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População pobre deve votar "sim" em referendo egípcio

14 de dezembro de 2012

Apesar dos protestos em massa da oposição, o referendo para validar a polêmica nova Constituição egípcia deve contar com o voto favorável das pessoas mais simples, geralmente sem instrução e apegadas à religião.

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Foto: Reuters

A vendedora de jornais Umm Mohamed vive em Imbaba, um dos bairros mais pobres do Cairo, onde esgoto a céu aberto e lixo nas ruas fazem parte da paisagem em meio a prédios decadentes. Há alguns dias, além dos jornais de sua banca, Mohamed vende também livretos contendo o esboço da nova Constituição do país. "As pessoas compram para entender o que está sendo discutido", conta a vendedora. "Aí eles compreendem: está tudo certo", completa.

Mohamed, contudo, não leu o esboço da Constituição, pois ela pertence aos aproximadamente 40% de analfabetos entre a população egípcia. Na hora de votar no refendo deste sábado (15/12), ela vai se orientar pelos símbolos e cores incluídos nas cédulas eleitorais para facilitar a escolha daqueles que não conseguem ler.

A vendedora de jornais sabe que vai optar pelo "sim". "Para que nosso país, enfim, melhore", justifica, acrescentando que o atual presidente, Mohammed Morsi, é "um bom homem", que sabe o que islã significa. Segundo a vendedora, os opositores do presidente só disseminam boatos, provocando "tumulto" no país. Umm Mohamed está convencida de que Morsi só quer o bem do povo.

Pobreza e analfabetismo

O presidente religioso é benquisto em Imbaba, ao contrário de seus opositores. O bairro miserável é um dos redutos eleitorais da Irmandade Muçulmana. Nas áreas onde há maior pobreza e falta de informação – e sobretudo medo da punição divina –, é mais fácil para os islamistas convencerem os eleitores a darem seu aval ao esboço constitucional, redigido segundo os princípios da lei islâmica sharia.

Ägypten Proteste gegen das geplante Verfassungsreferendum
Opositores: criticados em área de extrema misériaFoto: Marco Longari/AFP/Getty Images

Os salafistas radicais costumam reduzir toda discussão a "crer ou não crer" à afirmação de que se trata de uma "lei divina". Além disso, os partidários de Morsi afirmam que os protestos dos adversários da Constituição no país só prorrogam desnecessariamente a séria crise econômica pela qual o Egito passa.

"Não queremos mais distúrbios, queremos viver", afirma um senhor que reclama de baixos salários, parcas aposentadorias e alto custo de vida. Ele pretende dar seu "sim" ao esboço da Constituição, pois acredita que a situação econômica do país irá melhorar posteriormente.

Sua opinião é dividida por um lixeiro: "Quero a nova Constituição. Chega de falação e de guerra uns contra os outros. Agora o que importa é a ordem no país". Ele, que recebe o equivalente a 40 euros por mês, reclama dos baixos salários, dizendo que tem problemas para sustentar sua família. O casamento da filha, por exemplo, ele não conseguirá financiar.

Mídia estrangeira: "parte da conspiração"

No bairro Imbaba, é preciso procurar muito por alguém que se oponha à Constituição redigida majoritariamente por islamistas. Este é o caso de um médico que atende no bairro. Ele sabe que pertence a uma minoria e justifica o apoio maciço à Irmandade Muçulmana com o alto índice de pobreza do lugar. Segundo ele, os islamistas compram os votos das pessoas: "Se você distribui chocolate, um quilo de açúcar ou de manteiga, é claro que eles vão dizer 'sim' à Constituição", conta o médico.

Armut in Kairo Imbaba
Bairro Imbaba, no Cairo: reduto eleitoral da Irmandade MuçulmanaFoto: AFP/Getty Images

Além disso, diz ele, é comum ouvir que o "sim" no referendo será dado "em nome do islã". O médico reclama que os islâmicos não "deveriam dizer às pessoas que aqueles que votarem a favor da Constituição vão para o céu". Ele discute com uma mulher na rua, a qual defende que "a sharia vem para que o Egito evolua", dando provas de que em Imbaba o apoio aos islamistas é predominante.

Em meio à discussão, uma outra senhora interfere e ameaça chamar a polícia para que esta confisque o microfone e o gravador da reportagem da Deutsche Welle. "Está é minha obrigação de cidadã", diz ela, dando sinais de que há quem acredite que a mídia estrangeira faz parte de uma "conspiração contra Morsi".

Autora: Cornelia Wegerhoff (sv)
Revisão: Francis França