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Eleições no Chile

14 de dezembro de 2009

Ninguém espera mudanças radicais da política econômica e social no Chile, opina a repórter Mirjam Gehrke. O país precisa é de respostas claras para questões ainda pendentes depois de 20 anos de transição da ditadura.

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A imprensa alemã acompanhou com muita atenção o processo eleitoral no Chile. A questão central para os analistas era se, ao final da jornada eleitoral deste domingo (13/12), a Concertación conseguiria se manter no poder depois de 20 anos de governo, ou se a oposicionista de direita Alianza por Chile, liderada pelo multimilionário Sebastián Piñera, poria um ponto final à transição.

O Chile é considerado não só um exemplo de transição democrática e estabilidade política, mas também uma história de êxito econômico; não se esquecendo que, apesar de tratar-se de um dos países mais prósperos da América do Sul, ainda persistem graves desigualdades sociais.

Analistas concordam que a Concertación é, do ponto de vista político, a coalizão de governo de maior sucesso na história do Chile, tendo conseguido avanços substanciais no país que hoje possui a maior renda per capita do continente sul-americano e que conseguiu reduzir a pobreza dos 40% herdados da ditadura aos atuais 14%.

Neste contexto, são surpreendentes, à primeira vista, os indicadores que revelam uma profunda insatisfação dos chilenos com sua democracia. Duas décadas após o fim da ditadura, somente 45% da população acredita que a democracia é a melhor forma de governo, enquanto 18% dos entrevistados consideram que, sob determinadas circunstâncias, um regime autoritário seria aceitável.

Se a estes últimos forem somados os 29% dos cidadãos indiferentes ao caráter democrático ou autoritário do governo, os defensores da democracia não chegam nem a ser maioria no Chile. Um dado alarmante, que exige uma análise a fundo por parte da classe política, uma vez que situa o Chile entre os países de mais frágil apoio à democracia na América Latina.

A vitória de Sebastián Piñera neste primeiro turno não significa o fim da Concertación. E, mesmo que fosse o caso, ninguém espera mudanças radicais da política econômica e social no Chile, uma vez que, nas décadas passadas, o partido seguiu um curso bem mais conservador em matéria econômica, confiando nas forças de mercado – para grande satisfação de investidores internacionais, que não se cansam de destacar que o Chile deve seu auge econômico à política de Augusto Pinochet.

Aqui, chegamos à parte mais difícil da transição chilena: o legado dos 17 anos do regime militar, com destaque não só à continuidade em matéria de política econômica, mas sobretudo à vigência ininterrupta da Constituição pinochetista. Embora tenha sido modificada em 2005, dela derivam até hoje, entre outras coisas, o sistema eleitoral binomial e a lei antiterrorismo, aplicada contra ativistas mapuches que lutam por suas terras e por seus direitos.

Em março de 2008, o Chile assinou a convenção 169 da OIT [Organização Internacional do Trabalho], que garante aos povos indígenas o respeito à sua identidade e o direito de viver em suas terras. No entanto, até agora houve apenas pequenos progressos nesse sentido.

Também há muitas tarefas pendentes na saúde e na educação: protestos estudantis e greves de professores foram a música de fundo do governo de Michelle Bachelet.

Diante da "guinada para a esquerda", que vem sendo observada em toda a América Latina nos últimos dez anos e que as eleições na Bolívia confirmaram claramente há uma semana, o Chile se destacou na percepção europeia como exemplo de estabilidade e segurança política, social e jurídica para investidores estrangeiros.

O triunfo de Sebastián Piñera neste primeiro turno gerou ainda outro tipo de considerações na Europa. Em matéria de política externa, um governo da Alianza por Chile sem dúvida se aproximaria mais do único governo de direita atualmente no poder na América do Sul, o de Álvaro Uribe na Colômbia, e aprofundaria também os laços com os EUA.

A Europa, no entanto, está interessada no progresso da integração regional na América do Sul, para qual a União Europeia poderia servir de modelo. De fato, a UE rechaça negociações com países individuais, buscando o diálogo político e econômico somente com blocos regionais, como o Mercosul, por exemplo.

Claro está que tais considerações não vão influenciar a decisão de voto dos cidadãos chilenos no segundo turno das eleições em 17 de janeiro. O país precisa é de respostas claras para questões ainda pendentes depois de 20 anos de transição, a fim de que esse capítulo possa ser encerrado com um balanço satisfatório para todos os setores da sociedade chilena.

Autora: Mirjam Gehrke
Revisão: Augusto Valente