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Democracia frágil

17 de fevereiro de 2010

Enquanto tropas ocidentais empreendem guerra em nome da liberdade no Iraque e Afeganistão, um relatório revela que a democracia no mundo está em declínio. Analistas ponderam o que pode ser feito.

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Qual o valor de um voto?Foto: picture-alliance/ dpa

"Pela quarta vez consecutiva, o declínio da liberdade superou as conquistas feitas em 2009". Essa foi a declaração inicial de um relatório publicado pela organização norte-americana de direitos humanos Freedom House no mês passado.

A pesquisa intitulada "Liberdade no Mundo 2010: Erosão Global da Liberdade" constatou declínio democrático em 40 países na África, América Latina, Oriente Médio e nos países da antiga União Soviética.

Medida através de indicadores que incluem liberdades civis e políticas, liberdade de imprensa e Estado de direito, cinco países foram incluídos na lista dos "não livres" e o número de democracias eleitorais caiu para o menor nível desde 1995.

Apesar de 16 dos 194 países pesquisados terem indicado progressos em relação a uma maior liberdade para suas populações, e apesar de a situação em nível mundial ter melhorado nas últimas duas décadas, Arch Puddington, diretor de pesquisas da Freedom House, descreveu os resultados como "motivo de real preocupação".

Causas diversas

Em entrevista à Deutsche Welle, ele afirmou que a desaceleração da democracia no ano passado foi mais pronunciada do que nos três anos anteriores. Ele atribui tal fato a uma ampla variedade de fatores.

Iran Wahlen Reaktionen Demonstration Mir Hossein Mussawi Anhänger in Teheran
Protesto no Irã após eleição presidencialFoto: AP

"Um deles é a crescente agressividade e autoconfiança por parte de alguns dos países mais autoritários – China, Rússia, Irã, Venezuela, Zimbábue – o que serve então como modelo para outros países", disse Puddington.

Entre outras questões em jogo estão reações a alguns ganhos democráticos da última década – como a Revolução Laranja na Ucrânia –, o cinismo que surgiu de promessas não cumpridas de prosperidade em uma sociedade justa e iniciativas para oprimir e eliminar a confiança crescente das sociedades civis.

Democracia por decreto

Alguns analistas, no entanto, não acreditam que a situação esteja tão ruim como afirma o relatório de Freedom House. Michael Efler, porta-voz do grupo alemão pró-democracia Mehr Demokratie, diz que se trata de uma questão de percepção.

"Você deve se perguntar o que é democracia", afirma Efler. "O critério liberal ocidental usado por Freedom House tem como foco as eleições. Dessa forma, se um país realiza uma votação justa, então ele é considerado uma democracia, mas eu considero isso uma maneira limitada de fazer as coisas."

Segundo ele, as eleições são de crucial importância, mas ele adverte que também é importante notar que a compreensão ocidental de democracia e direitos humanos não é compartilhada pelo mundo todo.

Die Entwicklung in Afrika steht noch aus
Primeiro a comida, depois a democraciaFoto: dpa

Ilustrando o caso com o Iraque e Afeganistão, Efler disse que "a sociedade é estruturada diferentemente e a liberdade individual não exerce um papel tão importante quanto no Ocidente."

Isso levanta a questão: as pessoas querem realmente democracia? "Eu desejaria que isso fosse um valor a que todos aspirassem, mas eu não acho que esse seja o caminho", disse. "E é inútil forçar a democracia nas pessoas porque isso não funciona."

Pobre demais para ser democracia

Humphrey Hawksley, autor do livro Democracia mata: o que há de tão bom sobre o voto?, declarou à Deutsche Welle que, para cerca de um sexto da população mundial, democracia está longe de ser percebida.

"Existem por volta de um bilhão de pessoas que passam fome, que querem abrigo, segurança de guerras tribais, que querem ser capazes de alimentar seus filhos e obter remédio para os doentes, e eles não têm nada disso. Então a democracia em si não é nenhum fator para eles", explicou Hawksley.

E apesar de a demanda por esses elementos essenciais para uma vida simples estar ligada conceitualmente à imagem de uma sociedade justa com uma eleição democrática, Hawksley acha que, geralmente, o que leva os eleitores às urnas não é a esperança por um futuro melhor, mas a oportunidade de expulsar um governo existente.

"Esse é o principal argumento", afirmou. "Mas o que fazer se o seu hospital ainda é uma bagunça, se a sua estrada ainda é uma bagunça, se os níveis de mortalidade infantil ainda estão enormemente elevados? E o que fazer após vivenciar toda essa situação, se no final nada adianta para os cidadãos que votam?"

Isso, afirmou o autor, é o que os países deveriam estar se perguntando, caso queiram criar sociedades civilizadas e calmas. A pergunta é a resposta.

Autora: Tamsin Walker (ca)

Revisão: Roselaine Wandscheer