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Erdogan apresenta queixa contra humorista alemão

12 de abril de 2016

Presidente da Turquia acusa comediante Jan Böhmermann de injúria por causa de poema satírico contendo referências sexuais de baixo calão. Caso gera debate sobre limites da sátira e cria dilema para Merkel.

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Foto: picture-alliance/dpa/B. Pedersen Getty Images/AFP

O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, apresentou queixa na Alemanha contra um comediante que recitou um poema satírico sobre ele numa emissora pública alemã, disseram promotores nesta segunda-feira (11/04).

A Promotoria Pública de Mainz afirmou que Erdogan apresentou, por meio de um escritório de advocacia, uma queixa contra o humorista Jan Böhmermann por injúria. Böhmermann é o apresentador de um programa no canal público ZDF chamado Neo Magazin Royale, uma espécie de late-night-show satírico.

Na edição de 31 de março do programa, o humorista recitou um poema sobre Erdogan contendo referências sexuais explícitas e acusações de que o presidente turco reprime minorias e maltrata curdos e cristãos. No poema, Erdogan é chamado, entre outras coisas, de "fodedor de cabras", "presidente de pau pequeno", "viado" e o "fedor dele" é "pior que o peido de um porco".

Antes de lê-lo, Böhmermann mencionou a canção satírica transmitida anteriormente pela emissora alemã NDR e que também zomba de Erdogan. Trata-se de uma paródia da música Irgendwie, Irgendwo, Irgendwann (de alguma maneira, em algum lugar, em algum momento), sucesso da cantora Nena, com o nome Erdowie, Erdowo, Erdogan.

A paródia afirma que, na Turquia, quando um jornalista publica algo de que Erdogan não gosta, logo vai para a cadeia. O esquete humorístico levou a Turquia a convocar o embaixador alemão para tentar impedir que ele continuasse a ser exibido. A Alemanha, porém, rejeitou os protestos turcos.

Böhmermann disse que o esquete da NDR estava coberto pelos direitos de liberdade artística, de liberdade de imprensa e de liberdade de opinião e que o seu poema seria um exemplo de "críticas abusivas" não permitidas. "O que você verá agora não se deve fazer", alertou o próprio humorista, antes de apresentar o poema.

Jan Böhmermann lê um poema satírico sobre o presidente turco em seu programa humorístico
Jan Böhmermann lê um poema satírico sobre o presidente turco em seu programa humorísticoFoto: ZDF Neo Magazin Royale

Ofensa a representantes de Estados estrangeiros

Os promotores alemães afirmaram que a queixa apresentada por Erdogan será incluída num inquérito já em andamento. Eles já haviam começado a investigar Böhmermann por suspeita de injúria depois de mais de 20 cidadãos alemães apresentarem queixa. O número já passa de cem.

Além disso, a Turquia também apresentou uma queixa por vias diplomáticas ao governo alemão, pedindo que o humorista seja investigado por "ofender órgãos ou representantes de Estados estrangeiros". O crime está previsto no parágrafo 103 do Código Penal da Alemanha. Para que essa queixa resulte em investigação, é necessária uma autorização do governo federal alemão, ainda pendente.

A Chancelaria Federal afirmou que a situação é pouco comum e que, por isso, a análise do pedido deverá demorar alguns dias.

Já Böhmermann cancelou a próxima edição do seu programa, prevista para esta quinta-feira, e está sob proteção policial. Um veículo da polícia está perto de sua residência, em Colônia. A ZDF afirmou que está do lado do humorista.

Merkel defende liberdade artística

O caso deu origem a um amplo debate sobre liberdade de expressão, os limites da sátira e sobre o próprio parágrafo 103, que muitos críticos consideram ultrapassado. O presidente da bancada do Partido Social-Democrata (SPD), Thomas Oppermann, afirmou que o páragrafo 103 é um anacronismo que precisa ser eliminado da legislação alemã. Ele defendeu que isso aconteça já na próxima sessão parlamentar.

Já a chanceler federal Angela Merkel tenta se esquivar das acusações de que estaria sendo condescendente com a Turquia por causa da crise dos refugiados. O recente plano acertado entre a União Europeia e a Turquia foi defendido duramente por Merkel e é visto pelo governo em Berlim como fundamental para tentar resolver a crise.

Num recente telefonema com o primeiro-ministro da Turquia, Ahmet Davutoglu, Merkel tentou aparar as arrestas, afirmando que o poema era uma provocação proposital. Aparentemente, o objetivo era acalmar o governo turco e tentar evitar a apresentação de uma queixa com base no parágrafo 103.

Nesta terça-feira, Merkel rebateu claramente os seus críticos. Ele disse que a Alemanha quer encontrar uma solução para a crise migratória que assola a Europa, mas que isso não tem relação com a liberdade artística. "Quero enfatizar novamente o que foi enfatizado ontem: temos os valores fundamentais da Lei Fundamental e isso inclui o Artigo 5º, que é a liberdade de opinião, da ciência e, claro, a liberdade artística", disse.

"A arte e estes valores fundamentais são válidos independentemente de quaisquer problemas políticos que discutamos um com o outro, e isso inclui a questão dos refugiados, e acho que a Turquia e a União Europeia, e também a Alemanha, têm interesse em encontrar uma solução política para ela", acrescentou.

PV/rtr/dpa/afp