1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Simpósio discute papel do Brasil no mundo

Rodrigo Rimon18 de junho de 2004

A sétima edição do Simpósio Brasil-Alemanha reuniu, em Berlim, intelectuais e políticos brasileiros e alemães para discutir as novas responsabilidades do Brasil no sistema internacional.

https://p.dw.com/p/5CbY
Embaixador brasileiro falou em amadurecimento internoFoto: H. Lüders

Cerca de um ano e meio após o presidente Lula ter assumido o governo, a Fundação Konrad Adenauer e a Sociedade Brasil-Alemanha reuniram, na capital alemã, intelectuais e políticos brasileiros e alemães para discutir as "novas responsabilidades do Brasil no sistema internacional".

O objetivo do simpósio bienal e que durou dois dias foi apresentar, além das diretrizes da política externa do governo Lula, projetos de reforma brasileiros e interesses mútuos entre Brasil e Alemanha. A discussão, que envolveu temas como segurança internacional, políticas de desenvolvimento e zonas de livre comércio, como Mercosul e Alca, girou em torno de uma questão central: a necessidade de reformas internas como condição para uma maior atuação política internacional.

"Vemos o Brasil em um bom caminho, tanto como um player nacional quanto internacional", disse Wilhelm Staudacher, secretário-geral da Fundação Konrad Adenauer. "Ele assume cada vez mais o papel de porta-voz dos países em desenvolvimento", disse, alertando, entretanto, para a necessidade de uma base estável no próprio território.

Tempo de "conquistas expressivas"

O embaixador brasileiro na Alemanha, José Artur Denot Medeiros, ressaltou "conquistas expressivas" do governo Lula, tanto no âmbito comercial e financeiro, como a criação do Grupo dos 20, que reúne países em desenvolvimento, quanto político, citando a participação mais ativa do Brasil na ONU e sua luta por um assento permanente no Conselho de Segurança.

"Temos as credenciais para isso e muitos países concordam conosco", afirmou, pleiteando reformas no sistema das Nações Unidas. Segundo ele, o Brasil ofereceu a contrapartida para "uma ordem internacional mais democrática e multipolar e uma globalização mais solidária, menos excludente dos países em desenvolvimento".

Para o professor Luís Cervo, da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, a política externa de Lula não é apenas uma continuação da exercida no governo FHC. Para ele, Lula está empenhado em resgatar os "laços perdidos com a Índia, a China, a África do Sul e os países árabes", criando uma cooperação Sul-Sul. "Lula subordinou a criação de regras no comércio internacional aos interesses reais do Brasil", defendeu, enquanto FHC teria agido com um "idealismo kantiano" e lutado apenas por uma aliança com o Ocidente.

Indícios de uma nova consciência política

Segundo Christian Ruck, membro da Comissão de Cooperação Econômica e Desenvolvimento do parlamento alemão, "por muito tempo o Brasil foi visto na Alemanha como um poder passivo, com uma política decidida, mas discreta". Agora, segundo ele, há "indícios de uma nova consciência política" do Brasil no âmbito internacional.

Denot Medeiros garante que a mudança é "resultado do amadurecimento interno alcançado pelo Brasil" e que a ambição internacional de Lula nada tem a ver com "vaidade ou motivações hegemônicas não justificadas".

Brasil e Alemanha: interesse mútuos

Nas relações bilaterais Brasil-Alemanha, Ruck identificou interesses mútuos, como o reconhecimento da necessidade de reformas essenciais na ONU, o desejo de obter uma vaga no Conselho de Segurança e a luta pela aprovação do Protocolo de Kyoto e pela criação de uma zona de livre comércio entre UE e Mercosul.

Quanto ao último tema, Ruck salientou a urgência das reformas agrária e previdenciária e da diminuição do fosso entre ricos e pobres no Brasil e da importância da conscientização da população rural européia quanto a medidas de liberalização. "Já não é o Norte quem exige do Sul abertura de mercados e liberalização do comércio", lembrou.

Na seqüência, leia sobre um tema polêmico apresentado na conferência.

O Mercosul morreu, viva o Mercosul!

Präsident von Brasilien Luiz Inacio Lula da Silva Porträtfoto
Governo Lula no cenário internacional em debateFoto: AP

"Como mecanismo de geração de comércio, o Mercosul obteve pleno sucesso", concluiu o presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais e ex-embaixador do Brasil na Argentina, José Botafogo Gonçalves, em seu balanço positivo da aliança. Segundo ele, "o Mercosul gerou uma mentalidade de integração regional, deixando para trás uma história de nacionalismos".

Botafogo argumenta que o sucesso do Mercosul depende da conjuntura econômica de seus membros, mas garante que houve uma retomada do crescimento comercial no bloco desde o fim da paridade do peso argentino com o dólar. Para o futuro, ele vê desafios tanto no âmbito institucional, como a supranacionalização de órgãos legislativos e a aproximação dos sistemas fiscais e tributários de seus sócios, quanto em cada um de seus países. A liderança no processo de integração, entretanto, "não pode ser dada a mais ninguém que ao Brasil".

Política externa para esconder fracassos internos?

Um tanto polêmica foi a participação do professor Stefan Schirm, chefe da cátedra de Política Internacional da Universidade Ruhr, na cidade de Bochum. Schirm questiona se a campanha internacional de Lula não seria nada mais que uma saída para esconder seus fracassos na política interna.

Além disso, Schirm comparou elementos da atual política externa brasileira com a campanha Brasil Potência, pregada pela ditadura do general Médici durante os anos 70, que promovia o comércio Sul-Sul e a confrontação com os EUA. Segundo ele, o Brasil não estaria contente com as negociações da Alca, pois para os Estados Unidos o Brasil é apenas o segundo país mais importante, depois do México, o que seria contra os "planos ideológicos" do presidente Lula.

Mais além, quanto à vontade de participação no Conselho de Segurança da ONU, Schirm polemiza: "Será que uma democracia em desenvolvimento, que tem que lutar contra fome, analfabetismo e pobreza maciça, pode contribuir para a democracia mundial?".

Um salto diplomático qualitativo

Já o professor Alfredo Valadão, do Instituto de Estudos Políticos de Paris, enumerou indícios do que chamou de um "salto qualitativo" na tradição diplomática brasileira. Para ele, as reivindicações à ONU mostram que o governo está pronto para assumir suas responsabilidades internacionais.

Provas disso seriam conquistas como a criação do chamado Grupo dos Amigos da Venezuela, o aprofundamento de questões de segurança e das intervenções militares do Mercosul, o desenvolvimento de um serviço de inteligência na fronteira amazônica e a estreita cooperação com os Estados Unidos na luta contra o narcotráfico. Valadão salientou também a participação de aviões brasileiros na primeira expedição militar da UE no Congo e a intervenção militar das Forças Armadas brasileiras no Haiti.

Entretanto, Valadão admite impasses nessa transição brasileira do "isolacionismo inteligente" à "participação responsável", que afetam a transparência brasileira e promovem um retorno do país à imprevisibilidade. Entre eles, a intenção brasileira de exportar urânio enriquecido e a instabilidade do mundo andino, com a possível expansão dos problemas da Colômbia ao território amazônico. Na sua opinião, é preciso repensar as Forças Armadas brasileiras e a segurança interna, para poder "exportar estabilidade e não importar instabilidade".