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As perspectivas para o Brasil em 2016

Jean-Philip Struck24 de dezembro de 2015

Dilma ganhou fôlego nas últimas semanas, mas temor de impeachment não foi afastado e dominará a agenda também no início do próximo ano. Turbulências na economia e na política devem continuar a castigar o país.

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Foto: Getty Images/AFP/Evaristo Sa

"De tédio, nenhum de vocês morreu este ano", disse o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a um grupo de jornalistas ao avaliar a política brasileira em 2015.

Especialistas ouvidos pela DW disseram que a crise política e econômica que engoliu o Brasil dificulta qualquer previsão para 2016, mesmo para o primeiro semestre. O único consenso é que a turbulência de 2015 vai continuar no próximo ano. E o fim dela continua imprevisível.

Na política, a partir de fevereiro – quando acaba o recesso parlamentar e do Judiciário –, o país deve mais uma vez acompanhar as discussões sobre o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, a continuidade da novela sobre o futuro de Cunha no comando da Câmara, mais discussões sobre o ajuste fiscal e a divisão interna no PMDB.

"A expectativa de que esses conflitos não resolvidos vão continuar sinaliza que 2016 vai ser um ano de muitas incertezas", afirma o cientista político Rafael Cortez, da consultoria Tendências. E esses acontecimentos se darão num ano de eleições municipais e, segundo economistas, de provável continuidade da crise econômica, ao menos em alguns setores.

Economia

"As crises na política e na economia vão continuar indissociáveis no ano que vem. O quadro na economia continua pessimista quando se observa o que governo será capaz de fazer. Sem reformas, os problemas do desemprego e da inflação tendem a continuar graves", afirma o economista Raul Velloso.

Brasilien Eduardo Cunha Parlamenstpräsident
Cunha é o principal articulador do impeachment e começa o ano enfrentando processo de cassaçãoFoto: Reuters/U. Marcelino

Há números para embasar essas previsões. O Banco Central estimou nesta quarta-feira (23/12) que o Produto Interno Bruto (PIB) teve uma retração de 3,6% em 2015 – o maior recuo desde 1990. Em 2016, deve ocorrer uma nova queda, de 1,9%, segundo os cálculos da autoridade monetária, que afirmou que a estimativa "incorpora cenário de incertezas associadas a eventos não econômicos".

Já a inflação anual deve chegar a 9,2% no final do primeiro trimestre, mas recuar para 6,2% em dezembro – um pouco abaixo do teto.

Outros números são mais otimistas. O Ministério do Desenvolvimento prevê um superávit de 35 bilhões de dólares na balança comercial – puxado pela maior exportação de grãos e pela desvalorização cambial. O resultado deve ser muito superior ao deste ano, que pode chegar a 17 bilhões de dólares.

Dilma e Cunha

Dilma e Cunha vão começar o ano da mesma forma que terminaram: lutando para preservar seus mandatos. A expectativa no meio político é que o processo de impeachment comece efetivamente a andar na Câmara a partir de fevereiro. A presidente, no entanto, está numa situação mais confortável graças às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), que delineou um "mapa" para o processo em que o Senado – onde Dilma ainda conta com mais aliados – ganhou mais poder para barrar o afastamento. E também graças ao parecer do relator da Comissão Mista de Orçamento do Congresso, Acir Gurgacz, que recomendou a aprovação das contas de 2014 da presidente.

"Só que essa situação mais confortável vai ser confrontada com um cenário de crise econômica, em que acordos políticos ganham um caráter provisório, não é possível precisar se eles vão se manter", afirma o cientista político Cortez, avaliando que a presidente segue fragilizada, apesar das vitórias recentes.

Dilma também enfrenta uma ameaça no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde correm ações que pedem a anulação da sua chapa nas últimas eleições por abuso de poder econômico. Alguns setores da oposição, especialmente do PSDB, começam a apostar mais nessa frente, avaliando que o processo de impeachment na Câmara foi dificultado pelas decisões do STF e que seu respaldo está contaminado pelas intervenções de Cunha.

Para o especialista em direito eleitoral João Fernando Lopes de Carvalho, as ações que correm no TSE não devem ser subestimadas. "No caso de um presidente, nunca algo do tipo havia avançado tanto", afirma.

Dilma, apesar de algumas vitórias nas últimas semanas, deve iniciar 2016 com outros números ruins. Segundo a pesquisa Datafolha de 19 de dezembro, ela tem 65% de reprovação. Os números, porém, sugerem que o auge da impopularidade da presidente está passando. Em agosto, a reprovação chegara a 71%.

Já Cunha começa o ano enfrentando um processo de cassação no Conselho de Ética da Câmara e um pedido de afastamento pela Procuradoria-Geral da República. Ambas as ações só deverão ser analisadas a partir de fevereiro. Até lá, ele deve continuar no seu papel de principal articulador do impeachment de Dilma. O deputado já avisou que trabalha para que o trâmite na Câmara esteja concluído até março.

Já no PMDB, o racha entre as forças do partido deve continuar em 2016. "O PMDB continua sem coesão. E a continuidade da Operação Lava Jato, que agora está se concentrando em figuras do partido, mostrou que a alternativa de um governo do vice-presidente Michel Temer também seria turbulenta, o que enfraqueceu esse projeto", afirma Cortez.

Ainda na política, o ano deve ser de discussões sobre temas controversos na Câmara. Devem chegar ao plenário o projeto do Estatuto de Família, a revisão do Estatuto do Desarmamento e o novo Código de Mineração.

Eleições

O próximo ano também será palco das primeiras eleições desde o início da turbulência política. O pleito em que os brasileiros escolherão seus novos prefeitos e vereadores será marcado por uma novidade: a proibição do financiamento de campanhas por parte de empresas.

Lula sobre o impeachment em Berlim

Vários políticos ainda têm dúvidas sobre como arrecadarão recursos para suas campanhas. Cunha já afirmou que prevê um "caos total". Outros são mais otimistas e dizem que as novas regras vão tornar as campanhas mais equilibradas. "Sem tanto dinheiro, os partidos terão que encontrar outras formas de se aproximar dos eleitores. O marketing como conhecemos deve perder espaço e dar lugar a outras formas", afirma o jurista e ex-desembargador Walter Maierovitch.

Em meio a esse cenário, o Brasil também deve observar um número recorde de prefeitos que vão se lançar à reeleição nos grandes centros do país. Nas capitais, pelo menos 22 dos 26 prefeitos estão aptos a concorrer a um novo mandato. Os primeiros sinais não são favoráveis para a maioria dos ocupantes, que aparecem atrás nas pesquisas de intenção de voto já divulgadas. Em São Paulo, o prefeito Fernando Haddad (PT), por exemplo, apareceu em quarto lugar na mais recente pesquisa do Datafolha.

Lava Jato

Segundo a Polícia Federal, a operação que mantém o Brasil em suspense desde 2014 deve começar o ano mirando os contratos de obras relacionadas aos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, que chegam a cerca de 40 bilhões de reais.

Também no âmbito da Lava Jato, o STF deve analisar as denúncias já apresentadas contra seis parlamentares, que podem passar para condição de réus. Neste grupo estão os senadores Delcídio do Amaral (PT-MS), Fernando Collor de Mello (PTB-AL) e Benedito de Lira (PP-AL); e os deputados Eduardo Cunha, Arthur de Lira (PP-AL) e Nelson Meurer (PP-PR).

Há também expectativa em relação aos cinco inquéritos que tramitam no STF contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que ainda não foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República.

Procuradores também afirmam que estão estudando medidas para responsabilizar os partidos políticos suspeitos de se beneficiarem dos desvios na Petrobras. Caso prospere, essa iniciativa deve atingir em cheio o PT, o PMDB e o PP, que podem ficar sujeitos à retenção de valores dos fundos partidários e até mesmo à suspensão e cassação de registro da legenda.

Portanto, ninguém deverá morrer de tédio também no próximo ano.