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Trabalho doméstico

30 de julho de 2011

PEC que tramita no Congresso vai equiparar direitos de trabalhadores urbanos, rurais e domésticos, que passarão a ter adicional noturno, hora-extra e FGTS. Patrões afirmam que mudança vai gerar desemprego.

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Ampliação dos direitos pode ser aprovada até fim do anoFoto: Fotolia/Frank-Peter Funke

O Brasil é um dos países que mais empregam trabalhadores domésticos e também um dos que mais avançaram nos últimos anos na instituição de direitos para a categoria, segundo avaliação da presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), Creuza Maria Oliveira.

Ela disse ainda que o país poderá ser pioneiro numa questão histórica, como a primeira nação entre as 183 integrantes da Organização Internacional do Trabalho (OIT) a ratificar a Convenção sobre o Trabalho Decente para Trabalhadores Domésticos.

Aprovada em junho passado, em Genebra – com uma folgada maioria de 396 votos a favor, 16 contrários e 65 abstenções – a convenção objetiva melhorar as condições de trabalho dos 53 milhões de trabalhadores domésticos em todo o mundo.

No Brasil, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 478/2010 que ampliará os benefícios das demais categorias também para os domésticos já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Agora ela aguarda a criação de uma comissão especial na casa parlamentar para a continuação dos debates.

"Está se falando numa aprovação até o final do ano", disse Creuza. "Mas sabemos que nem todo mundo dentro do Congresso é favorável à convenção, até porque o congresso é formado por patrões e patroas", afirma.

A PEC prevê a revogação do parágrafo único do inciso 34 do artigo 7º da Constituição, estabelecendo os mesmos direitos de trabalhadores urbanos e rurais também a empregados domésticos. Entre as principais mudanças estão o pagamento de hora-extra, adicional noturno, salário-família, o estabelecimento de carga horária de trabalho e FGTS.

"Essa mudança vai acabar com a discriminação do trabalhador doméstico, e é isso o que nós queremos", diz a sindicalista, que aos 10 anos de idade teve seu primeiro emprego numa casa de família.

Difícil adaptação

A possível aprovação da PEC dentro dos padrões estabelecidos pela OIT, no entanto, vem preocupando os empregadores. "Isso vai gerar desemprego porque muitas pessoas não terão mais condições de pagar o que as novas determinações devem impor", afirma Margareth Galvão Carbinato, presidente do Sindicato dos Empregadores Domésticos de São Paulo.

Ela afirma que as peculiaridades do trabalho doméstico no Brasil não estão sendo consideradas pelas mudanças. Diferentemente dos europeus, diz Carbinato, os brasileiros recebem alimentação e transporte dos patrões. E quem contrata, em grande parte, não são classes mais abastadas, e sim a classe média.

"Temos até mesmo muitas empregadas domésticas que são patroas – porque para trabalhar na casa de alguém são obrigadas a contratar pessoas a ficar com seus filhos. Então fica a pergunta: será que essas imposições da OIT também não vão prejudicar a vida dessas pessoas?", questiona a advogada. Segundo ela, com os benefícios atuais – como previdência social e férias – um empregado doméstico chega a custar o dobro do valor de seus salários finais.

No entanto, nem todos recebem os benefícios já garantidos por lei. Segundo Creuza Oliveira, estima-se que no Brasil existam cerca de 8 milhões de empregados domésticos – mas apenas 25% deles têm carteira assinada.

"Trabalhadores domésticos não são nem servos nem parentes", afirma a diretora do programa da OIT sobre Condições de Trabalho, Manuela Tomei, assegurando que esta condição fica bem clara com as novas normas sugeridas pela organização.

O diretor-geral da OIT, Juan Somavia, também enxerga as novas regras como um avanço. "Pela primeira vez nos ocupamos da normalização de um setor informal". Ele espera que a Convenção sobre o Trabalho Decente para Trabalhadores Domésticos possa não apenas melhorar a vida de mulheres desprivilegiadas, mas também ser um reforço na luta contra o trabalho infantil.

Direito de imigrantes

Segundo a OIT, nenhuma outra área do mercado internacional emprega tantas mulheres e em poucos setores há tanta exploração, violência e ausência de direitos. Estima-se que elas somam cerca de 700 mil só na Tailândia, 14 milhões na América Latina e a incríveis 20 milhões apenas na China.

A maioria tem baixa escolaridade e vem de famílias pobres. E, não raramente, as condições de trabalho são comparáveis às de um escravo – sobretudo porque estas mulheres na maioria das vezes moram na casa das famílias contratantes, trabalham isoladas e acabam ficando à mercê da vontade de seus patrões.

Para que a convenção de Genebra entre em vigor, é necessário que pelo menos dois países a ratifiquem. A expectativa é de que as mudanças também protejam os direitos dos trabalhadores imigrantes – um problema mais comum na Europa, por conta da contratação de pessoas do leste europeu (Hungria, Romênia e Bulgária).

No entanto, para a presidente da Fenatrad, o Brasil também poderá enfrentar a mesma situação caso venha a ser o primeiro a estabelecer tantos direitos aos trabalhadores domésticos. "Isso pode atrair mais trabalhadores para cá", avalia.

Autora: Mariana Santos
Revisão: Alexandre Schossler