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"O 11 de setembro colocou a Rússia na elite da política mundial"

Tatiana Petrenko (bt)16 de setembro de 2006

DW-WORLD entrevistou Peter Schulze, professor de Ciências Políticas da Universidade de Göttingen e especialista em temas relacionados à Rússia. Ele falou sobre o papel russo na política mundial após os atentados.

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As políticas de Putin são objeto de polêmica na Rússia e no mundoFoto: Picture-Alliance/dpa

DW-WORLD: De acordo com recente pesquisa, vários russos disseram acreditar que, depois do 11 de setembro, o mundo e, principalmente os Estados Unidos, passaram a entender melhor as ações de Moscou na Chechênia. Isso de fato aconteceu?

Peter Schulze: Quando falamos do Ocidente, precisamos diferenciar, primeiramente, entre países e, em segundo lugar, entre políticos, mídia e o povo. Os Estados Unidos e o Reino Unido são tradicionalmente críticos em relação à questão chechena, porque o critério com o qual eles julgam os acontecimentos no norte do Cáucaso não corresponde à realidade. Países ocidentais mais próximos da Rússia – seja por cooperação econômica ou por intercâmbio cultural – têm uma maior compreensão das ações de Moscou na Chechênia.

Em que posição a Alemanha se situa?

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As relações atuais entre Alemanha e Rússia têm um caráter ambíguoFoto: AP

A Alemanha está no segundo grupo, mesmo tendo algumas opiniões divididas. A mídia pinta uma imagem negativa da Rússia. Pode-se dizer que a imprensa é obcedada em reportar terríveis acontecimentos. Eles têm resistência em noticiar normalidade e estabilidade, esse tipo de tema consegue, na melhor das hipóteses, algumas linhas. Por outro lado, notícias sobre ataques terroristas e violações de direitos humanos vendem muito mais.

Apesar disso, os alemães não têm uma imagem negativa unânime sobre a Rússia. Aqueles que são interessados e questionadores sabem que o conflito na Chechênia não pode ser visto de forma tão simples e maniqueísta, que é um assunto complexo e cuja solução é extremamente difícil.

No aspecto político, duas frentes podem ser observadas na Alemanha. Alguns sofrem de "russofobia", têm medo de uma Rússia forte e usam a Chechênia como uma oportunidade para criticar o governo russo. Outros, em contrapartida, sabem que o Ocidente precisa de uma Rússia forte, política e economicamente estável.

Qual a posição do governo alemão?

Esta posição era bastante clara durante o governo de Gerhard Schröder: a Rússia era vista como uma parceira política e econômica da Alemanha para o futuro. Por isso, não se criticava tanto a política interna russa. Esta conduta resultou em uma série de projetos econômicos de porte, dentre eles o gasoduto do Mar Báltico.

Angela Merkel, no entanto, é forçada a guiar o país em diferentes direções. De um lado, ela está sob pressão de seu próprio partido e também da oposição liberal, para criticar os desdobramentos da política interna russa. Por outro lado, ao tomar posse, ela fez ajustes na economia alemã e declarou que a prosperidade da Alemanha é de certa forma dependente de uma parceria com a Rússia. Resumindo, a Alemanha não é neutra em relação à Chechênia ou aos direitos humanos na Rússia, mas demonstra certo entendimento sobre o assunto.

Vários ativistas de direitos humanos e políticos russos que são críticos do Kremlin advertiram que o presidente Putin usaria a guerra internacional contra o terrorismo para justificar suas duras ações na Chechênia. Esses temores se confirmaram?

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Mais de 330 pessoas morreram no "massacre de Beslan", a maioria criançasFoto: dpa

Parcialmente. Mas a questão chechena não tem mais tanto peso na sociedade russa. Primeiramente, porque Putin conseguiu "chechenizar" o conflito. Oficialmente os políticos locais estão encarregados do problema e todos os enfrentamentos acontecem entre os diferentes clãs. Isso significa que Moscou ainda é responsável pelo que acontece na Chechênia, mas de uma maneira mais distanciada.

Outros eventos, como as eleições para o Parlamento e as questões relativas à sucessão de Putin, vão ter papel fundamental nos próximos capítulos do desenvolvimento da democracia na Rússia.

O maior e pior ataque terrorista da Rússia (massacre na escola de Beslan, em setembro de 2004) aconteceu depois do 11 de setembro. Existe uma conexão entre os dois episódios?

Existe uma conexão, mas ela não deixa de ser ambígua. A ascensão da Al-Qaeda deu ao conflito checheno uma outra direção ideológica. Anteriormente, os rebeldes lutavam pela independência, enquanto nos dias atuais os fatores étnicos e religiosos têm um papel decisivo. É possível dizer que ações terroristas decorrentes de grandes conflitos se internacionalizaram. Mas eu diria que essa tenha sido mais uma conseqüência de longo prazo do 11 de setembro. Talvez, essa internacionalização viesse a ocorrer cedo ou tarde, independentemente do 11 de setembro.

Depois do 11 de setembro, a Rússia juntou-se rapidamente à "aliança contra o terror". Isso fez com que o papel do país na política mundial se tornasse mais importante?

O 11 de setembro colocou a Rússia no bloco de elite da política mundial. Anteriormente, a Rússia desempenhava uma função periférica na política mundial, mas, depois dos atentados, o Ocidente deu-se conta de que conflitos internacionais não poderiam ser resolvidos sem a Rússia.

Depois dos ataques de 11 de setembro, esperava-se que as relações entre Rússia e Estados Unidos melhorassem, já que ambos os países estavam juntos na "guerra contra o terrorismo" e a competição dos tempos da Guerra Fria já havia deixado de existir. Essa expectativa tornou-se realidade?

Logo após os atentados tornou-se clara a forma com que os EUA e a Rússia trataram um ao outro. Os Estados Unidos colocaram forças militares na Ásia Central e Moscou aceitou, pois assim os norte-americanos assumiriam a tarefa de combater o extremismo islâmico, o terrorismo e o tráfico de drogas na região. Mas os EUA não estavam satisfeitos em ter apenas presença militar ali. Eles tentaram também exercer influência política e econômica na Ásia Central e também na Geórgia e na Ucrânia. O Kremlin não podia tolerar isso, e por isso a competição ressurgiu.

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As relações entre Estados Unidos e Rússia pioraram nos últimos anosFoto: AP

Um fator chave para a deterioração das relações entre os dois países foi o "caso Khodorkovsky" [condenação e prisão do magnata Mikhail Khodorkovsky por evasão fiscal]. O processo foi visto nos EUA como um símbolo de opressão à democracia, à liberdade de expressão e de expropriação arbitrária da propriedade privada. Por isso, a solidariedade a Moscou por parte de Washington rapidamente se dissipou.

Não acredito que as relações bilaterais Rússia-Estados Unidos melhorarem em um futuro próximo, porque novos problemas têm surgido, como por exemplo, diferentes visões em relação ao Irã. Mas os EUA sabem que precisam da Rússia para resolver esses conflitos. Logo, o diálogo vai continuar.