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A voz negra do pop alemão

Marcio Weichert2 de julho de 2003

Cantores negros nascidos ou radicados na Alemanha conquistam cada vez mais espaço na tevê e nas rádios. Interpretando sobretudo rap e hiphop. Seus clipes parecem Made in USA, mas eles cantam em alemão.

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Seeed, ritmo jamaicano em Berlim

Se o som estiver desligado, quando começam a rolar na tevê as imagens dos clipes de ASD, Seeed, DJ Tomekk e Trooper Da Don, é provável que quem não os conheça pense se tratar de mais uma dupla, banda ou intérprete americano. A estética parece idêntica. Negros paquerando diante de casas luxuosas tipo Beverly Hills, ou atravessando um deserto em alta velocidade num jipão, ou ainda reunidos em família diante de um carro da primeira metade do século 20 e vestidos conforme a moda da época, num porto, com pinta de gângsteres.

Mas aumente-se o volume e se descobrirá que eles cantam em alemão. Para muitos, cantar qualquer coisa neste idioma parece uma grosseria. Mesmo para autores de óperas, compor em alemão era um desafio. Esta turma de rappers e hiphoppers está entretanto aí para mandar seu recado e mostrar que o idioma é musical, inclusive em estilos que têm suas origens na black music.

ASD & Music Monks, hits do momento

"Escutem os beats, os flows, os textos / Nós temos muito mais para vocês do que mero rap em alemão", advertem Afrob e Samy Deluxe, a dupla de ASD, nos versos de Sneak Preview, do single que antecedeu o atual álbum Wer hätte das gedacht? (Quem teria imaginado isto?), lançado em março. É a primeira vez que os dois trabalham juntos. O single esteve por várias semanas entre os dez mais vendidos na Alemanha. Nascido na Itália, Afrob cresceu em Braunschweig e hoje vive em Stuttgart. Já Samy vem de Hamburgo. A ASD é considerada, por muitos críticos, um dos mais queridos projetos de rap alemão.

Quem está atualmente entre os top ten é o álbum Music Monks, do Seeed, de Berlim. A repetição da vogal no nome é uma referência ao trio de MCs que encabeça os 11 integrantes do grupo: Enuff, Eased e Ear. O restante forma a banda ou dança. Atuando junto desde 1998, o Seeed faz mais o estilo dancehall reggae, influenciado pelo ritmo jamaicano. O grupo possui, entretanto, um único membro vindo do Caribe. Alfi cuida da percussão.

E, se os intérpretes da cena rap e hiphop alemã costumam compor canções bilíngües, o Seeed vai mais longe, adicionando o patoá (dialeto francês) ao alemão e ao inglês. No ano passado, o grupo faturou dois prêmios Echo, da indústria fonográfica alemã, que os considerou a revelação nacional com seu primeiro álbum, New Dubby Conquerors (2001).

DJ Tomekk aproveitou sua oportunidade

Muito badalado também é o DJ Tomekk, filho de um pianista marroquino com uma polonesa. Nascido Tomasz Kuklicz em Cracóvia, o músico de 26 anos figura entre os três mais conhecidos deejays de hiphop da Alemanha. Mas antes de fazer sucesso no país em que vive, Tomasz estourou nos EUA em 1994. Ele tinha um programa de rádio em Berlim quando, no ano anterior, Kurtis Blow se apresentaria na capital alemã.

DJ Tomekk
DJ Tomekk, um dos mais conhecidos deejays da AlemanhaFoto: David Cuenca/BMG

O rapaz de então 17 anos conseguiu uma entrevista com o astro do hiphop americano, a quem sonhava convencer de suas habilidades como DJ. Quis o acaso que o deejay de Kurtis naquela noite não pudesse se apresentar, e o garoto polonês aproveitou a oportunidade. Após o show, o ídolo convidou o fã para acompanhá-lo em sua turnê pelos EUA. Nascia assim DJ Tomekk, o primeiro não-americano a ser indicado para o Annual Rap Music Award na categoria Melhor DJ.

Trooper Da Don
Trooper Da Don, apadrinhado de Tomekk

Hoje seu status é tão grande que iniciantes procuram seu apoio. Um de seus apadrinhados é Trooper Da Don, que já fez dupla com Sabrina Setlur. DJ Tomekk promoveu o encontro de Trooper com a filha de filipina Vanessa, uma das revelações do programa de tevê Alemanha procura o superstar. Produzido em parte pelo padrinho, a melô Ride or die (I need you) tem seu videoclipe rolando com freqüência nos canais especializados. Apesar do título, a letra da canção é basicamente em alemão, ficando o inglês para os refrões.

Best-seller

O maior expoente negro da música pop alemã é, entretanto, Xavier Naidoo. Filho de mãe sul-africana e pai de ascendência indiana, o cantor de 31 anos está em seu terceiro álbum. O primeiro, de 1998, vendeu mais de um milhão de exemplares. No momento, Xavier aparece nas paradas com a balada Ich kenne nichts, gravada a convite para o single do americano RZA. Ao contrário dos demais, o popstar é religioso e seu estilo é romântico, com ritmo soul.

Os pioneiros

Precursor desta avalanche de negros na música alemã pode ser considerado o cubano Roberto Blanco, hoje com 66 anos. Apesar de sua nacionalidade, o cantor pôs os pés em sua pátria pela primeira vez em 1986, quando já era famoso. Roberto nasceu na Tunísia em 1937 e cresceu no Líbano e na Espanha.

Roberto Blanco
Roberto Blanco, o cubano que canta música popular alemãFoto: AP

Aos 19 anos, conheceu o cineasta alemão Alfred Weidemann e ganhou um papel no filme Der Stern von Afrika (A estrela da África), de 1956. No ano seguinte, com a canção Jesebell, o cubano derrotou outros 1800 candidatos no concurso de calouros Uma Chance Para a Nova Geração, da emissora pública ARD, da Alemanha. O passo seguinte para o estrelato foi apresentar-se ao lado de Josephine Baker.

Radicado na Alemanha, Roberto conquistou os fãs de música popular e folclórica alemã. Após muitos LPs, álbuns e canções de sucesso, o cubano transformou-se em figura fácil nos palcos dos auditórios das tevês alemãs. Ele já teve até programas próprios e ainda costuma ser chamado para apresentar transmissões especiais.

Mais recentemente, no fim da década de 1990, o público alemão cantou e dançou embalado por outro negro. Nascido na Alemanha, Lou Bega tem pai ugandense e mãe siciliana. Sua regravação do clássico Mambo Nº5, dos anos 1950, com toques de música eletrônica, tornou-se um hit mundial, inclusive no Brasil.