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Visita de Obama evidencia contradições de Cuba

Astrid Prange (av)20 de março de 2016

Por um lado, alívio e esperança econômica; por outro, conflitos ideológicos e tensões sociais crescentes: a crônica de uma reaproximação tão inevitável quanto difícil entre Havana e Washington.

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Kuba Poster Raul Castro Obama
Foto: picture alliance/abaca/D. Olivier

Neste domingo (20/03), pela primeira vez em 88 anos, um presidente dos Estados Unidos volta a pisar Cuba. Mas, enquanto Calvin Coolidge chegou à ilha caribenha em 1928 num navio de guerra, Barack Obama e Raúl Castro visam dar um fim definitivo às hostilidades.

"A visita de Obama é um acontecimento histórico para a população", afirma o especialista em Cuba Bert Hoffmann, diretor do Instituto Giga de Estudos Latino-Americanos. "Justamente os mais velhos dizem: 'Quem diria que eu ainda ia viver para ver isso!'"

Não faltaram gestos simbólicos antecipando a histórica visita. Na sexta-feira, o ministro cubano do Exterior, Bruno Rodríguez Parrila, anunciou que seria abolida a taxa de 10% sobre as transferências bancárias dos EUA para Cuba, instituída por Havana em 2004. Isso elevará a renda de muitos cubanos, dependentes dos depósitos de seus familiares em solo americano.

Obama é recebido com aplausos em Havana

Entre rigor e pragmatismo

Nos EUA, em contrapartida, os cidadãos cubanos em visita ao país passam a poder trabalhar regularmente, abrir contas bancárias e receber bolsas de estudos. Além disso, o tráfego postal entre os dois países será retomado depois de 48 anos.

Segundo Hoffmann, "em Havana aconteceu mais no último ano e meio do que nas cinco décadas anteriores". O afluxo de turistas americanos fez crescer a economia, e a esperança é que essa dinâmica se manterá: mais internet, mais dólares, mais visitantes.

Mas Havana também segue seu próprio curso. Ainda na sexta-feira, Castro concedeu ao presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, a mais alta distinção do governo comunista, a Ordem José Martí. A justificativa é Maduro ter se defendido "com coragem e inteligência" contra o decreto americano em que a Venezuela foi classificada como perigo para os EUA.

Apesar dos sentimentos primaveris entre Washington e Havana, o governo cubano se mantém firme em suas reivindicações. Uma delas já foi cumprida: em maio de 2015 os americanos riscaram Cuba da lista negra dos Estados que apoiam o terrorismo. Entretanto ainda faltam o fim do embargo e a devolução da base militar de Guantánamo.

"Raúl Castro tem que formular essas exigências máximas, ele é representante da Revolução Cubana", explica Bernd Greiner, cientista político do Instituto de Pesquisa Social de Hamburgo. Por outro lado está claro que tais exigências não serão cumpridas ao pé da letra.

USA Kuba Raul Castro und Barack Obama
Castro (esq.) e Obama na Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, setembro de 2015Foto: Reuters/K. Lamarque

Entre a Revolução e o capitalismo

Greiner e Hoffmann concordam que o presidente Castro é a figura-chave para uma aproximação bem-sucedida entre os dois países. "É super importante que seja Raúl Castro a receber Obama, e não o seu sucessor. Senão, todos sairiam dizendo: 'Fidel nunca teria feito isso.' De Raúl não se pode dizer isso, ele fala em nome da Revolução, com toda legitimação histórica."

Em Cuba, em meio a toda a euforia pela abertura econômica e política, contudo, também se acumulam as críticas à desigualdade social crescente. Pois, enquanto donos de restaurantes e bares lucram com os dólares dos turistas, os professores e médicos na zona rural saem de mãos vazias.

A revista oposicionista Convivencia aponta como "o custo de vida sobe vertiginosamente", "a violência aumenta e falta tudo". Também observadores externos como Bert Hoffmann registram quão difíceis de sustentar são as contradições do caminho cubano.

"Para o governo, a aproximação não é nada simples, pois a Revolução Cubana se legitima na formação de um front contra os Estados Unidos." Enquanto isso, o processo de reforma política não vai tão longe quanto deveria, não sendo nem coerente nem transparente, aponta o especialista do Instituto Giga.

No entanto, ele não vê alternativa a essa aproximação: "Os EUA são o parceiro de negócios natural para praticamente tudo, pela proximidade geográfica entre os países . E, sozinhos, os 2 milhões de cubano-americanos que vivem nos EUA levam mais dinheiro para Cuba do que a União Europeia."