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Massacre em escola

9 de abril de 2011

Tragédia na escola carioca traz lembranças a atingidos pelo massacre de Winnenden, afirma psicólogo Thomas Weber. Ele é coordenador do atendimento aos sobreviventes do crime ocorrido há dois anos em colégio alemão.

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Massacre em escola de Winnenden deixou 15 mortosFoto: AP
Thomas Weber Trauma Transform Consult TTC
Thomas Weber é especialista em traumas psicológicosFoto: picture-alliance/ dpa

Acontecimentos como o massacre em Realengo, no Rio de Janeiro, contribuem para reabrir as feridas do massacre na escola secundária de Winnenden, afirma o psicólogo Thomas Weber. O especialista em traumas psicológicos coordena há dois anos o atendimento permanente a vítimas da tragédia, na qual 15 pessoas foram mortas, após a invasão de uma escola secundária alemã por um adolescente armado, em março de 2009. Até hoje, os sobreviventes podem recorrer ao serviço chefiado por Weber, através de uma linha telefônica especial. O psicólogo também atuou no apoio aos afetados em dois ataques semelhantes, nas cidades de Emsdetten e Erfurt.

Em entrevista à Deutsche Welle, o terapeuta alemão afirma que a ação da mídia na exploração dos fatos pode prejudicar a recuperação psicológica dos atingidos e afirma ser importante um atendimento a longo prazo, assim como o aumento do apoio sócio-psicológico nos colégios para que um segundo massacre possa ser evitado. "Infelizmente, agora, é grande a probabilidade de que alguém tente repetir esse crime no Brasil", ressalta.

Deutsche Welle: O senhor coordena há dois anos a assistência a vítimas, alunos e às famílias que vivenciaram o massacre de Winnenden. Como é esse trabalho?

Thomas Weber: O acompanhamento foi realizado no primeiro ano e meio e ainda hoje acontecem conversas isoladas. Um massacre provoca nos atingidos um grande sentimento de impotência, que pode levar a reações psicológicas muito graves. As pessoas são sempre tomadas pelas recordações dos acontecimentos, há uma hiperexcitação do corpo, a pessoa se queixa de distúrbios do sono, de concentração. Aqui é importante que as pessoas, no começo, vivenciem muita tranquilidade e paciência no meio em que vivem.

Quando começou o trabalho de acompanhamento psicológico?

O acompanhamento psicológico começou imediatamente no dia do acontecido em Winnenden. Sobretudo, através de psicólogos especializados em trauma e psicólogos escolares que implementaram o trabalho no tempo posterior. Quer dizer, as turmas atingidas receberam acompanhamento, os pais receberam acompanhamento, através de reuniões informativas. Conversamos também com os próprios alunos separadamente.

O que o senhor acha importante que seja feito agora, no caso brasileiro?

É importante que as pessoas tenham paciência com as pessoas. Sobretudo que a sociedade, o ambiente social, a comunidade escolar, digamos, se una para trabalhar o luto em comum e que os atingidos não sejam pressionados. Alguns alunos conseguem esquecer o acontecido rapidamente. Mas os pais dos alunos assassinados, por exemplo, serão aqueles que mais sofrerão. Mesmo que o assassino esteja morto, os pais dos mortos digamos, cumprem uma pena perpétua.

Importante é, sobretudo, que se pense a longo prazo. A ajuda é importante não somente nos primeiros dias. Nos primeiros dois a três meses, a necessidade por algum tipo de terapia deve crescer nessas famílias. Geralmente, muita ajuda é disponibilizada logo nos primeiros dias. Mas somente no decorrer dos meses seguintes, as vítimas vão se dar conta de como o ocorrido representa um peso em suas vidas.

O senhor criticou o comportamento da mídia na exploração do ocorrido em Winnenden. Qual a ameaça dos meios de comunicação na recuperação psicológica das vítimas?

O importante é que as pessoas não sejam excessivamente cobradas pela mídia. Na Alemanha, nos primeiros dias, a mídia agiu de forma muito invasiva com as vítimas e seus familiares. Os alunos tinham que dar entrevistas frequentes sobre seus sentimentos, não tiveram condições de atravessar a fase inicial de luto em tranquilidade. Toda lágrima, toda vela acessa era filmada várias vezes. As crianças e os pais sofreram muito com esse assédio. E por isso houve uma relação muito controversa com a mídia nos primeiros meses após o ocorrido.

O que o senhor sugeriria no caso brasileiro na relação entre vítimas e a mídia?

Importante é ter um diálogo construtivo com a mídia. Em nosso caso, foi o que fizemos no decorrer dos meses. Junto com os meios de comunicação, combinamos determinadas regras de comportamento que foram empregadas no primeiro aniversário dos acontecimentos de Winnenden e aceitas por quase todos os veículos.

Quais medidas terapêuticas foram oferecidas na época e quais são oferecidas hoje em dia para essas pessoas?

Sobre essas medidas, o importante é que sejam voluntárias. As pessoas só são acompanhadas se desejarem. Em um primeiro momento, muitos procuram superar sozinhos a experiência. Então, sempre estivemos à disposição, mas se os atingidos não queriam, esse desejo foi respeitado. Importante é que as ações sejam orientadas segundo as suas necessidades e não segundo as nossas.

Na época, destacamos psicólogos responsáveis para cada uma das turmas atingidas, conversamos com os pais e organizamos reuniões para esclarecer sobre possíveis consequências psicológicas posteriores. Algumas pessoas que não conseguiram superar psiquicamente o ocorrido foram posteriormente encaminhadas a centros de terapia.

Até hoje, há ainda alguns poucos pacientes em terapia. Por outro lado, em Winnenden, o acontecido continua sendo discutido, ainda informamos as pessoas. Ele ainda faz parte do cotidiano, dentro da escola sobretudo. Então sempre conversamos sobre o tema. E, claro, acontecimentos como esse no Brasil também contribuem para que sejam lembradas as próprias feridas daquele 11 de março de 2009.

Que medidas seriam importantes para evitar que tal tragédia se repita no Brasil?

Os motivos dos causadores dessas tragédias são muito diversos. É muito difícil fazer prognósticos. Mas se um crime desses ocorreu uma vez, a probabilidade de que alguém tente imitar o ocorrido é grande. O acontecido no Brasil foi o primeiro incidente do tipo no país. E, infelizmente, é grande a probabilidade que alguém, agora, tente repetir esse crime no Brasil. Tentar antever um ato como esse é fundamental. E isso só pode ser feito se houver um elevado número de assistentes sociais e psicólogos atuando no sistema escolar para tratar do problema.

Autor: Márcio Damasceno
Revisão: Carlos Albuquerque