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Temer, o presidente que ninguém pediu

Jean-Philip Struck31 de agosto de 2016

Ruim de voto, antigo vice construiu carreira nos bastidores, chamado por adversários de um profissional do mundo das intrigas. Ele chega ao poder com índices de rejeição popular similares aos de Dilma.

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Foto: Reuters/U. Marcelino

De personalidade discreta, Michel Temer construiu uma longa carreira nos bastidores da política brasileira antes de ser alçado à Presidência da República.

Considerado hábil politicamente, colecionou diversos adjetivos nas últimas décadas, como conciliador e formal. Adversários, por sua vez, o acusam de ser um profissional no mundo das intrigas. Um senador baiano certa vez o definiu como "um mordomo de filme de terror". Pouco conhecido dos brasileiros antes da crise que passou a assolar o governo Dilma, Temer também já foi chamado de "esfinge" por causa da sua capacidade de permanecer enigmático. Já a ex-presidente Dilma Rousseff o qualificou como "traidor" e "usurpador". Aos 75 anos, ele se tornou a pessoa mais velha a assumir a Presidência da República.

Temer é elogiado pelo mercado, mas sofre resistência da população. Pesquisas divulgadas na última semanas mostram que o vice só tem a aprovação de pouco mais de 10% dos brasileiros. Outras sondagens indicam que quase metade dos brasileiros não vê diferença entre ele e Dilma.

Temer assumiu a presidência interinamente em 12 de maio, quando Dilma foi afastada temporariamente pelo Senado. Fez poucas aparições públicas nesse período, especialmente para evitar a hostilidade da população – a exemplo do que ocorreu na abertura dos Jogos Olímpicos, quando foi vaiado. Para tentar conquistar simpatia, tem favorecido eventos supervisionados e controlados.

A carreira de Temer é marcada por esse comportamento distante do público. Ele nunca ocupou um cargo executivo de destaque, como prefeito e senador. Foi deputado por seis mandatos e chegou a ocupar a presidência da Câmara entre 1997 e 2001 e entre 2009 e 2010. Seu poder reside, sobretudo, em sua capacidade de lidar com as diferentes alas do seu partido, a velha política de bastidores. Nos últimos 15 anos Temer ocupou a presidência do PMDB, a maior agremiação política do Brasil, que, apesar de não disputar diretamente uma eleição presidencial há 20 anos, participou de todos os governos desde a redemocratização, em 1985.

Ruim de voto

Filho de um casal de libaneses que emigrou para o Brasil nos anos 1920, Temer nasceu na pequena cidade de Tietê, no interior de São Paulo. É o caçula de oito irmãos. Sua origem árabe é celebrada no vilarejo libanês dos seus pais, que batizou uma rua com o nome dele quando ele foi eleito vice-presidente. Recentemente, um grupo de moradores apagou o prefixo "vice" das placas, deixando apenas "presidente Temer".

Com formação na área jurídica, Temer atuou como professor de direito constitucional. É casado com uma ex-modelo 43 anos mais jovem. O casal tem um filho de 6 anos.

Fora Temer: Protesto contra o então presidente interino durante os Jogos Olímpicos do Rio
Fora Temer: Protesto contra o então presidente interino durante os Jogos Olímpicos do RioFoto: Reuters/U. Marcelino

Temer entrou na vida pública no início dos anos 80, ao ingressar no PMDB. Seu primeiro cargo foi a chefia da Procuradoria-Geral de São Paulo. Depois foi secretário de Segurança Pública (SSP) do mesmo Estado. Em 1986, candidatou-se ao primeiro mandato, como deputado constituinte. A partir de 1995, instalou-se de vez em Brasília, passando a ocupar sucessivos mandatos como deputado federal. Foi subindo até assumir a presidência da Câmara e, em 2001, a chefia do PMDB.

Apesar da carreira sempre ascendente, nunca foi bom de voto. Nas duas primeiras oportunidades em que foi eleito, amargou primeiro a suplência antes de assumir o mandato. Em 2006, recebeu 99 mil votos, e só foi reconduzido mais uma vez à Câmara graças à soma de votos da coalizão. Seus aliados mais próximos admitem que ele é ruim de palanque e enfrenta dificuldades por causa do seu modo excessivamente formal, que se reflete também nas suas roupas e no cabelo, sempre impecavelmente alinhado. A discrição com o público é compensada pela desenvoltura diante de plateias menores.

Mesmo transitando bem nas diferentes alas do PMDB, Temer também colecionou desafetos, como Renan Calheiros, hoje presidente do Senado e seu principal rival dentro do partido. E também acumulou sua fatia de escândalos. Foi citado por dois delatores da Operação Lava Jato, que o acusaram de ser beneficiário do esquema. Em 2009, seu nome apareceu 21 vezes numa planilha da empreiteira Camargo Corrêa aprendida pela Polícia Federal. Nenhuma das investigações provocou maiores consequências.

Dificuldades com Dilma

No comando do PMDB, Temer sempre teve que lidar com os diferentes feudos e a fragmentação típica do partido. Comandou esses grupos numa aproximação com o ex-presidente Lula em 2003, deixando para trás a aliança com o PSDB durante o governo de FHC. O gesto iniciaria uma parceria que duraria todo o mandato do petista.

Ao contrário da rotina dos anos Lula, a aliança começou a sofrer abalos sob Dilma. Vários setores do PMDB começaram a se queixar de que a presidente não dividia o poder com seu parceiro de coalizão. Aliados afirmam que o vice também começou a ser isolado por Dilma e outros petistas, que davam preferência a partidos menores, minando a posição do PMDB.

Dilma com Temer na cerimônia entrega do imóvel 1 milhão do Programa Minha Casa, Minha Vida, em Brasília
Dilma com Temer na cerimônia entrega do imóvel 1 milhão do Programa Minha Casa, Minha Vida, em BrasíliaFoto: Wilson Dias/ABr/CC BY 3.0 BR

Em dezembro de 2015, Tener finalmente revelou o que pensava sobre a relação quando rompeu publicamente com Dilma por meio de uma carta, na qual acusou a então presidente de tratá-lo como um "vice decorativo".

Muitos reagiram com surpresa por o discreto Temer ter tomado uma posição tão dura, mas especialistas dizem que ele apenas seguiu a tendência que já havia se formado entre a maioria dos peemedebistas. A partir daí, Temer passou de vez para o lado dos rebeldes e articulou, em março, a saída do PMDB do governo, encerrando uma parceria que durou 13 anos. Na sequência, passou a se dedicar a derrubar Dilma, só que sem fazer pessoalmente grandes discursos e acusações públicas, mas sempre atuando nos bastidores.