1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Etapas mais marcantes da vida de Dhlakama, líder da RENAMO

3 de maio de 2018

Esta quinta-feira (03.05), morreu de ataque cardíaco o líder do maior partido da oposição de Moçambique, a RENAMO, Afonso Dhlakama. Quem foi este homem, que nasceu em 1953 no distrito de Chibabava, província de Sofala?

https://p.dw.com/p/2x8LC
Mosambik Oppositionsführer Afonso Dhlakama
Foto: Getty Images/AFP/G. Guerica

O ponto de viragem na vida de Afonso Macacho Marceta Dhlakama, nascido em 1953 no interior da província de Sofala no centro de Moçambique, deve ter sido a segunda volta das eleições presidenciais de 1999. Oficialmente alcançou 47,7 % dos votos e perdeu por uma margem pequena contra o candidato do antigo movimento de libertação, FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique), Joaquim Chissano, que obteve 52,3 % dos votos.

Mas muitos observadores eleitorais estão convencidos que o verdadeiro vencedor teria sido Afonso Dhlakama. Entre eles o consultor alemão em assuntos de desenvolvimento, Rainer Tump: "Houve uma manipulação maciça dos resultados eleitorais. Consideraram-se inválidos centenas de milhares de votos em bastiões da RENAMO."

Dhlakama aceitou a derrota, mas a partir daí o seu partido entrou em declínio. No escrutínio de 2008, Dhlakama apenas obteve 31,7 % dos votos e perdeu contra Armando Guebuza da FRELIMO. A margem da vitória foi muito grande para levantar muitas suspeitas.

20 Jahre Frieden in Mosambik
Soldado moçambicano durante a guerra em Dondo (foto de 1988)Foto: picture-alliance/dpa

Mais candidaturas presidenciais

Dhlakama não se deixou desanimar e candidatou-se uma quarta vez em 2009. Com 16,4 % dos votos obteve apenas um terço do seu resultado histórico de 1999. Para muitos moçambicanos já não representava uma alternativa válida.

Afonso Dhlakama lidera o partido desde 1979, ano em que foi morto durante a guerra civil o fundador da Resistência Nacional Moçambicana – RENAMO, André Matsangaissa. Até o fim da guerra em 1992, Dhlakama comandou as tropas da RENAMO. Com a ajuda dos regimes racistas dos países vizinhos, primeiro da Rodésia (o atual Zimbabué), e mais tarde com o apoio do governo branco da África do Sul, combateu o governo marxista da FRELIMO. 

A guerra civil de Moçambique

A guerra foi uma das mais brutais de África. A RENAMO teve má fama por causa da destruição de escolas e centros de saúde, da minagem de estradas e pelo recrutamento de crianças soldados. A violência dos dois lados causou aproximadamente 900.000 mortos. Milhões refugiaram-se dentro ou fora de Moçambique.

O fim da guerra fria e do apartheid na África do Sul possibilitou o Acordo Geral de Paz de Roma no ano de 1992. Antes do acordo, a FRELIMO tinha abandonado a economia de planeamento e o monopartidarismo. Com alguma razão Dhlakama gaba-se de ser o "Pai da Democracia" de Moçambique.

20 Jahre Frieden in Mosambik
Chissano (à esq.) e Dhlakama (à dir.) em Roma (1992)Foto: picture-alliance/dpa

Estrutura interna do partido

Mas como se explica o declínio dos seus resultados eleitorais nos últimos anos? "Acho que uma razão principal é que o partido nunca conseguiu construir uma democracia dentro da própria RENAMO. Ela sempre esteve muito focada no seu líder Afonso Dhlakama", responde o consultor alemão Rainer Tump. Isto também terá causado a criação de um novo partido, o MDM – Movimento Democrático de Moçambique. "Também motivou a saída constante de personalidades importantes, que abandonaram a RENAMO. Pois estiveram cansados do jogo político de Dhlakama em que as decisões foram sempre tomadas por ele e muitas vezes sem nenhuma consulta prévia dos outros", conclui Rainer Tump.

Uma das maiores críticas de Dhlakama foi a predominância da FRELIMO e do seu Presidente, Armando Guebuza, no aparelho do Estado e na economia moçambicana. Neste caso, Dhlakama conseguiu exprimir as inquietudes de uma boa parte da população de Moçambique.

E se Dhlakama fosse Presidente...

À pergunta, o que Dhlakama faria, se fosse Presidente, respondeu numa entrevista à DW em 2008: "Primeiro, a reforma das instituições do Estado. Separar o partido das instituições. Porque um país democrático não se pode chamar um país democrático, quando as instituições do Estado estão ligadas a um único partido no poder."

Mosambik RENAMO Rebellen 2012
Homens armados da RENAMO na Gorongosa no ano de 2012Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images

Forças Armadas da RENAMO

Mesmo contra os princípios do Acordo Geral de Paz de Roma, que previu a desmobilização total dos rebeldes da RENAMO, Dhlakama sempre manteve um exército privado do partido. Treinaram longe do olhar do público em bases fechadas no interior da província de Sofala, nas localidades de Maríngué e Inhaminga.

O escritor moçambicano Mia Couto criticou o estilo militarista de fazer política de Dhlakama numa entrevista ao canal privado STV: "Ficámos reféns do medo de alguém que reiteradamente veio anunciar que 'agora sim vou voltar à guerra, vou incendiar o país'… Ele escolheu vários tipos de discursos que são realmente ameaças".

Nachruf Afonso Dhlakama - MP3-Mono

Declínio eleitoral

Nos últimos anos, ficou evidente uma certa perda do sentimento de realidade. "As bases da RENAMO cada vez mais estão a crescer. Mesmo aqui em Maputo. Nós aqui não éramos nada há cinco ou dez anos", disse Dhlakama em 2008 à DW. "Hoje, se fizerem sondagens de opinião pública, aqui em Maputo, junto aos órgãos da universidade, reitores e intelectuais vão dizer 'Sou de Dhlakama e da RENAMO'". No ano seguinte seguiu a derrota histórica com apenas 16,4 % dos votos a nível nacional nas eleições presidenciais de 2009.

Nas autárquicas, a RENAMO veio perdendo todos os municípios que governara. No Parlamento nacional a bancada da RENAMO encolheu.

Em 2009 houve outro choque: a fundação do novo partido MDM por Daviz Simango, o edil da Beira. Simango abandonou a RENAMO, quando o partido lhe tinha retirado a confiança e escolhido outro candidato na Beira. Dentro de poucos meses o MDM consolidou-se como terceira força política do país.

Mosambik Soldaten Symbolbild
Soldados moçambicanos na GorongosaFoto: Getty Images/AFP/M. C. Mac' Arthur

De Maputo para o norte e o centro do país

Dhlakama reagiu com um auto-isolamento. Saiu da sua mansão em Maputo, primeiro para Nampula no norte do país.

No dia 17 de outubro de 2012 mais uma mudança, desta vez para a Serra da Gorongosa. Foi ali, no mesmo dia 33 anos antes, que soldados do Governo moçambicano tinham morto o seu antecessor André Matsangaissa.

"Desde outubro de 2012, quando Afonso Dhlakama se retirou para o seu antigo quartel general da guerra civil, abandonou de facto as instituições de Moçambique e as plataformas democráticas existentes", diz a analista do instituto britânico de estudos políticos, Chatham House, Elisabete Azevedo-Harman. "Isolou-se da capital Maputo e dos outros atores políticos."

No dia 21 de outubro, Dhlakama conseguiu fugir antes da tomada da base da RENAMO na Gorongosa pelas Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM). 

Em 21 de outubro de 2013, a RENAMO anunciou o fim do Acordo de Paz de Roma, depois que forças governamentais atacaram a base da RENAMO no centro do país. Moçambique viveu mais um conflito armado que durou até um acordo no dia 5 de agosto de 2014. 

Mosambik RENAMO Afonso Dhlakama
Dhlakama durante a campanha de 2014Foto: picture alliance/dpa/A. Silva

Quinta candidatura e quinta derrota em 2014

Nas eleições presidenciais do mesmo, Afonso Dhlakama candidatou-se uma quinta vez. Mas perdeu com 36,6% contra o candidato da FRELIMO, Filipe Nyusi, que ficou com 57% dos votos.

No ano de 2015, a casa do líder da RENAMO, Afonso Dhlakama, na cidade da Beira, no centro de Moçambique, foi invadida no dia 9 de outubro pela polícia. Foram presos guardas do maior partido de oposição.

A seguir, Dhlakama passou a maior parte dos últimos anos da sua vida "em lugar desconhecido" na Serra de Gorongosa. Houve uma série de confrontos violentos entre forças do Governo e homens armados da RENAMO, mas Dhlakama também manteve um diálogo com o Presidente Nyusi e consegui apaziguar o conflito.

Dhlakama morreu no dia 3 de maio de 2018 devido a um ataque cardíaco. 

Johannes Beck
Johannes Beck Chefe de redação da DW África
Saltar a secção Mais sobre este tema