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Democracia

27 de novembro de 2009

Para algumas organizações internacionais, as eleições em Honduras são uma forma de legitimar o golpe de Estado no país. Porém, outros especialistas veem nelas uma chance de retomar o caminho da democracia.

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Manifestantes protestam contra eleições e pedem a volta de ZelayaFoto: AP

As eleições gerais que serão realizadas em Honduras neste domingo (29/11) são consideradas por muitos especialistas um mecanismo decisivo para que se possa começar a resolver a crise institucional no país, que teve início na madrugada de 28 de junho deste ano, quando o presidente constitucional, Manuel Zelaya, fora expulso do país por agentes das Forças Armadas.

Porém, o fato de tantos países e organizações internacionais imporem como precondição o retorno de Zelaya ao poder ainda antes da abertura das urnas para reconhecer os resultados do pleito reduz consideravelmente a probabilidade de o pleito por fim a esta que pode ser a mais séria crise política ocorrida na América Latina nos últimos anos.

Garantia de transparência

Manuel Zelaya / Honduras
Manuel Zelaya foi desposto em junho de 2009Foto: AP

O Centro para Justiça e Direito Internacional (Cejil, na sigla em inglês), uma organização não-governamental que presta assessoria à Organização dos Estados Americanos, vem apresentando argumentos contrários às eleições.

"O 29 de novembro não fortalecerá a democracia hondurenha, pelo contrário, a debilitará, pois uma nova forma de golpe de Estado se consolidará, na qual o uso da força e uma fraca institucionalidade põem em risco o Estado de direito", critica sua diretora executiva, Viviana Krsticevic, em um comunicado emitido em Washington.

Segundo ela, não estão sendo cumpridas as condições necessárias para garantir que o pleito ocorra de forma transparente. Krsticevic fez alusão ao clima de intimidação criado pela restrição do direito a manifestações públicas, a repressão violenta dos protestos contra o golpe e o controle dos veículos de imprensa que transmitem mensagens da oposição. Para ela, tais medidas colocam obstáculos à livre expressão das vontades dos cidadãos.

Uma crise singular

O chefe de Estado hondurenho de fato, Roberto Micheletti, anunciara que deixaria a presidência até o dia 2 de dezembro a fim de diminuir os atritos políticos no país. No entanto, aos olhos de Krsticevic, a atitude de Micheletti apenas confirma o que ele preferiria ocultar: "a influência determinante dos golpistas no processo eleitoral".

A diretora do Cejil insiste que as eleições em Honduras não podem ser comparadas aos processos de retorno à democracia vividos na Argentina, em 1983, ou no Chile, em 1989, depois das ditaduras militares.

Já Peter Peetz, pesquisador do departamento de estudos latino-americanos do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (Giga), em Hamburgo, discorda de Krsticevic. De acordo com ele, a ditadura militar do Chile chegou ao fim porque Pinochet consentiu que fosse realizado um plebiscito para definir a instauração de um sistema democrático no país.

"Naquele momento, não se podia dizer que o plebiscito era ilegal porque fora convocado por um governo ilegítimo, pois de outra forma não teria sido possível dar um passo em direção a um governo legítimo", avalia o cientista político.

As grandes suspeitas

Respondendo às fortes críticas feitas pelo Brasil à política norte-americana diante da crise em Honduras, o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ian Kelly, justificou o apoio de Washington ao processo eleitoral ressaltando que este não seria organizado pelo governo de fato de Micheletti, mas por uma instituição independente, o Supremo Tribunal Eleitoral.

Demonstrationen in Honduras 2009
Manifestantes pró-Zelaya carregam bandeira nacionalFoto: AP

"Pode-se alegar que, antes das eleições hondurenhas, havia injustiças porque, entre outras coisas, a liberdade de imprensa não estava garantida, mas as eleições em si podem ser realizadas de forma limpa", assegura Peetz.

O pesquisador também destaca que as autoridades eleitorais foram escolhidas pelo parlamento hondurenho e estão ligadas aos partidos políticos tradicionais do país, além de já ocuparem os cargos antes mesmo de Zelaya ter se tornado presidente.

"E foram eles que convocaram as eleições de 29 de novembro e aprovaram as indicações dos candidatos à presidência enquanto Zelaya estava no poder. Na minha opinião, eles não podem ser chamados de golpistas", comenta Peetz.

Prós e contras do pleito

Peetz admite que as restrições à liberdade de imprensa e de associação e os casos de violação dos direitos humanos registrados em Honduras nos últimos meses realmente levam a pensar que as eleições não serão realizadas de forma transparente.

"Mas a pergunta é se este véu de suspeita é realmente tão extenso que invalida completamente os resultados das eleições. Pois há outros aspectos que atendem aos critérios de uma eleição democrática", argumenta o pesquisador do Giga.

Ele salienta ainda a importância destas eleições na história de Honduras, pois pela primeira vez foi permitida a participação de um candidato independente, o líder sindicalista Carlos H. Reyes, integrante do movimento de resistência contra o golpe de Estado, mas que logo renunciou a sua candidatura.

Até mesmo a Unificación Democrática, o partido mais de esquerda do país, que sempre apoiou Zelaya durante a crise, decidiu participar do pleito, indicando seu próprio candidato.

O suspense continua

Para Peetz, a situação seria diferente caso tivessem proibido a participação de certos candidatos, mas estes foram indicados pelos partidos em novembro de 2008. "São os mesmos candidatos que agora vão participar das eleições gerais, com exceção apenas daqueles que se retiraram voluntariamente da disputa", afirma.

O pesquisador do Giga ainda acrescenta que aqueles que exigem a todo custo a volta de Zelaya à presidência não apresentaram propostas concretas para solucionar a crise em Honduras, caso o presidente deposto continue fora do jogo político.

O episódio desta história de suspense terá seu ápice entre este domingo e a próxima quarta-feira (02/12), quando o Congresso hondurenho se manifestará sobre a restituição de Zelaya ao poder. Porém, se a comunidade internacional não reconhecer os resultados do pleito, a crise institucional de Honduras poderia se prolongar por pelo menos mais um ano.

Autor: Evan Romero-Castillo (jbn)
Revisão: Rodrigo Rimon