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"Está fora de equação CPLP enviar tropas para Cabo Delgado"

António Cascais
3 de maio de 2021

A CPLP diz que está a estudar o tipo de apoio que pode prestar à Moçambique no combate ao terrorismo. Mas investigador não acredita que essa ajuda seja militar

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BG I Alltag und Militarismus in Cabo Delgado
Foto ilustrativaFoto: Roberto Paquete/DW

O ministro dos Negócios Estrangeiros de Cabo Verde, país que preside à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), disse que a organização decidiu enviar uma delegação a Moçambique, perante a crise militar e humanitária que se vive em Cabo Delgado, no norte.

Mas "isto vai exigir uma intervenção nossa, uma visita de uma delegação, ao nível que estamos a definir, para podermos responder às necessidades de Moçambique na matéria", revelou Rui Figueiredo Soares. Contudo, ainda não há "data exata", para a visita da delegação ao país, por ter de ser articulada com as autoridades moçambicanas, que "avaliarão o melhor momento para se fazer", sublinhou o chefe da diplomacia cabo-verdiana.

Em entrevista à DW África Pedro Seabra, professor do Centro de Estudos Internacionais no Instituto Universitário de Lisboa e investigador do Instituto de Defesa Nacional (IDN), em Portugal, disse que uma eventual intervenção militar da CPLP em Cabo Delgado "está fora questão".

DW África: Que contributo poderia e deveria dar a CPLP no sentido de contribuir para uma resolução do conflito em Cabo Delgado? 

 

Pedro Seabra (PS): Acho que é importante distinguirmos entre um contributo a nível humanitário e um contributo militar. E perante a situação no terreno em Cabo Delgado e diante das dificuldades que Moçambique continua a enfrentar nesse âmbito, acho o mais expetável é que possamos vir a assistir mais apoio da CPLP a título humanitária, como o foco nos refugiados do que propriamente esperar algum tipo de posição conjunta em termos de apoio militar às forças governamentais moçambicanas.

Logo CPLP
Foto: CPLP

DW África: A língua portuguesa poderia ser uma mais valia para resolver os problemas de Cabo Delgado?

PS: Idealmente sim, não tenho nenhuma dúvida. No entanto, temos que atender a complexidade do problema. Estamos a falar de um caso de indulgência crescente com grandes ligações a questões de subdesenvolvimento económico e social na região agravadas por desigualdades no próprio território e no qual tem sido bastante difícil, as próprias forças militares e policiais moçambicanas conseguirem proporcionar uma resposta atempada e decisiva. E neste sentido a língua poderia ser naturalmente um contributo adicional, mas infelizmente não me parece que seja o mais decisivo neste momento.

DW África: SADC está a discutir a possibilidade de enviar 3.000 militares para o norte de Moçambique, cogita-se emprego de militar por parte da CPLP?

PS: Antes de mais é preciso alguma cautela quando falamos desse relatório. Esta mesma proposta continua sem ser endossada pelos próprios líderes da região. Por enquanto, mantém-se ao nível técnico e poderá não ter exatamente esse contorno quando for discutida e eventualmente aprovada na cimeira de líderes da SADC. Por outro lado, aquilo que a CPLP poderia vir eventualmente a fazer nesse âmbito, atendendo ao papel de Angola nesse contexto, seria continuar com algum de esforço ao nível da formação e ao nível de treino das Forças Armadas Moçambicanas. Enviar uma força dita lusófona ou da CPLP para o cenário de operações parece-me neste momento francamente fora de equação. 

Portugal Professor Dr. Pedro Seabra
Pedro Seabra, investigador do Instituto de Defesa Nacional (IDN) de Portugal Foto: Privat

DW África: Portugal já enviou 60 militares no âmbito de um acordo bilateral com Moçambique para a formação dos militares moçambicanos. Como avalia esta situação?

PS: Temos que notar que esta participação por parte de Portugal vem no seguimento de um pedido feito por Moçambique. Portanto, é uma visão concertada por ambas as partes em completo respeito pela soberania de Moçambique. Não consiste em ter uma missão de intervenção militar, não consiste no envio de militares portugueses para a frente da batalha e paralisar as hostilidades do dia a dia, mas centra-se, isso sim, na formação das forças militares moçambicanas. É aqui claramente onde Moçambique sente alguma falta de preparação, de meios e de esforços em termos daquilo que consegue avançar para lidar com o conflito. Isto vem também no seguimento de uma relação bastante intensa e diversificada a nível da cooperação no domínio da Defesa entre Portugal e Moçambique nas primeiras duas décadas. 

DW África: Se a CPLP tomar posições e ações em comum poderá contribuir para o fortalecimento da imagem da CPLP a nível internacional? 

PS: Com certeza. A esse nível temos que lembrar que qualquer tipo de decisão ou recomendação que possa ser feito em nome da CPLP terá naturalmente mais peso, mais influência e mais visibilidade do que apenas a posição de um país. Penso que poderemos vir a assistir a uma crescente consciencialização dentro da CPLP com vista a chamar atenção da comunidade internacional para o conflito em Cabo Delgado, para o possíveis perigos e decorrências que possam advir do prolongar deste conflito do ponto de vista humanitário e da necessidade da própria comunidade internacional acompanhar de forma constante quer o conflito, quer as próprias necessidades do Governo de Moçambique. Neste domínio, parece-me que a CPLP poderá ter aí algum papel a desempenhar.

 

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