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Projeção de desmatamento deve considerar política ambiental

Hannah Fuchs (av)4 de maio de 2015

Estatísticas não bastam, afirma Jan Börner, do centro alemão ZEF. Desde 2004, política ambiental ganha importância no Brasil e não pode mais ser ignorada quando se projetam taxas de desmatamento na Amazônia, afirma.

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O cultivo de soja contribui para o desmatamento na Região AmazônicaFoto: Reuters

Em seu mais recente relatório, a ONG ambientalista WWF alerta que, seguindo a tendência atual, até 2030 poderá ser destruída uma área de florestas tropicais equivalente a cinco vezes a superfície da Alemanha. A região mais atingida é a Amazônia. No entanto, um estudo do Centro de Pesquisa para o Desenvolvimento (ZEF, na sigla alemã) indica uma tendência diferente.

Para o especialista Jan Börner, do ZEF, as afirmativas não se excluem mutuamente, mas é preciso levar em consideração a evolução da política ambiental brasileira. "Nosso estudo mostra que ela ganhou importância no Brasil desde 2004 e não pode mais ser ignorada quando se projetam taxas de desmatamento."

Segundo ele, o retrocesso do desmatamento em alguns locais deve-se a uma convergência de fatores. "A crise econômica, por exemplo, é um deles. Durante algum tempo caiu a demanda por produtos oriundos de áreas desmatadas, sobretudo de carne bovina e soja."

"Além disso, em 2004 os brasileiros instalaram um sistema de monitoramento por satélite com o qual se pode prever onde é provável que desapareçam florestas na Região Amazônica nos dias seguintes. Desse modo, as autoridades podem estar no local e evitar que isso aconteça. A maioria dos outros países com reservas de florestas tropicais não possui um sistema assim", comenta.

DW: Em contraste às projeções do relatório do WWF Deforestation Fronts (Frentes de desflorestamento), o estudo de 2015 do ZEF mostra que as medidas para proteção da floresta tropical no Brasil estão funcionando e que o desmatamento se desacelera sensivelmente. Qual dessas versões procede?

Jan Börner: Ambas. As afirmativas não se excluem mutuamente, mas é preciso levar em consideração as hipóteses de partida, já que as informações foram geradas de maneiras distintas. Em nossa publicação, citamos as estatísticas oficiais brasileiras sobre o desmatamento, que são reconhecidas como relativamente pertinentes. Elas se referem ao passado.

Prof. Dr. Jan Börner
Para Jan Börner, Brasil avançou no combate ao desmatamento nos últimos anosFoto: ZEF

Sabe-se que, em 2004, o desmatamento atingiu um ápice, com 27.700 quilômetros quadrados por ano, e que tem caído constantemente desde então. Desde 2009-2010 ela circula pelos 5 mil quilômetros quadrados anuais.

Em contrapartida, os colegas da IIASA desenvolveram modelos para o relatório do WWF e projetaram taxas de desmatamento para o futuro. De qualquer forma, 20% das matas tropicais já desapareceram somente na Região Amazônica, devido às antigas taxas de desmatamento elevadas no Brasil.

A expectativa é que essas taxas, atualmente baixas, não vão cair ainda mais até 2030 – assim como também é improvável que nos próximos anos não vá ocorrer absolutamente nenhum desmatamento.

Mas o que também acontece – sem querer contradizer os colegas que geraram esses modelos – é que eles deixaram de levar em consideração a evolução da política ambiental. Nosso estudo mostra que ela ganhou importância no Brasil desde 2004 e não pode mais ser ignorada quando se projetam taxas de desmatamento.

Por que o desmatamento retrocedeu em alguns locais?

É uma convergência de diversos fatores. A crise econômica, por exemplo, é um deles. Durante algum tempo caiu a demanda por produtos oriundos de áreas desmatadas, sobretudo de carne bovina e soja.

Além disso, em 2004 os brasileiros instalaram um sistema de monitoramento por satélite com o qual se pode prever onde é provável que desapareçam florestas na Região Amazônica nos dias seguintes. Desse modo, as autoridades podem estar no local e evitar que isso aconteça. A maioria dos outros países com reservas de florestas tropicais não possui um sistema assim.

Quais são as principais causas da destruição da mata tropical?

Cerca de 80% das áreas que são desmatadas acabam virando pasto para gado bovino. São pastagens muito extensas, muitas vezes com menos de um animal por hectare.

Além disso, há um grande debate sobre o papel do cultivo da soja. Ele se encontrava sob uma moratória no Brasil, na qual a indústria da soja se comprometia a só comprar de agricultores que não desmatassem. Isso fez, por outro lado, com que os cultivadores de soja se espalhassem pelas antigas áreas de pasto. E os criadores de gado foram empurrados ainda mais para o interior das florestas. Foi, por assim dizer, uma mudança indireta do uso da terra.

A maior parcela do desflorestamento atinge grandes áreas, ou seja, não é causada por pequenos fazendeiros. É claro que também eles têm uma participação, mas se trata principalmente dos produtos comercializados internacionalmente e consumidos no Brasil em grande escala. Aqui está incluída, obviamente, a extração de madeira, tanto a ilegal quanto a legal.

Que efeitos o desmatamento já provoca?

Naturalmente o habitat de plantas e animais raros e endêmicos é restringido se o desmatamento avança. Mas hoje também se discute muito o papel da floresta tropical na regulação do clima regional na América Latina. Pois, nos últimos anos, houve problemas meteorológicos extremos na região.

Por exemplo, no Sul do Brasil: por vezes houve água demais, por outras, de menos. Isso pode estar ligado à propriedade da mata de canalizar para o sul a umidade que vem do Oceano Atlântico.

E, claro, também há muitas populações tradicionais cujo estilo de vida é afetado pelo desmatamento. Isso gera fortes conflitos em torno da terra, em que já houve mortes. Esse foi um dos motivos para a mudança de política no Brasil.

Então essa previsão do WWF ainda pode ser impedida? Ou será mesmo só um pouco de alarmismo?

Difícil dizer, pois o relatório do WWF não deixa claro quais modelos foram derivados de quais hipóteses. Mas também nós partimos do princípio de que a demanda por produtos como soja e carne vai subir. Assim cresce também a pressão sobre as florestas. E disso poderia resultar que as atuais medidas do governo brasileiro não sejam mais suficientes.

O interessante nessa dinâmica brasileira é que ela mostra que não é uma lei natural o desmatamento ir sempre aumentando. Ele pode perfeitamente diminuir se houver suficiente vontade política. Isso me deixa otimista. Mas, claro, o Brasil tem mais recursos que outros países – muito mais pobres – onde também há matas tropicais – por exemplo, na África ou no Sudeste Asiático.

O que se pode fazer contra o desmatamento?

O Brasil já faz muito. Uma das medidas principais é o esclarecimento dos direitos da terra: quem é responsável por que área da terra. No passado, esse foi um grande problema para a política ambiental.

Ultimamente vem sendo aplicado no Brasil o Cadastro Ambiental. Ele faz com que as pessoas que vivem ou têm terras na região – ou que pelo menos afirmam tê-las – mandem medir essas propriedades. Com esse conhecimento, é possível se fazer política ambiental de forma bem mais eficiente. Minha expectativa é que essa medida vá trazer um melhor controle do desmatamento ilegal.

No momento, infelizmente, a proteção das florestas tropicais não é prioridade máxima no Brasil. No momento o foco é controlar a inflação e manter as pessoas empregadas. Mesmo que a consciência ambiental tenha crescido sensivelmente nos últimos anos, a proteção ambiental fica de lado quando a base da subsistência está ameaçada.