1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Grafite, música eletrônica e relações virtuais

Soraia Vilela8 de maio de 2006

Exposição em Frankfurt radiografa sob cinco aspectos os "jovens" de hoje. Uma faixa etária que pode até passar dos 40!

https://p.dw.com/p/8Nei
Exposição 'A Juventude de Hoje', em FrankfurtFoto: Kunsthalle Schirn

A morte da rebeldia contra os pais ou "o sistema". A substituição das utopias sociais das décadas passadas pelos microinteresses imediatos. Relações afetivas passageiras construídas virtualmente. A música e a estética clubber como espaços fundamentais de afirmação da identidade e a instauração de uma nova ordem visual no espaço urbano.

Uma mostra na Schirn Kunsthalle, em Frankfurt, esboça um traçado urbano-antropológico da juventude da primeira década do milênio. Em termos políticos, existenciais, sexuais, musicais e de interação com a cidade. Veja as conclusões:

Die Jugend von Heute
'Che', escultura em cera do artista britânico Gavin TurkFoto: Kunsthalle Schirn

Política e revolta: causas sem rebeldes

Se os jovens foram um dia vistos no papel de rebeldes sem causa, o contexto atual aponta para "causas sem rebeldes". Os teens, apostam os teóricos, perderam no decorrer dos últimos 20 anos o status de outsiders. O conflito de gerações, pelo menos à primeira vista, parece "solucionado". Rebeldias como a de 68 não passam de uma curiosidade histórica e tornar-se como os próprios pais deixou de ser um pesadelo ameaçador.

Aderir a formas de pensamento "rebeldes" nos dias atuais seria "não apenas impossível, como sem sentido. Pois quase todos os atributos do comportamento adolescente já foram desconstruídos ou sugados pela cultura pop", afirma o teórico Jens Hoffmann.

O ponto de vista é marcado na exposição em Frankfurt por Che, do artista Gavin Turk, em que Che Guevara, ícone da rebeldia dos anos 60–70, aparece imóvel, como em um museu de cera. Explicitando a imobilidade emblemática daquele que, um dia, incorporou o "não" jovem ao universo "careta" dos pais.

Um rastro de rebeldia, porém, ainda resta entre os jovens de hoje, aposta a exposição. Esta só se dá, contudo, entre quatro paredes. E pode ser observada na micropolítica das culturas rave e tecno, das quais faz parte um detalhismo que marca a vestimenta e o gosto musical. Códigos que só podem ser interpretados pelos "escolhidos", os que "sabem das coisas".

Em termos profissionais, as inseguranças das relações que marcam a "Geração Estágio" – um grupo de pessoas em torno dos 30 anos, que se submete a condições de trabalho discutíveis, deixando-se explorar como se fossem estagiários – se alastram por outros setores, teoriza Mercedes Bunz no catálogo que acompanha a exposição.

Die Jugend von Heute
Cena de 'Casting', do artista português João OnofreFoto: Kunsthalle Schirn

Existência: questão de copyright

O cenário hoje, afirma o teórico Georg Seesslen, é o de um sistema que não quer se transformar e, para isso, integrou a mudança como um fator de estabilização do status quo. As tendências da moda e as novas tecnologias de comunicação só servem para alimentar o mercado em movimento. Premissa que fica explícita no vídeo Casting, do português João Onofre.

Ou, em outros casos, o código visual é usado para dar subsídios a determinadas posições políticas já existentes. Como no caso do véu muçulmano de jovens turcas que vivem na Alemanha, por exemplo, vistas por Seesslen como a prova de "uma sexualização de preceitos políticos e uma politização de preceitos sexuais". Ou seja, o corpo da jovem sendo usado para demonstrar conflitos sociais implícitos. A questão passa a ser de "copyright": "de quem são os jovens?"

Continue lendo: corpo e sexo; música e cultura clubber; espaço urbano.

Die Jugend von Heute
'Sheena experimenta roupas ao lado de sua amiga Amber, 14 anos, no provador de uma loja de departamentos': cromo da artista norte-americana Lauren GreenfieldFoto: Kunsthalle Schirn

Corpo e sexo: desequilíbrio entre gêneros

Aqui a mostra sintetiza o desequilíbrio entre os gêneros em uma cultura cujos valores são basicamente definidos pelo homem. Para isso, o teórico Niels Weber vai até Goethe para lembrar que Fausto, hoje, não teria nem tido necessidade de selar o pacto com o diabo para seduzir uma mulher muito mais jovem. Com sua idade, posição social e posses, ele teria tido, nos dias atuais, a possibilidade de escolher à vontade.

Por outro lado, lembra o teórico, o ideal do corpo jovem esteve atrelado até mesmo à ideologia nazista. O Terceiro Reich foi concebido para ser um espaço onde "tudo era novo". Um momento em que o conceito de juventude foi manipulado de forma a englobar não apenas uma faixa etária, mas todo um universo ideológico imposto. Resta saber se os meios de comunicação de massa fazem uso hoje de estratégias semelhantes, servindo como "religião invisível"?

Die Jugend von Heute
'Teenage Kicks', do holandês Marc BijlFoto: Kunsthalle Schirn

Música e cultura clubber: adolescentes com mais de 30

Se há um "formato cultural" que acompanha há muito os movimentos das novas gerações, este é a música. O interessante ao se observar esses territórios delimitados pelo gosto musical – cujo tom é dado, desde o início dos anos 90, pela música eletrônica – é a presença de "jovens" de até 40 anos ou mais.

"A descoberta foi feita: a juventude deixa de ser uma fase entre a infância e a idade adulta. Não se entra mais na idade adulta, fica-se jovem", provoca a teórica Mercedes Bunz. Passar dos 30 não significa mais um corte radical do cordão umbilical com a juventude.

Nos últimos anos, afirma Bunz, "o estado de ser jovem foi gradual e continuamente sendo empurrado do mundo da juventude para o mundo dos adultos". Até atingir o ponto em que alguns destes adultos simplesmente se negam a abandonar as formas de comportamento e ícones relativos aos jovens.

"Os trintões pós-adolescentes usam os mesmos códigos que os que ainda têm 20 e tantos anos, de forma que as diferenças entre os dois grupos não são mais tão grandes quanto eram anteriormente. Quando as experiências culturais juvenis atingem a vida familiar e profissional, então isso significa não apenas que se fica jovem, mas que não se quer chegar a algum lugar", conclui Bunz.

Die Jugend von Heute
'Mil milhas acima do mar", da berlinense Lea Asja PagenkemperFoto: Kunsthalle Schirn

Espaço urbano: tomada de território

Apesar de todos os espaços de trânsito em que milhares de pessoas passam cada vez mais o tempo – hotéis, aeroportos ou shopping centers – o espaço público da cidade continua sendo o ponto de referência político-cultural de maior importância para a sociedade atual. É aí que pode ser observada uma interseção constante de identidades étnicas, cenas musicais, estilos e formas diferenciadas de comportamento.

Neste contexto, os jovens continuam, como nas décadas passadas, a "tomar posse do espaço urbano", ao usá-lo através de grafites, por exemplo. Estes continuam, como já observou Jean Baudrillard em 1978, a "decodificar o espaço urbano", servindo como contraponto ao excesso de publicidade nas cidades.

Aqueles que se aventuram a marcar presença nas cidades européias ou "nas fachadas de prédios nobres em São Paulo, chamando a atenção para a existência das favelas", assinala Matthias Ulrich no catálogo da exposição, ainda são provas da rebeldia derradeira dos jovens que ainda tentam instaurar uma outra ordem social na vida urbana.