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Angola não se pode tornar num "paraíso de um dia para o outro", diz Pepetela

Carlos, Joao24 de outubro de 2013

Angola ainda tem um longo caminho a fazer para respeitar em pleno as liberdades de expressão e de manifestação. Quem o diz é o escritor Pepetela, que ainda assim admite que "tem havido alguns progressos" no país.

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O direito à liberdade de expressão e de manifestação ainda não é devidamente exercido em Angola, reconhece o escritor angolano Pepetela. "Temos que aprofundar os direitos democráticos" afirma o autor. Sublinha que apesar do país ter uma Constituição da República "avançada" e que prevê essas liberdades ainda "é difícil pôr em prática toda a Constituição", lamentando a dificuldade de a praticar em pleno.

Quando solicitado a comentar o recente clima de repressão em Luanda, nomeadamente os episódios de detenção de jovens do Movimento Revolucionário, que protestavam contra as injustiças sociais, Pepetela diz que "tem havido alguns progressos" no país. Contudo, admite que em Angola os avanços e os recuos são constantes. Mas para o escritor "todas as sociedade sofrem estes processos".

Angola vive em paz "há pouco mais de 10 anos"

Relembra que só há pouco mais de 10 anos é que Angola vive numa situação de paz e que "antes era complicado e ainda há muitos problemas psicológicos derivados dessas situações que o país sofreu". Para Pepetela não se pode "ser tão exigente assim e querer que de um dia para o outro aquilo vire o paraíso".

No entanto, o escritor recusa-se a se pronunciar sobre o caso Nito Alves, jovem de 17 anos de idade detido, sem acusação, pela polícia angolana nos arredores de Luanda, desde 12 de setembro passado. "Sei que ele foi preso mas não sei se já saiu se não". Admite que não está a seguir a situação e remata dizendo que "especulações não faço".

Inicialmente, Manuel Nito Alves foi acusado de crime de difamação contra o Presidente da República de Angola, José Eduardo dos Santos. Na visão do escritor, a sociedade angolana está em fase de mutação, ainda que a ritmo lento. Os avanços que Angola regista devem ser feitos com prudência, sendo importante estar atento à realidade de outros países onde há registos constantes de violação dos direitos humanos. Adverte o escritor, que se deslocou na segunda-feira (21.10) a Lisboa para apresentar o seu novo livro "O Tímido e as Mulheres".

Novo livro

Pepetela na capital portuguesa leu um dos trechos do livro, inspirado no modelo de incentivo à leitura que diz ter aprendido na Alemanha. A passagem escolhida pelo autor inclui o primeiro capítulo do novo romance, que leva o leitor a viajar pela Luanda dos nossos dias. Um retrato da realidade atual, de uma cidade caótica e congestionada.

É nesta cidade que se desenrolam todas as histórias centradas na figura de Heitor, um escritor em início de carreira. Um personagem tímido, contrária à quente voz de Marisa, responsável por um programa de rádio de grande audiência, que a todos encanta e seduz.

Lançado este ano, primeiro em Luanda, o livro, que já vai na segunda edição, aliciou a editora portuguesa D. Quixote a apostar nele. Cecília Andrade, uma das responsáveis pela editora, diz que a história do trio das personagens que constrói a narrativa é muito curiosa.

"Porque tem estas personagens, sobretudo este trio, que é o Heitor, a Marisa e o seu marido, que também ele é um personagem, porque é um homem que vive preso a uma cadeira de rodas. O contraste entre uma mulher fogosa, fantástica, por quem todos os homens se apaixonam, que é casada com um homem que vive preso a uma cadeira de rodas."

Pepetela, de nome Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, venceu o Prémio Camões em 1977, o que veio a confirmar o seu lugar de destaque no contexto da literatura lusófona. Diante dos que admiram a sua escrita, disse que talvez "O Tímido e as Mulheres" seja o último livro que escreve sobre Luanda. Se mudar para Benguela, a sua terra natal, dali sairá um novo título. Só o tempo o dirá, disse o escritor que não gosta de dar entrevistas.