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Ortografia, um assunto altamente emocional

dpa (av)2 de janeiro de 2003

Há 100 anos era lançado o dicionário que estabeleceu as bases da ortografia alemã, até a reforma de 1996. Nos dois casos, foi intensa a oposição de escritores, filólogos e políticos.

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A 22ª edição da bíblia do idioma alemão: o DudenFoto: AP

A resistência contra a reforma ortográfica da língua alemã na década de 90 não espantou Klaus Heller, diretor-geral da Comissão Internacional encarregada da tarefa. Afinal, também foram precisas numerosas edições do Dicionário Ortográfico do filólogo Konrad Duden até a adoção oficial, em 1º de janeiro de 1903, de uma norma unificada para o então Reino Alemão, Áustria e Suíça. As escolas imitaram as repartições públicas com o início do novo ano letivo, em 1º de abril seguinte.

"Novas regras ortográficas esbarram em modelos de comportamento muito estratificados. Portanto, necessitam de tempo até poderem se impor", admite Heller. Há 100 anos foram os mesmos profissionais – escritores e cientistas – a rejeitar a nova ortografia. Também na época reconheceu-se a necessidade de um prazo de adaptação generoso, no caso, de cinco anos.

O Duden, como é conhecido o mais conceituado dicionário da língua alemã, está atualmente em sua 22ª edição. A editora que leva o nome do influente filólogo publica mais de 200 dicionários e manuais lingüísticos. Segundo Ralf Osterwinter, do departamento de redação, "a meta de Duden foi sempre unificar e simplificar a escrita do alemão". Contudo, o máximo que os participantes da segunda Conferência Ortográfica conseguiram foi unificar a ortografia. Esse encontro, realizado entre 17 e 19 de junho de 1901, estabeleceu as normas vigentes a partir de 1903. "Quem diria que a simplificação almejada por Duden só viria um século mais tarde", admira-se Osterwinter.

Uma história que se repete

Até meados do século 19, não havia qualquer norma compulsória para a grafia do alemão: cada um escrevia da forma que considerava correta. Entre os pequenos Estados germânicos havia diversas variantes ortográficas, ditadas por razões políticas e geográficas. Além disso, poucas pessoas se ocupavam do idioma escrito. Somente com a fundação dos Estados nacionais e o melhor acesso ao ensino para a ampla população, a ortografia entrou para a pauta da política.

Cinco anos após a criação do Reino Alemão, o ministro da Cultura da Prússia convocou a primeira Conferência Ortográfica, em 1876, para "introduzir maior unidade à escrita do alemão", que entretanto terminou sem resultados práticos. Os reformistas desejavam adotar o princípio fonético – escrever o alemão como se fala –, ao que a maior parte dos estados se opôs. Somente 25 anos mais tarde organizou-se em Berlim a segunda conferência, que pelo menos alcançou um consenso mínimo. Um ano mais tarde, este foi ratificado pela câmara alta do Legislativo, o Bundesrat (ou Bundesrath, na grafia de então). "Na época foi o mesmo vai-e-vem que agora, por ocasião da nova reforma ", afirma Klaus Heller.

O especialista calcula que, de 1903 até a década passada, houve cerca de 100 iniciativas para simplificar a ortografia alemã, todas fracassadas. Um fator extra de complicação foi a divisão do país, após a Segunda Guerra Mundial. Para sanar os casos de dúvida passaram a existir duas instâncias, totalmente independentes entre si: as Edições Duden de Mannheim e as de Leipzig. Ao criar em 1974 o Grupo de Pesquisa Ortográfica, a Alemanha Oriental lançou as bases científicas para a escrita do alemão. A República Federal da Alemanha seguiria o exemplo três anos mais tarde, fundando a Comissão para Questões de Ortografia, ligada ao Instituto da Língua Alemã (IdS), sediado em Mannheim.

Mais uma reforma

Porém somente em 1994 uma comissão internacional de peritos propôs com sucesso nova série de normas: e assim a "reforma ortográfica" passou a ocupar as manchetes. Os pontos de ataque eram numerosos: a medida seria supérflua, as alterações arbitrárias e incompletas, e os custos elevados demais. Professores, secretários da Cultura e autores como Hans Magnus Enzensberger, Martin Walser e Siegfried Lenz uniram-se em plebiscitos, abaixo-assinados e manifestações de oposição. Apesar de todos os protestos, a Alemanha, Áustria, Suíça e cinco outros países assinaram, dois anos mais tarde, a Declaração de Intenções de Viena. Desta vez, o prazo para a adoção integral da nova ortografia transcorre até 31 de julho de 2005.

Dados da Comissão Internacional para a Ortografia Alemã demonstram que 80% das novas publicações já obedecem à nova norma. Triunfante, Heller afirma: "Para além dos acalorados debates e da polêmica acirrada, e sobretudo após sua adoção pela imprensa, leitores e autores reconheceram que as novas regras pouco alteram a imagem escrita do idioma".