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'Era da força como garantia de paz acabou', diz a chefe da polícia no Rio

5 de junho de 2012

De professora a chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, Martha Rocha diz que criatividade e sensibilidade femininas são fundamentais. Ela participa da edição Brasil do Women's Forum.

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Foto: picture-alliance/dpa

Martha Rocha, 52 anos, é a primeira mulher a chefiar a Polícia Civil do Rio de Janeiro. Na função há um ano e três meses, ela entrou para a polícia em 1983 e atuou em casos emblemáticos, como o sequestro ao ônibus 174, em 2000, que terminou com a morte de uma refém e do sequestrador.

Nesta terça-feira (05/06), Martha Rocha participará do encerramento do Women's Forum Brazil, preparatória para a edição global, que acontece na França, em outubro. A iniciativa reúne figuras importantes do governo, indústria, comunidade acadêmica e sociedade civil

Deutsche Welle:Como é o dia a dia no comando de uma instituição em que a figura masculina é tão forte e num local onde a associação com a violência é tão forte, como o Rio de Janeiro?

Martha Rocha: Quando eu cheguei aqui, as pessoas estavam muito preocupadas com o resultado. Nós temos indicadores muito favoráveis: a maior redução nos índices de homicídio desde 1991, por exemplo. Efetuamos a prisão de 39 milicianos e 30 lideranças do tráfico, incluindo as lideranças das favelas ocupadas – o traficante Fabiano Atanázio da Silva, conhecido como FB, Paulo Rogério de Souza Paz, conhecido como Mica, Lúcio Mauro Carneiro dos Passos, o Biscoito, Marcelo da Silva Soares, o Macarrão.

Tivemos um aumento de 30,9% do cumprimento de mandato de prisão e um aumento de inquéritos relatados com êxito. Na verdade, a gente tem trabalhado muito. Temos um grande projeto que vai congregar 32 delegacias especializadas e 3 mil policiais num único espaço. Esse é um projeto de 72 milhões de reais.  A gente aqui não trabalha com "achismos", a gente trabalha com planejamento e estratégia. É muito trabalho.

A senhora teve que lidar com preconceito ou resistência desde que assumiu o cargo?

Eu estou na polícia desde 1990. Como delegada há 23 anos, como policial há 29 anos. Eu não enfrentei resistência por ser mulher ao chegar na chefia. Acho que, em algum momento, as pessoas imaginavam que isso poderia acontecer. Eu sou uma delegada de primeira, eu fui subchefe, fui corregedora. Esse preconceito eu não sofri agora, eu sofri lá atrás, em 1993 quando fui ser diretora de departamento. Na época, os delegados disseram que entregariam o cargo e eu estou esperando isso acontecer até hoje.

A mulher lida melhor do que o homem em alguma área específica da rotina da polícia?

A polícia é investigação. O tempo da era da força como garantia da paz acabou. Agora a gente está pensando em planejamento, em ações de inteligência. Para isso, você tem que ter criatividade e sensibilidade. Acho que por isso as mulheres cresceram na polícia civil. Porque essas características são típicas femininas.

O Brasil está em que patamar nessa discussão sobre a igualdade entre homem e mulher?

Acho que, nos últimos 30 anos, o movimento de mulheres no Brasil conseguiu várias conquistas. Um dos focos foi o enfrentamento da violência doméstica. Era razoável que, em algum momento da história dessa instituição, que lida com a questão da violência doméstica, a figura da mulher policial aparecesse. Em 1983, houve a primeira grande entrada de mulheres na polícia do Rio de Janeiro. Se você olhar na história do movimento de mulheres, esse era o momento em que nós estávamos discutindo a anistia, o movimento feminista "Quem ama não mata". Acho que não causou o espanto que as pessoas acham que causou uma mulher chegar à frente da polícia civil.

Como a senhora vê a participação feminina na ascendência desse Brasil emergente, dentro e fora de casa?

Um terço dos lares no Brasil é chefiado apenas por mulheres. Nós somos um país de 193 milhões de pessoas, 51% da população são mulheres. Mas acho que ainda temos que tratar a questão da desigualdade financeira, da desigualdade social. Acho que trabalhar políticas de fortalecimento da cidadania feminina é também trabalhar política de fortalecimento da família e das ações de romper os critérios da desigualdade.

Muitas mulheres que chefiam famílias no Brasil têm um traço de pobreza. Essa mulher tem que ter acesso à creche, tem que ter escolaridade, precisa do título de posse da terra, para que, em caso de uma separação, ela possa permanecer naquele lugar com os filhos. Acho que, se a mulher for bem tratada, a sociedade será bem tratada.

Entrevista: Nádia Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer