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Angola: "Agora Portugal está a andar atrás de prejuízos"

Nádia Issufo
18 de setembro de 2018

Angola fez com que Portugal deixasse de olhar para si como legítimo dependente, diz Agostinho Sikatu. Mas o politólogo alerta que as revelações recentes de Álvaro Sobrinho poderão agitar novamente as relações.

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Primeiro-ministro de Portugal, António Costa, na baia de Luanda, AngolaFoto: Getty Images/AFP/A. Rogerio

O chefe do executivo português esteve em Angola entre os dias 17 e 18 de setembro. A visita oficial é carregada de simbolismo, pois os últimos anos foram marcados por uma grande tensão entre Angola e Portugal. Desde 2016 que a Luanda andava a congelar a visita do primeiro-ministro de Portugal. No final, depois de posições duras, Angola passou uma forte mensagem a Portugal, cujos efeitos são agora visíveis, considera o especialista em ciências políticas angolano Agostinho Sukatu. A DW África entrevistou-o sobre a reaproximação dos dois países.

DW África: Definitivamente a visita de António Costa a Angola marca uma nova era nas relações bilaterais entre Angola e Portugal...

Agostinho Sikato (AS): De facto marca, foi uma era que infelizmente foi reduzida pelas duas partes em função de clivagens que diziam respeito a interesses particulares de certos políticos. Agora estamos a reatar as relações, ganha mais Portugal do que Angola, digo eu. Por outro lado, Angola ganha apenas do ponto de vista político, porque a partir do momento em que houve esta rutura Portugal passou a olhar para Angola de uma forma diferente.

DW África: Em Luanda, António Costa engrandeceu Angola nos seus discursos. Acha que Portugal vai continuar a fechar os olhos para os problemas de Angola com receio de uma represália de Luanda, à semelhança do que aconteceu nos últimos meses?

AS: Na verdade o que Angola vai fazer em Portugal? É passar um discurso que cada um quer ouvir. Na verdade António Costa veio a Angola para dizer o que os angolanos querem ouvir e João Lourenço vai a Portugal dizer o que os portugueses querem ouvir, apenas isso. Agora, a única coisa que vão fazer é esforçarem-se para por em prática o que eles pretendem fazer. E não é preciso que fujamos a regra, a vinda de António Costa e a ida de João Lourenço a Portugal refletem um outro sentido, a relação estava avessa principalmente porque Manuel Vicente estava a ser investigado em Portugal. A partir da altura em que o processo foi transferido para Angola automaticamente as relações hipoteticamente [melhoraram]. E vamos lá ver, neste momento temos uma nova polémica envolvendo o empresário Álvaro Sobrinho que veio a público em plena televisão pública levantar questões que vão obrigar a Procuradoria Geral da República a investigar [o caso]. Ou seja, a partir do momento em que se reatam as relações numa altura em que o assunto anda arquivado em Portugal passa a ser reaberto em Angola. E a visita de João Lourenço a Portugal é desnecessária, é preciso que os políticos entendam que essas visitas diplomáticas de chefes de Estado e de Governos também exigem recursos ao Estado. Qual é a necessidade de João Lourenço se deslocar a Portugal se Costa já cá está? Porque não criaram uma agenda mais abrangente para rubricarem os documentos cá? Não há necessidade.

Angola: "Agora Portugal está a andar atrás de prejuízos"

Manuel D. Vicente Politiker Angola Afrika
Manuel Vicente, ex-vice Presidente de AngolaFoto: picture alliance/Lori Waselchuk

DW África: Portugal não foi a porta de entrada de João Lourenço para a Europa, enquanto Presidente da República de Angola. Aliás, João Lourenço ainda não esteve em Portugal. Mas Costa já está em Angola. Como vê a "gestão" das visitas oficiais dos dois países de há dois anos para cá?

AS: Do ponto de vista das relações internacionais Angola mostrou que já pode andar sozinha. Valeu a pena ter havido essa fricção entre Angola e Portugal, porque antes dessas relações azedarem Portugal tinha Angola como uma criança, um legítimo dependente de si por causa da ligação histórica. E nessas visitas a Europa, para além de João Lourenço não ter citado Portugal como parceiro estratégico, esteve na Europa mais de três vezes sem passar por Portugal. Tudo isso tem valor político e esse valor político os portugueses interpretaram claramente que há um afastamento total de Angola. Agora, é preciso que se diga que hoje quem quiser prosperar do ponto de vista de desenvolvimento, quem estiver na Europa terá de piscar o olho a África. Agora Portugal está a andar atrás de prejuízos e vem agora com outro discurso.