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Entrevista

Stefan Dege (ca)19 de julho de 2007

O Barão Philipp von Boeselager é o último conspirador sobrevivente do atentado contra Hitler. Ele falou à DW-WORLD sobre resistência, consciência e sobre o filme de Tom Cruise, cujas filmagens se iniciam nesta semana.

https://p.dw.com/p/BJpP
Barão Philipp von BoeselagerFoto: DW/Stefan Dege

DW-WORLD: Barão von Boeselager, como o senhor definiria sua atitude perante o Estado?

Barão Philipp von Boeselager: Eu observo, na medida do possível, de forma bastante crítica tudo o que acontece. E quando eu acho que há uma anomalia, eu me posiciono, pois sou um homem livre. E foi por essa liberdade e independência que Stauffenberg e todos nós nos engajamos no passado. Para que todos possam e devam falar, abertamente, sua opinião, quando acharem que a coisa não está funcionando como deveria.

Isto também envolve a disposição para a resistência?

Sim, se acontece algo de errado e, sobretudo, contra a minha consciência, então tenho que estar disposto a oferecer resistência. Primeiramente, talvez, com um pequeno artigo, quando se trata de algo inofensivo. E quando se agrava, então o ditado prussiano "Ordem é ordem" não vale mais.

Em casos sérios vale a regra "A consciência vem antes da obediência". Naturalmente deve-se tratar de uma consciência impregnada pelo cristianismo, não qualquer tipo de consciência. No entanto, quando querem que eu faça algo contrário à minha consciência, então tenho que me proteger. Tenho então que resistir.

Com, exatamente, o senhor entrou para a resistência?

Philipp Freiherr von Boeselager
DW entrevista Von BoeselagerFoto: DW/Stefan Dege

A resistência tornou-se para mim relevante e decidi participar quando escutei falar dos crimes de Hitler. A partir de 1942, fiz parte do comando do grupo do Exército Mitte, onde escutei pessoalmente dos chefes da SS que matariam judeus e ciganos de forma arbitrária. Até aquela data, pensava que eram só boatos ou casos particulares, então escutei, pela primeira vez, de um chefe da SS: "Vamos matar todos os judeus e ciganos".

Não me tornei oficial para acobertar tal fato. Isto me levou à resistência: a pátria que eu amava estar ligada a crimes hediondos que levaram á morte de milhões. E quando, um dia, o general Von Treskow me perguntou: "Você participa? Temos que matar o homem!" – na ocasião, nada me restava a não ser dizer sim. Fiz contra minha vontade, pois sabia as conseqüências que teria.

Como qualquer outro, eu não queria ser enforcado ou fuzilado. Passei más noites pensando no assunto, mas nada mais me restava, se quisesse continuar a dormir mais ou menos bem, do que dizer: "Sim! Eu participo!".

De dúvidas de julgamento até uma conspiração é um longo caminho. Quando começou a ser realmente uma conspiração?

No meu caso, começaram a crescer o mal-estar perante os nazistas e a certeza de que Hitler e os outros eram criminosos, sem mencionar o fato de que eles estavam nos levando a perder a guerra. Isto já estava claro em 1942. Normalmente, uma guerra acaba, se já está perdida. Se, mesmo assim, continuam com ela, então cada novo dia é um crime: pessoas são sacrificadas sem que haja masi uma meta bélica em vista. Como não era o caso, não tínhamos outra opção senão matar Hitler.

Foi um processo muito demorado, pois assassinato é assassinato. Para mim, isso era absolutamente claro. Eu deveria participar, no início, em um atentado a pistola, idéia que foi deixada de lado no último momento. E, mais tarde, providenciei os explosivos para o atentado. Cavalguei então, como minha unidade, para Berlim, a fim de assegurar a cidade, após o sucesso do atentado.

Não foi fácil, pois sabia que ele muito provavelmente fracassaria. E em caso de sucesso, a frente ocidental alemã capitularia imediatamente. E, mesmo assim, as pessoas da Prússia Oriental, Silésia e Pomerânia seriam, da mesma forma, evacuadas. E elas diriam: "Se Hitler estivesse vivo, estaríamos ainda na Prússia Oriental", porque tinham confiança em Hitler.

Elas teriam nos matado, por lhes ter tirado a pátria. O atentado se tornaria a famosa "lenda do punhal nas costas" [teoria de conspiração para explicar a perda da guerra]. Se o atentado funcionasse, seríamos mortos pelos alemães, se não, seríamos pegos pelos nazistas. Ou seja, a perspectiva não era boa, e estávamos conscientes disto. Apesar de tudo, tínhamos que empreender algo para acabar com os crimes, não importava o que acontecesse.

A filmagem do atentado é, atualmente, bastante discutida, entre outras razões porque Tom Cruise, como cientologista confesso, deverá fazer o papel de Von Stauffenberg. Como o senhor vê o assunto?

Bildkombo Tom Cruise - Claus Schenk Graf von Stauffenberg
Tom Cruise fará o papel de Von StauffenbergFoto: AP

Tom Cruise, até quanto eu saiba, é um dos atores mais famosos do mundo. Se ele fizer o filme, a resistência ficará conhecida nos Estados Unidos e, sobretudo, nos países de língua inglesa. Eles proibiram, no passado, livros sobre a resistência. A existência da resistência alemã era negada. Se Cruise vier a usar o filme e o papel de Stauffenberg para fazer propaganda para sua comunidade, isto deve ser, naturalmente, rejeitado. Esta comunidade quer, claramente, através de caminhos autoritários, criar uma raça superior, e suas metas são, em parte, semelhantes a dos nazistas. Ou seja, justamente o contrário daquilo pelo qual Von Stauffenberg morreu. Isso é grotesco, claro.

Philipp Von Boeselager, nascido em 1917, já havia participado em uma tentativa de atentado contra Hitler em 1943. Hitler deveria ser assassinado durante um vôo sobre a frente oriental. O atentado falhou, porque o detonador das bombas congelou, na frente russa. Em 20 de julho de 1944, Von Boeselager comandava uma unidade da cavalaria, que deveria ocupar Berlim após o atentado. Quando soube do fracasso, deu comando de meia volta, voltando à antiga posição, para passar despercebido. Ele sobreviveu, porque todos os outros co-conspiradores se calaram.