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Economia argentina sofre efeitos de medidas populistas

12 de fevereiro de 2013

Durante anos o governo argentino deixou a inflação subir de forma camuflada. Agora preços do varejo estão congelados. É praticamente uma confissão de fracasso, favorecendo mercados negros e outras práticas escusas.

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Foto: REUTERS

A erva-mate começa a faltar nos supermercados argentinos. Isso é quase uma situação de emergência, já que o mate é a bebida nacional. No entanto, açúcar e trigo também estão sendo racionados. Alguns supermercados limitaram o número de pacotes por consumidor. Nas lojas, onde não há esse limite, os argentinos encontram as prateleiras vazias.

Até mesmo o jornal Página 12, que apoia o governo, já escreveu sobre o assunto em seu site, afirmando que até o momento não foi possível perceber uma escassez mais pronunciada. No início da última semana, o Ministério da Economia argentino congelou por 60 dias os preços de alimentos e artigos domésticos. De acordo com a versão oficial, governo e comércio varejista teriam chegado juntos a esse acordo.

Baixa confiabilidade

Há anos o governo federal vem camuflando o aumento da taxa inflacionária. Enquanto o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec) calculou uma inflação de 10,8% em 2012, agências independentes falam de 25,6%. "Em 2007, o governo ocupou cargos importantes do Indec com pessoas de sua confiança", explica o economista Federico Foders.

Argentinien Mate-Tee Supermarktregal
Prateleiras cheias são coisa do passadoFoto: cc-by-sa/Oskari Kettunen

Para o especialista em América Latina do Instituto de Economia Mundial, sediado em Kiel, o controle dos preços é quase uma confissão por parte do governo. "Não haveria nenhum motivo para congelar os preços, se a inflação não fosse tão alta."

O próprio Fundo Monetário Internacional (FMI) já condenou essa prática. Num comunicado oficial de 1º de fevereiro último, a instituição censurou o governo argentino pela má confiabilidade de seus dados econômicos.

Luta fingida contra a inflação

Segundo Foders, a intenção da presidente Cristina Kirchner não é somente disfarçar os dados econômicos. Ele acredita que haja dois objetivos bem concretos por trás dessa prática. "Primeiramente os salários, baseados nas taxas de inflação, não devem aumentar tão rápido, e, segundo, assim o governo pretende economizar."

Os títulos públicos argentinos incluem juros de bônus, acoplados à inflação. Quanto maior esta é, mais altos são os juros que o governo tem que pagar a seus credores, explica o economista. A questão é tão séria para Kirchner que, atualmente, quem divulgar números diferentes está sujeito a multas ou mesmo prisão.

Prof. Dr. Federico Foders
Federico Foders não acredita no interesse de Kirchner na estabilidade dos preçosFoto: IfW Kiel

Institutos de pesquisa privados e bancos contornam a situação disponibilizando os seus dados para os parlamentares. Estes gozam de imunidade, mesmo sob o governo Kirchner, e podem divulgar impunes as informações.

Foders explica por que Buenos Aires não adota medidas efetivas contra a inflação: "O governo argentino vem seguindo há muitos anos uma política fiscal e monetária expansiva", e não é fácil fazê-la retroceder. Segundo o especialista, a presidente não tem grande interesse em controlar de fato a inflação. "O governo segue uma política populista com muitos subsídios e transferência de verbas estatais, e dá pouca importância à estabilidade dos preços."

Oportunidade para o mercado negro

Porém, tampouco o controle de preços é capaz de frear a inflação a longo prazo. A medida tem repetidamente sido aplicada na Argentina, por exemplo, durante a grande recessão de 2001-2002, que culminou na falência do Estado.

A atual imposição afeta somente o comércio varejista e, poucos dias após o seu início, as prateleiras dos supermercados estão vazias. "Esta é a consequência lógica do controle dos preços. As empresas produzem menos, os lojistas têm menos para vender. Pois eles não desejam que seus produtos sejam vendidos abaixo do preço de custo", explica Foders.

Segundo ele, logo poderiam surgir mercados negros, oferecendo, a preços ainda mais altos, os produtos em falta. As divisas, cuja entrada no país é fortemente controlada, já apresentam cotações divergentes: enquanto oficialmente o dólar americano vale cerca de cinco pesos argentinos, no mercado negro ele chega a sete pesos.

Freio para a economia

Carl Moses, correspondente na Argentina da agência federal alemã Germany Trade & Invest (GTAI), teme que o congelamento atinja logo outros setores da economia e, assim, também as empresas alemãs. "O governo deu a entender que também está observando com rigor a curva de preços dos fornecedores."

As firmas estrangeiras já ativas no país não foram apanhadas totalmente de surpresa pela situação. "As empresas alemãs e a concorrência local conhecem isso. Elas se adaptam o melhor possível, e até agora têm até feito bons negócios", explica Moses.

Para novos investidores, por outro lado, há outros mercados mais interessantes na região. "O Peru e o Chile apresentam uma história de crescimento promissora. O Brasil e o México oferecem, em princípio, um mercado maior", analisa o correspondente. Os argentinos esperam uma recuperação, com as boas safras de soja e milho, importantes produtos de exportação para eles. Cabe esperar se, com isso, as prateleiras dos supermercados voltarão a se encher.

Autor: Jan Walter (cn)
Revisão: Augusto Valente