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Angola debate mudança para estado de calamidade

António Cascais
21 de maio de 2020

Parlamento angolano discute proposta de lei que contempla a declaração de situação de catástrofe ou calamidade pública. Constitucionalista Albano Pedro considera que alteração preserva direitos fundamentais dos cidadãos.

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Angola Parlament
Foto: DW/B. Ndomba

Esta quinta-feira (21.05), o Parlamento angolano voltou a reunir-se para discutir, "com urgência" e na especialidade, a proposta de lei de alteração da Lei de Bases da Proteção Civil, que contempla a declaração de situação de catástrofe ou calamidade. A decisão final sobre a matéria deverá ser tomada na sexta-feira (22.05).

A declaração do estado de calamidade poderá ser aplicada no país, findo o período de estado de emergência em vigor para conter a propagação da Covid-19. Esta situação de exceção constitucional vai na terceira prorrogação que termina a 25 de maio.

Note-se que Angola conta atualmente com 58 casos positivos da Covid-19 - nomeadamente 38 ativos, 17 recuperados e três óbitos.

Em entrevista à DW África, o constitucionalista angolano Albano Pedro considera que, se aprovada, a alteração poderá preservar as liberdades fundamentais dos cidadãos angolanos e o Estado passará a contar com medidas administrativas para conter a pandemia do novo coronavírus, deixando de exercer uma função de força.

DW África: O estado de emergência vai ser atenuado, passando-se para uma fase menos rigorosa que é o estado de calamidade pública?

Albano Pedro (AP): Estou em crer que vai se dar uma conversão do estado de emergência atual que vivemos para estado de calamidade.

Albano Pedro, angolanischer Verfassungsrechtler
Albano PedroFoto: privat

DW África: E isso significa o que na prática?

AP: Isso, na prática, significará que sairemos de estado de exceção constitucional, em que se verificam limitações de direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos - como o de se locomover de um lado para o outro e até o de permanecer em determinados lugares e a combinação de sanções penais para aqueles que não cumprem com as medidas de limitação das liberdades fundamentais - para passarmos num novo período em que essas liberdades já não serão postas em causa. Serão simples medidas de contenção da Covid-19, portanto, medidas naturais sanitárias, mas sem carácter penal e, sobretudo, sem uma perspetiva de privação das liberdades fundamentais. O Estado passará a tomar medidas para controlar a expansão da Covid-19, contendo obviamente, mas sem colocar aquela dimensão de contenção dos direitos fundamentais. Sem exercer uma função de força, como se estivesse num estado de exceção constitucional.

Portanto, deixa de haver um estado de exceção constitucional e passam a haver apenas medidas de naturais administrativa para controlar a doença. Isso é o essencial do estado de calamidade pública que vai ser consagrado.

DW África: Quer isso dizer que a situação melhorou um pouco de maneira que se justificasse essa alteração para estado de calamidade?

AP: Do ponto de vista do exercício de liberdades fundamentais é uma viragem significativa. Mas isso poderá não significar necessariamente que as pessoas terão a completa autonomia de desenvolver os negócios e os seus afazeres tal como se pretende. Porque o estado de calamidade pública poderá determinar certas medidas. Por exemplo, os restaurantes poderão funcionar sob determinadas condições, poderemos ainda ter esta contenção dos horários de funcionamento de certos estabelecimentos, poderemos ter situações em que haverá uma certa limitação no exercício de certas atividades profissionais e económicas.

Entretanto, já não se poderá falar, por exemplo, da possibilidade de recolheres obrigatórios. Não se poderá falar, por exemplo, da necessidade das pessoas serem detidas por desacato à autoridade, por não obedecerem à polícia para regressarem a casa, por exemplo. Já não haverá julgamentos de situações em que as pessoas violaram cercas sanitárias e por aí fora. Portanto, essas medidas que punham em causa a liberdade específica dos cidadãos já não poderão ser implementadas.

Angolanos tentam atravessar cerca sanitária de Luanda

DW África: Há consenso na Assembleia da República de Angola entre os diferentes partidos nesta matéria?

AP: Eu penso que o consenso impõe-se, porque trata-se de uma situação de interesse nacional. Tendo em conta que somos uma sociedade com muitas dificuldades económicas e com uma instabilidade económica significativa marcante, é necessário que os constrangimentos das liberdades não ponham em causa a sobrevivência das pessoas através do desenvolvimento das suas atividades económicas.

É necessário fazer um equilíbrio entre o desenvolvimento normal das atividades económicas, para que as famílias menos favorecidas consigam sobreviver, ao mesmo tempo que se tem que combater a Covid-19. Portanto, temos de ter esta perspetiva de equilíbrio. E penso que o estado de calamidade, a vir a ser decretado, será a medida mais adequada no sentido em que ela não vai constranger as liberdades para que as pessoas desenvolvam naturalmente as suas atividades, ao mesmo tempo que vai impor medidas de segurança para que as pessoas, de facto, se previnam do contágio comunitário, que é a grande preocupação nesse momento do Governo angolano.

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