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ACNUR: Não há condições para retorno de congoleses em Angola

19 de janeiro de 2018

A ONU ainda não recebeu a confirmação de Luanda sobre o repatriamento dos 31 mil congoleses que se encontram na Lunda Norte, como avançou o Jornal de Angola. Qualquer regresso "terá de ser voluntário", sublinha o ACNUR.

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ACNUR está a ultimar a transferência de refugiados do campo provisório de Cacanda (foto) para o Lóvua Foto: DW/N. Sul d'Angola

O repatriamento dos refugiados que se encontram em território angolano terá sido acordado sábado (13.01) pelos governos de Angola e da República Democrática do Congo (RDC) e deverá ter início já em março, de acordo com a edição desta segunda-feira (15.01) do diário estatal Jornal de Angola.

Porém, até ao momento, o Governo angolano ainda não confirmou o repatriamento ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Em entrevista à DW África, a relações públicas do ACNUR na Lunda Norte, Margarida Loureiro, diz que neste momento não há condições para um "retorno seguro e digno" dos refugiados à RDC, de onde continuam a chegar notícias de instabilidade e violência.

Esta semana, as Nações Unidas alertaram para o risco de fome no país devido aos conflitos armados que obrigaram centenas de milhares de agricultores a fugir das suas terras e perder as suas colheitas. Os cerca de 31 mil refugiados provenientes da província central de Kasai procuraram refúgio na Lunda Norte, desde março de 2017.

Kongo Kananga Tshimbulu MONUSCO
Tropas da MONUSCO patrulham Tshimbuku, na província de KasaiFoto: Reuters/A. Ross

DW África: Numa altura em que da República Democrática do Congo chegam notícias de protestos e do agravamento das condições devido à violência no país, será que este é o momento certo para o repatriamento dos refugiados? Há condições para um retorno destas pessoas em breve?

Margarida Loureiro (ML): A posição do ACNUR, tanto em Angola como no Congo, é que não existem condições para um retorno seguro e digno dos refugiados a residir neste momento da província da Lunda Norte, em Angola. A confirmar-se a notícia que saiu nos meios de comunicação - essa confirmação ainda não foi dada por parte do Governo central angolano - a posição do ACNUR é de que não promove o repatriamento nesta altura da situação.

DW África: Isso significa que o ACNUR já contactou o Governo de Angola para obter um esclarecimento?

ML: Já. Desde que as notícias vieram a público, o ACNUR tem estado em contacto com as autoridades, tanto em Angola como na República Democrática do Congo, e em breve vamos obter, então, as respostas que estamos a aguardar.

Refugiados da RDC procuram abrigo em Angola

DW África: Segundo o Jornal de Angola, as autoridades das quatro províncias congolesas mais afetadas pelos conflitos étnico-políticos, Kasai, Kasai Central, Lualaba e Kwango, deverão deslocar-se em fevereiro à província angolana da Lunda Norte, para se encontrarem com os refugiados e tentar sensibilizá-los para o regresso às zonas de origem. O ACNUR não deveria também fazer parte destas negociações?

ML: A confirmar-se esta visita ao assentamento do Lóvua, na Lunda Norte, é de todo o interesse do ACNUR participar nessas discussões. Nós já demonstramos a nossa inteira disponibilidade para apoiar e para assistir o Governo nestas eventuais discussões de um repatriamento, que terá sempre que ser voluntário. Angola é signatária da Convenção para os Refugiados e, como tal, também tem vindo publicamente a dizer, já em várias ocasiões, que não promove outra espécie de repatriamento que não seja o voluntário, que os refugiados queiram de facto regressar. E obviamente o ACNUR tem todo o interesse em participar em todas as fases deste eventual processo.

DW África: E o ACNUR já recebeu pedidos de refugiados que querem regressar à República Democrática do Congo?

ML: Não, até ao momento ainda não recebemos nenhum pedido de repatriamento por parte dos refugiados na Lunda Norte.

ACNUR: Não há condições para retorno de congoleses em Angola

DW África: Os refugiados porventura já receberam esta notícia, que talvez circule no assentamento. Como é que está a ser recebida a notícia?

ML: Neste momento, e tal como o ACNUR, a comunidade refugiada está a aguardar uma confirmação de que estas discussões, de facto, levaram a esta decisão de um possível repatriamento. Estão a aguardar com a calma possível para saber mais pormenores e o que vai acontecer. Sentem alguma segurança pelo facto de as autoridades em Angola terem sempre expressado as suas boas-vindas e não iriam expulsar ou repatriar ninguém do país sem a vontade própria de quem quiser sair.

DW África: Calcula-se que atualmente os refugiados se sintam seguros e satisfeitos por se encontrarem no assentamento do Lóvua e não queiram regressar brevemente ao país de origem...

ML: O assentamento do Lóvua foi uma ideia, um conceito do Governo, com o apoio do ACNUR, precisamente para criar uma estabilidade que não existia nos centros provisórios de acolhimento dos refugiados aquando da emergência [da instabilidade na RDC], em março e abril e até final de julho [de 2017], quando [a situação] começou a acalmar. Os centros provisórios nunca foram tidos como os ideais. As condições não estavam reunidas para uma vivência digna da comunidade e o Lóvua, que está em construção, proporciona isso.

O Governo está a investir fortemente no assentamento. Não é um campo, é uma zona com vilas, com casas, com espaços e com a dignidade que os refugiados merecem, proporcionado também a convivência com as comunidades locais. Os refugiados neste momento sentem uma segurança que não sentiam há muito tempo. O trauma e as vivências do conflito são muito recentes e, portanto, é natural que ainda não demonstrem interesse em regressar.