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Com 50% da população acima do peso, Brasil revê regras para emagrecedores

Ivana Ebel4 de abril de 2013

Pressão estética e farmácias clandestinas levam ao consumo sem controle de remédios como a sibutramina. Brasil discute banimento da substância, proibida em diversos países, como Alemanha, Argentina e Estados Unidos.

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Symbolbild Fettleibiger Mann Adipositas DiabetesFoto: Fotolia/Markus Gäthke

Aos 34 anos, Cláudia (nome alterado pela redação) já perdeu a conta de quantas dietas fez. A funcionária pública ainda se lembra que a primeira foi aos 13. O cardápio incluia reguladores de apetite: “Algumas vezes, usava por três meses. Depois parava. E voltava mais tarde, por mais seis meses, ou um ano”, contou à DW Brasil. Entre os emagracedores que experimentou está a sibutramina, muitas vezes comprada de forma ilegal.

Ela não usa mais a droga – parou há um ano e meio devido à dificuldade em adquirir o produto. O motivo é o endurecimento nas regras de prescrição médica, em vigor desde 2011. Para continuar comprando as suas roupas entre os tamanhos P e M, a funcionária pública admite que voltaria a tomar o remédio se tivesse acesso. Ela está fora dos índices de obesidade, mas faz parte de um público que acompanha com interesse a discussão sobre a venda da sibutramina em andamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa.

O órgão se prepara para tomar uma decisão quanto à permanência da droga no mercado brasileiro. Um relatório técnico, em fase final de confecção, vai basear o veredito. O documento terá ainda que ser aprovado em assembleia da Anvisa, ainda sem data certa. Até lá, a agência não fala sobre o assunto – como respondeu quando procurada pela DW Brasil.

Consumo de inibidores no Brasil

A decisão ocorre em um terreno frágil. Em uma das discussões públicas sobre o tema, o próprio presidente da Anvisa, Dirceu Barbano, afirmou que o Brasil consumia 50% de toda a sibutramina vendida no mundo. Europa, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Argentina já proibiram a venda da droga.

As agências reguladoras internacionais justificam o banimento com base em um estudo conhecido como Scout (Sibutramine Cardiovascular Outcomes). A pesquisa foi encomendada em 2009 pela FDA, a agência reguladora americana. O teste avaliou a segurança na administração de sibutramina em pacientes obesos com predisposição a doenças cardiovasculates e outras complicações relacionadas ao excesso de peso.

Os resultados mostraram um aumento de 16% do risco cardiovascular. Além disso, o documento concluiu que apenas 30% dos que ingeriram a substância perderam pelo menos 5% do peso em três meses.

Poucos recursos para tratar obesos

Os resultados do teste Scout e a própria proibição da substância são contestados pela Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade (Abeso). A endocrinologista Cintia Cercato, que faz parte da diretoria da entidade, defende a eficácia do uso da sibutramina no tratamento da doença. Segundo ela, o teste Scout foi feito com uma população contraindicada por bula para o uso da sibutramina e não com uma amostragem confiável, ou seja, com pacientes obesos que não necessariamente tenham risco de doenças cardiovasculares. “Queremos que a droga fique no mercado para uma população que não tenha essa contraindicação”, afirma.

Segundo Cintia, além da sibutramina, existe apenas um medicamento, chamado Orlistat, disponível nas farmácias. E, para ela, proibir os remédios significaria pular uma etapa do tratamento. “A primeira opção é a mudança do estilo de vida, a segunda é o tratamento medicamentoso, para então partir para o uso de balão intragástrico ou para uma cirurgia bariátrica”, explica. “Proibir essas drogas é limitar muito o tratamento.”

A médica reconhece, no entanto, que não apenas os que estão acima do peso recorrem à pílula. "Existe um padrão de estética no Brasil e ele tem uma influência muito grande”. A diretora da Abessa adiciona: “Mas o tratamento medicamentoso deve estar aliado sempre a medidas dietéticas e atividade física. Não existe pílula mágica”, garante.

Um país acima do peso

Dados do Ministério da Saúde apontam que metade da população brasileira está acima do peso, ou seja, quase 100 milhões de pessoas. Para a classe médica, o excesso de peso é a epidemia do século. A inconformidade com a balança afeta também os cofres públicos. Só em 2011, o Sistema Único de Saúde (SUS) gastou 488 milhões de reais para tratar a obesidade ou doenças relacionadas.

Sem priorizar a saúde, o atalho para fazer as pazes com a balança, muitas vezes, passa pela compra ilegal dos inibidores de apetite. Cintia Cercato sabe que farmácias clandestinas vendem o medicamento sem prescrição médica. “É responsabilidade da agência reguladora (Anvisa) fazer com que o medicamento chegue para quem tem que chegar”, critica.

Esses caminhos obscuros fazem parte do passado de Cláudia. “Se hoje em dia fosse mais fácil conseguir a sibutramina, eu certamente voltaria a tomar, mas faria com acompanhamento médico", garante a funcionária pública, que após os longos anos de consumo do remédio emagrecedor entrou para o grupo dos hipertensos.