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Made in Germany

Carlos Albuquerque23 de maio de 2008

Eles produziram as primeiras próteses oculares de vidro na América do Sul. Hoje, ajudam feridos que perderam seus olhos na guerra do Kosovo. DW-WORLD.DE entrevistou duas gerações de protéticos alemães.

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Pintura da íris de vidro é uma profissão à parteFoto: DW/C. Albuquerque

Willy Trester fundou seu Instituto de Prótese Ocular em Colônia, em 1923, com o nome de Ateliê de Olhos Artificiais. Entre os anos de 1930 e 1938, ele se tornou um dos primeiros ocularistas alemães a exercer essa atividade no Rio de Janeiro, Montevidéu e, sobretudo, em Buenos Aires.

Deutschland das Institut für Augenprothetik W. Trester in Köln
Wolfgang Trester herdou profissão do paiFoto: DW/C. Albuquerque

Seu filho e seu neto, Wolfgang e Marc Trester, continuaram seu trabalho no Instituto de Prótese Ocular em Colônia. O instituto trabalhou 30 anos com israelenses e montou uma filial na África do Sul.

Através de financiamento próprio e de doações, Wolfgang e Marc Trester foram para o Kosovo, no intuito de ajudar feridos de guerra que perderam seus olhos. DW-WORLD.DE conversou com os protéticos.

DW-WORLD.DE: Prótese ocular é especialidade exclusivamente alemã?

Wolfgang Trester: Deve-se falar com certo orgulho que ninguém no estrangeiro faz aquilo que fazemos na área de prótese ocular. Isto é uma especialidade exclusivamente alemã. Existem 15 institutos de prótese ocular organizados na Alemanha.

Deutschland das Institut für Augenprothetik W. Trester in Köln
Instituto possui próteses de 2 mil diferentes coresFoto: DW/C. Albuquerque

Em cada grande cidade existe um: em Hamburgo, Hannover, Frankfurt, Wiesbaden, Saarbrücken. Em Berlim, são até mesmo três. Eles se dividem desta forma. Isto tem a ver com a técnica, que originalmente era francesa. Ela foi desenvolvida na França no século 18, mas, por acaso, devido a razões de concorrência, ela veio para a Alemanha. Esta técnica foi então aperfeiçoada na região da Floresta da Turíngia em aspectos de qualidade, material e manufatura, que os franceses não possuíam.

O que faz o seu instituto?

Marc Trester: Somos responsáveis pelos estados da Renânia do Norte-Vestfália e pelo da Renânia-Palatinado. Esta é nossa área. Cobrimos também a região do Vale do Ruhr. Viajamos para lá e trabalhamos no local, visitando pacientes em hospitais e clínicas. Temos três empregados e somos assim uma empresa grande. A maioria dos colegas trabalham sozinhos ou em dupla.

O instituto também trabalhou na América do Sul?

Deutschland das Institut für Augenprothetik W. Trester in Köln
Jornal argentino de 1932 noticia trabalho de protéticoFoto: DW/C. Albuquerque

Wolfgang Trester: No início do século passado, os alemães se tornaram líderes mundiais deste tipo de técnica. Meu pai trabalhou na América do Norte e na América do Sul, onde foi o primeiro a fazer próteses oculares.

Em 1931, ele emigrou oficialmente para o Brasil, tendo voltado mais tarde para a Alemanha. Então veio a guerra que ocasionou uma massa de feridos aqui no país.

Quando criança, lembro-me das filas de feridos e soldados em uniforme que vinham a nós para receber um olho. Eram milhares que perderam seus olhos na guerra. Havia também feridos civis, ajudantes de soldados.

Que ação o senhor realizou no Kosovo?

Deutschland das Institut für Augenprothetik W. Trester in Köln
Marc Trester explica que tudo é feito a mãoFoto: DW/C. Albuquerque

Marc Trester: Viajamos para o Kosovo para ajudar pessoas que haviam perdido seus olhos. Foi uma boa ação, pois três quartos dos kosovares não podem pagar as próteses no Kosovo.

Nas regiões mais pobres, há muito a fazer, mas as pessoas não podem pagar. A atividade no Kosovo foi financiada através de doações que angariamos e através de meios próprios.

Queríamos ter uma primeira idéia da situação no Kosovo e fomos lá para ver. São centenas de pessoas que precisam de uma prótese ocular.

Quanto custa uma prótese?

Marc Trester: Na Alemanha, próteses oculares são pagas pelos seguros de saúde, tirando a contribuição de 10 euros que cada paciente tem que pagar. Em outros países, os pacientes têm, freqüentemente, que pagar do próprio bolso. Na Alemanha, felizmente, os custos são cobertos pelos seguros de saúde. Feridos de guerra recebem, até mesmo, duas próteses do Estado.

Sua firma completou 85 anos de existência, tendo sido fundada após a Primeira Guerra Mundial. Sem guerra, ainda há grande demanda?

Deutschland das Institut für Augenprothetik W. Trester in Köln
Formação de protético dura sete anosFoto: DW/C. Albuquerque

Wolfgang Trester: Sem guerra? Hoje, estamos novamente em ação. Nossos soldados estão no Afeganistão. O perigo de que percam seus olhos ainda existe. Temos uma nova guerra e a situação só tende a piorar. Trabalhamos no Kosovo para feridos de guerra e lá estão estacionados 3.500 soldados alemães e não se sabe o que vai acontecer amanhã. Vêem-se tanques de guerra alemães com bandeiras da Alemanha. É como numa guerra.

Existem ainda muitas pessoas que perdem seus olhos?

Marc Trester: Sim, claro. Elas os perdem devido a acidentes, ainda devido a acidentes de trabalho, tumores, doenças oculares.

Quais são os acidentes mais comuns que podem levar à perda da visão?

Marc Trester: Há todo tipo de acidente. Pode ser uma garrafa de água que explodiu. Existe o caso de uma senhora que estava passando pela prateleira de um supermercado quando uma garrafa de água explodiu, atingindo seu olho e provocando-lhe perda da visão. As situações mais curiosas são possíveis.

Deutschland das Institut für Augenprothetik W. Trester in Köln
Prótese é feita de vidro especial de silícioFoto: DW/C. Albuquerque

Crianças que brincam de esconde-esconde e se escondem atrás de uma porta: uma olha através do buraco da fechadura, enquanto outra enfia um lápis através do buraco. Devido ao aumento da pressão sanguínea na cabeça, em esportes como o bungee jumping, já aconteceram acidentes, ou também na montanha-russa. Pode acontecer de uma pessoa cair com a cabeça sobre o canto de uma mesa. Todo tipo de acidente é possível. Nada é impossível.

O senhor fabrica praticamente somente uma prótese sobre o olho. O que acontece quando se perde o olho todo?

Marc Trester: Quando se perde completamente o olho, um implante é feito, freqüentemente, já no hospital e nós utilizamos então a mesma prótese, como no caso em que o paciente perde a visão, mas mantém o olho.

Quem fabrica as próteses?

Marc Trester: Em princípio, nós mesmos fabricamos as próteses e as cores. Mas deixamos este trabalho para outros profissionais. A pintura das cores dos olhos é um ramo profissional próprio. Na Alemanha, há pessoas que passam o dia todo a pintar somente estas íris, estas íris de vidro. Tudo é feito a mão. Entre nós, não existe nada feito por uma máquina.

De que material é feita uma prótese ocular?

Deutschland das Institut für Augenprothetik W. Trester in Köln
Profissão exige habilidade artísticaFoto: DW/C. Albuquerque

Marc Trester: A prótese é feita de um vidro especial de silício. Ele é fabricado especialmente para protéticos e tem certas qualidades, como ser branco, ser maleável. Ao esquentar o vidro, ele se torna maleável para o manuseio.

Eu posso então determinar tamanho, diâmetro, espessura. Posso determinar tudo. A medida do olho do paciente é feita a olho. Tudo é feito de experiência, com as mãos.

É necessário muito talento. Quando não se possui esta capacidade de avaliação, têm-se então dificuldades na profissão. Uma certa veia artística, uma certa capacidade artística tem que estar presente.

Os senhores possuem próteses com diversas cores de olhos?

Marc Trester: Basicamente, existem todas as cores de olhos. Por esta razão, temos que dispor de todas elas. Existe um imenso repertório. Por esta razão, possuímos cerca de 2 mil diferentes cores de próteses. Elas são produzidas em diferentes locais e em diferentes instituições na Alemanha.

Como alguém se torna protético ocular? Existe uma formação profissional?

Marc Trester: Sim, existe uma formação profissionalizante que dura sete anos. Não há, no entanto, muitas pessoas que queiram fazê-la. Nós não somos tão conhecidos quanto outros ramos profissionais e muito dos aprendizes não querem passar sete anos em sua formação profissional. Mas quando se tem a sorte de ter prazer na profissão, esta é uma carreira bastante satisfatória.