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Três anos de Lava Jato desestabilizam mundo político

17 de março de 2017

Após abalar PT e Dilma, operação ameaça sacudir governo Temer. No total, 89 pessoas já foram condenadas na primeira instância, mas processo se arrasta no caso de políticos com foro privilegiado.

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Polícia Federal
Operação da Polícia Federal já teve 38 fasesFoto: Brasilia Polícia Federal

O que começou como uma investigação regional para combater uma quadrilha do norte do Paraná, formada por doleiros e um político local, acabou se transformando na maior operação de combate à corrupção da história do Brasil. Três anos depois da deflagração da sua primeira fase ostensiva, em 17 de março de 2014, a Lava Jato chega a um momento crucial. Após abalar o PT e o governo de Dilma Rousseff, a operação agora ameaça desestabilizar a administração de Michel Temer.

O pontapé para que a investigação deixasse os limites do Paraná e sacudisse o establishment político e empresarial do Brasil ocorreu praticamente por acaso, quando os investigadores se deparam com uma nota fiscal em poder de um doleiro. O documento mostrava a "doação" de um Land Rover para o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. A partir daí, a Lava Jato começou sua trajetória nacional.

Operação em números

Ao longo de seus 1.096 dias, a Lava Jato teve 38 fases e condenou 89 pessoas. As penas somam pelo menos 1.362 anos de prisão. Ao todo, 260 pessoas foram denunciadas.

Os investigadores também apontaram que os crimes envolveram o pagamento de 6,4 bilhões de reais em propinas – 3,2 bilhões foram bloqueados. Os pedidos de ressarcimento feitos pelos procuradores totalizam 38,1 bilhões de reais, incluindo multas.

Desde o seu último aniversário, a Lava Jato também passou por um processo de expansão internacional, revelando um modelo de corrupção exportado por empreiteiras brasileiras.

Os países mais corruptos do mundo

O Ministério Público atendeu ou fez pedidos de cooperação com 43 países, além de ter dado início à formação de uma força-tarefa conjunta com as procuradorias de alguns governos da América Latina. Agora, a Lava Jato também chacoalha o establishment político de países como o Peru, onde foi decretada a prisão do ex-presidente Alejandro Toledo.

No Brasil, o último ano também viu a prisão de figuras outrora influentes, como o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB). "Filhotes" da operação em outros estados, que investigam corrupção em empresas além da Petrobras, também prenderam o ex-governador Sérgio Cabral e o empresário Eike Batista.

No momento, 23 pessoas permanecem detidas por consequência da operação. Entre elas, também estão os ex-ministros José Dirceu e Antônio Palocci e os ex-deputados André Vargas e Pedro Correa, além do empreiteiro Marcelo Odebrecht.

Os números mostram a rapidez com que atua a Justiça Federal do Paraná, que se concentra nos réus sem direito a foro privilegiado. No caso dos executivos da Odebrecht, o juiz Sérgio Moro precisou de apenas sete meses e meio a partir do recebimento da denúncia para dar o veredicto.

Já o tempo total da denúncia até o fim do julgamento em segunda instância tem sido de, em média, um ano e dez meses. Apenas 4,5% dos condenados conseguiram reverter as penas em instâncias superiores.

Impacto político

Mas se a Lava Jato tem resultados impressionantes na primeira instância, o mesmo não ocorre no Supremo Tribunal Federal (STF) – responsável por analisar os casos de políticos com foro privilegiado.

Até o momento, apenas cinco parlamentares se tornaram réus no STF, dois anos após a apresentação da primeira lista de políticos suspeitos de envolvimento nos desvios da Petrobras. Ninguém foi condenado pelo Supremo até agora. Os únicos políticos presos foram os que já não possuíam mais mandato.

Eduardo Cunha
O ex-deputado Eduardo Cunha foi um dos presos famosos do último anoFoto: Reuters/A. Machado

Sem prisões, o efeito da Lava Jato nesses casos tem sido o de desestabilizar o mundo político. A apresentação da primeira lista do procurador-geral, Rodrigo Janot, em março de 2015, envenenou a relação entre o governo Dilma e sua base aliada. As revelações também ajudaram a manchar a imagem do PT e impor uma derrota eleitoral arrasadora ao partido nas eleições de 2016.

Desta vez, a segunda lista de Janot, com 83 pedidos de inquérito, pode desestabilizar ainda mais o governo Temer, que também sofre com outros escândalos paralelos. Informações já vazadas da lista revelam que foram feitos pedidos de abertura de inquérito contra seis ministros do peemedebista. Uma série de governadores também deve ser investigada. O próprio Temer foi citado 43 vezes apenas por um dos delatores da Odebrecht.

Em janeiro, o andamento da Lava Jato no STF sofreu um duro golpe com a morte do relator Teori Zavascki. Seu substituto, Edson Fachin, tem um perfil semelhante, mas ainda vai precisar de tempo para entender o caso com a profundidade de seu antecessor.

A Lava Jato também pode ter nos próximos meses influência direta nas candidaturas à Presidência em 2018. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já é réu em três processos relacionados à Lava Jato – além de outros dois em operações relacionadas.

Sem foro privilegiado, o futuro de Lula está nas mãos de Moro. Se considerada o tempo médio dos processos na primeira e segunda instâncias, o ex-presidente arrisca se tornar um ficha-suja até as próximas eleições, o que o tiraria do páreo.

"Risco de retrocesso"

Nas raras entrevistas que concedeu, Moro manifestou preocupação com o futuro da operação. Ao jornal Valor Econômico, ele denunciou na semana passada tentativas do meio político de proteger os investigados.

"Eu realmente acho que há risco de retrocesso [...] Se fosse ao caixa dois seria algo menos preocupante. Digo a tentativa de anistia geral. E ainda tem uma incógnita, porque há muitas investigações em andamento. Teremos de ver qual será o destino delas”, disse o juiz.

Juiz Sérgio Moro
Moro diz não saber quando Lava Jato deve acabar Foto: Imago

Desde 2015, os procuradores da Lava Jato têm promovido a aprovação de um pacote anticorrupção no Congresso. No final do ano passado, a iniciativa foi desfigurada pelos parlamentares, que chegaram a incluir emendas que previam a punição de juízes e procuradores por abuso de poder.

As ações dos deputados causaram repúdio entre a população e acabaram sendo contestadas em tribunais. Parlamentares já deram sinais de que essa não deve ser a última tentativa de barrar a Lava Jato por vias políticas.

Por enquanto, Moro continua a gozar de bastante popularidade. Uma pesquisa divulgada em fevereiro apontou que suas ações são aprovadas por 65% da população. Mas no último ano, a atuação do juiz passou a ser mais criticada no meio jurídico e em alguns setores da imprensa, especialmente após a divulgação dos grampos do ex-presidente Lula, que tiveram papel determinante na derrocada final do governo Dilma.

Ao ser perguntado quando a Lava Jato seria encerrada, Moro falou que não poderia fazer qualquer previsão. O núcleo da operação em Curitiba ainda continua revelando novos personagens dos esquemas de corrupção, como o lobista Jorge Luz.

No STF, a volumosa delação premiada dos executivos da Odebrecht sinaliza que as investigações devem se estender por vários anos, atravessando mais um novo governo após 2018. No caso do Mensalão, julgamento que se tornou uma referência para crimes envolvendo quadrilhas formadas por políticos, as primeiras audiências só ocorreram sete anos depois da eclosão do escândalo. É possível que alguns dos julgamentos ocorram anos após o início da Lava Jato.