aumento de frota. A empresa tem de resolver as dívidas, tem de resolver a ineficiência. Sem isso, nenhum banco hoje dá dinheiro à companhia. Como é que vão aumentar a frota? É impossível. O Estado moçambicano não tem dinheiro para dar à LAM, e nem o Fundo Monetário Internacional (FMI) nem o Banco Mundial vão deixar.

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