1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Rafael Marques critica atividades da Odebrecht em Angola

14 de outubro de 2016

Jornalista angolano critica proximidade de Lula da Silva ao chefe de Estado de Angola e fala sobre a Odebrecht nesse país. O ex-presidente brasileiro tornou-se réu (13.10) em ação sobre obras em Angola.

https://p.dw.com/p/2RE4J
Odebrecht in Benguela Angola
Sede da Odebrecht em Benguela (Sul de Angola)Foto: DW/Nelson Sul D'Angola

Segundo o jornalista investigativo angolano, as denúncias à empresa brasileira Odebrecht incluem não apenas a corrupção, da qual o ex-presidente brasileiro Lula da Silva tornou-se réu por supostamente atuar em esquema para liberar verba do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) à Odebrecht. Mas há denúncias graves de morte e tortura de camponeses nas áreas onde atua a multinacional em África. Para Rafael Marques, no entanto, a proximidade entre os governos brasileiros e as autoridades governamentais de Angola não é recente e critica a atuação da multinacional naquele continente desde então. O jornalista Rafael Marques volta ao Brasil, após 21 anos, a convite da agência A Pública para debate (15.10) sobre o tema e suas investigações. Rafael Marques falou em exclusivo à DW África:

DW África: Como você define o papel da empresa brasileira Odebrecht em Angola?

GMF Foto Rafael Marques de Morais
O Jornalista investigativo angolano Rafael MarquesFoto: privat

Rafael Marques (RM): A Odebrecht eu definiria como uma das principais multinacionais da corrupção em Angola pela sua relação muito estreita com o Presidente José Eduardo dos Santos, que não é mais do que um indíviduo que promove a corrupção no país. Portanto os contratos que a Odebrecht tem estado a ganhar desde a sua presença em Angola tem muito a ver com essa relação especial que tem com o Presidente José Eduardo dos Santos. É a empresa do Presidente angolano.

DW África: A presença da Odebrecht em Angola não é recente, mas intensifica-se a partir de 1984 e, sobretudo em obras de construção civil e hidroelétricas em Angola. Diante das suas investigações, você teve acesso a documentos que levem a indícios de corrupção de governos brasileiros?  

RM: Eu próprio já denunciei o projeto da Biocom, em que a Odebrecht envolveu-se com a Sonangol com crédito brasileiro e com generais angolanos corrompendo abertamente altos oficiais do aparelho de Estado angolano. Isso é corrupção em Angola e eventualmente também deve ser prática condenável no Brasil, quando uma empresa sua vai investir num país estrangeiro e investe infringindo as leis deste país utilizando recursos brasileiros como forma de ganhar contratos. E, por exemplo, outro aspeto que eu tenho estado a investigar: o tipo de obras feitas. Eu tenho uma lista das obras feitas pela Odebrecht e dos financiamentos feitos pelo BNDES e vemos que os valores não se justificam. E é isso que se deve ter em termos de investigação para então se auferir como esses grandes créditos que a Odebrecht se beneficiou do BNDES teriam contribuído, de certa maneira, para essa opacidade em que o Governo de Lula se viu envolvido. Grande parte desses bilhões de dólares atribuídos pelo BNDES nos últimos anos foram no Governo de Lula. E, aí, há obviamente muita coisa que pode ser explorada. Estou já muito avançado nestas investigações.

DW África: Diante das suas investigações você encontrou algum indício contra o ex-presidente Lula?     

RM: Não encontrei nada e é algo que tem que ser aprofundado. Acho que o indicimento por ter tido um sobrinho em Angola a investir com a Odebrecht tinha de ter mais ligações, mais elementos, que eu eventualmente não tenho e só a justiça brasileira saberá. Mas aquilo que eu posso dizer foi uma decepção quando o ex-presidente Lula se aproximou de um ditador africano, que é conhecido como sendo o padrinho da corrupção. E com a Odebrecht metida no saco o resultado não podia ser bom.

DW África: Você também se decepcionou com o Lula?

Angola Staatspräsident Jose Eduardo dos Santos und Luiz Inacio Lula da Silva
Lula da Silva e José Eduardo dos Santos (Brasília em junho de 2010)Foto: AP

RM: Sim, sim. Esperava mais dele. A política brasileira sempre foi extremamente corrupta. Mas havia a esperança de que Lula contribuísse, como nenhum outro Presidente, para a melhoria do espectro político brasileiro, para que a política brasileira fosse mais séria, mais virada para os cidadãos desfavorecidos e fosse menos o circo que se viu com o golpe de Estado recente, aquela votação do congresso. Uma risada geral por esse mundo afora sobre a baixaria, se podemos assim dizer, dos políticos brasileiros. Se isso foi uma baixaria, como se diz aqui no Brasil.

DW África: Acha que o Governo angolano deverá colaborar com as investigações da Justiça brasileira sobre atividades envolvendo o ex-Governo de Lula e a Odebrecht em Angola?

RM: Obviamente. O Governo (de Angola) não quererá contribuir para o avanço das investigações.

DW África: Quais os principais problemas enfrentados pelos angolanos face às atividades da Odebrecht em Angola? 

RM: Há muitos anos fiz um relatório sobre a situação dos direitos humanos nas áreas diamantíferas onde a Odebrecht também operava. E eram casos sérios de violação, de tortura, de assassinatos de garimpeiros e de aldeões. Da proibição de aldeões de irem buscar água nos rios, porque não tinham água canalizada porque a Odebrecht exigia que os rios estivessem sob seu total controle. Quando nós olhamos para as obras que são feitas em Angola ao nível da construção civil, há muito a se dizer em termos de seu impacto na vida das populações. As parcerias que a Odebrecht estabelece com altas figuras do poder são altamente prejudiciais para a economia angolana, para os cofres do Estado e para a seriedade que se espera das multinacionais que investem em países subdesenvolvidos.  

Entrevista Rafael Marques (online) - MP3-Stereo

DW África: A atuação da Odebrecht em Angola vai além de denúncias de corrupção?

RM: Quando eu reportei os relatórios havia casos graves de tortura e mortes de populares. E tudo isso está documentado.

Saltar a secção Mais sobre este tema