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Barragem de Mphanda Nkuwa pode aumentar a "corrupção"

21 de dezembro de 2020

A ONG Justiça Ambiental lança petição para travar a construção da barragem de Mphanda Nkuwa. Projeto pode causar estragos ambientais em Moçambique e abrir caminho para a corrupção, adverte ambientalista Daniel Ribeiro.

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Imagem ilustrativa da barragem de Cahora Bassa, MoçambiqueFoto: DW/M. Barroso

"Se for construída, a barragem de Mphanda Nkuwa irá desalojar centenas de pessoas, numa província já marcada pelos seus conflitos de terra devido a megaprojetos", começa por ler-se na petição da organização Justiça Ambiental (JA) lançada na quinta-feira (17.12) que pretende travar a construção daquele projeto hidroelétrico em Tete, centro de Moçambique.

"A barragem poderá trazer também danos irreversíveis ao ecossistema do Rio Zambeze e respetivo delta, além de impactos climáticos, sismológicos, hídricos e energéticos gravíssimos que já foram identificados por vários especialistas", acrescenta.

A JA acusa as autoridades de gerirem o projeto de forma sigilosa e obscura e anteveem prejuízos para as comunidades locais.

A DW África esteve à conversa com o ambientalista Daniel Ribeiro, da JA, para conhecer em pormenor os contornos da petição que já reuniu mais de 1.300 assinaturas.

Mosambik Maputo | Umweltschützer | Daniel Ribeiro
Daniel Ribeiro, ambientalista da ONG Justiça Ambiental Foto: privat

DW África: O que motivou a petição da JA?

Daniel Ribeiro (DR): A motivação da petição está relacionada com o facto de a barragem de Mphanda Nkuwa implicar grandes impactos ambientais e sociais para as comunidades. Tem também vários riscos económicos para o país. Tendo em conta que Moçambique já está com problemas económicos graves, um projeto com custos altos e poucos rendimentos económicos em retorno é uma má decisão. Temos de começar a levantar a voz e não permitir que este projeto avance. 

DW África: Acusam as autoridades de levar a cabo um projeto de forma obscura e sigilosa. Que dados vos conduzem a essa constatação?

DR: Mphanda Nkuwa é um projeto que tem um historial muito longo de dificuldades em se conseguir informação. Já houve fases que documentos técnicos não foram tornados públicos e tivemos que utilizar a lei para ter acesso à informação. Neste momento, há pouca informação. Não sabemos se vão ou não fazer um estudo de impacto ambiental novo. Não sabemos quem são os investidores, nem quais são as condições do contrato de compra e venda.

20 Jahre Frieden in Mosambik
Cahora Bassa, a primeira barragem construída em MoçambiqueFoto: DW/M. Barroso

DW África: Quais seriam os impactos da barragem para as comunidades vizinhas?

DR: Os impactos são muitos e é impossível falar de todos. Claramente temos os problemas com o impacto na pesca, agricultura, o aumento da erosão e o impacto negativo no delta [do Rio Zambeze]. Mas também temos os assuntos mais técnicos que ainda não foram resolvidos como a sismologia da zona. Esta é uma área [geográfica] com várias falhas tectónicas ativas e isso pode criar grandes perigos para a barragem. Também temos a barragem da Cahora Bassa que é velha e isso pode criar danos e perigos. Temos também o problema dos sedimentos, a barragem vai travar muitos sedimentos, o que é crítico para as comunidades, mas também para o funcionamento do delta. Temos as mudanças climáticas e [a construção da barragem da Mphanda Nkuwa] vai diminuir a precipitação. Haverá menos água, mais cheias e maiores períodos de seca, ou seja, pode também haver o perigo de a barragem não atingir as metas de produção energética, o que por sua vez terá consequências económicas. 

Temos vários outras preocupações relacionadas com a biodiversidade. As famílias vão ter de ser deslocadas da sua zona e as áreas indicadas [para os reassentar] não são apropriadas para a agricultura.

DW África: A Justiça Ambiental entende que este tipo de projetos pode  beneficiar as elites políticas e económicas. Quais os riscos neste caso em particular?

DR: Muitas barragens falham nas suas promessas. Em princípio, quase metade não atingem as suas metas económicas e Mphanda Nkuwa parece ter os mesmos problemas que muitos destes projetos. É um projeto com valores muito altos, acima de dois mil milhões de dólares (cerca de 1,63 mil milhões de euros). 

Quem beneficia é a elite, porque não faz mal se o projeto falhar. Os políticos corruptos vão criar comissões e desviar fundos. Vão ganhar financeiramente sempre que entram grandes valores num sistema corrupto como o nosso. Esse é um do tipo de problemas destes projetos muito grandes, que são difíceis de controlar e com muito pouca informação. [Construir a barragem de Mphanda Nkuwa] era criar condições para a corrupção e desvio de fundos. Os rendimentos de um projeto desta natureza são muito imprevisíveis e muitas vezes não atingem as metas.

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África
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