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Delta do Níger: O gás venenoso

Jan-Philipp Scholz (Lagos) | ck
10 de novembro de 2017

No Delta do Níger, sul da Nigéria, a queima de gás na produção de petróleo causa danos a saúde e meio ambiente. As petrolíferas ignoram as queixas dos habitantes e quase nunca respeitam as leis que regulam a atividade.

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Tocha de gás no Delta do NígerFoto: DW/Jan-Philipp Scholz

Para Bubaraye Dakolo este é um dia bom, porque conseguiu sair de casa sem apanhar um ataque de tosse. A menos de cem metros da sua casa foi instalada uma chamada tocha de gás. Trata-se de uma construção simples de condutas com uma chama na ponta.

A indústria do petróleo usa estes sistemas para queimar os gases supérfluos que surgem quando furam a terra para prospeção. Calcula-se que no Delta do Níger, onde se encontra a maior reserva de petróleo do mundo, são anualmente queimados gases no valor de mil milhões de dólares,

Bubaraye Dakolo vive numa pequena aldeia perto da cidade de Yenagoa. A tocha de gás perto de sua casa só raras vezes é ativada. Mas quando é operada, respirar torna-se numa tortura para Dakolo e os seus vizinhos. "De repente fica tudo a cheirar a gás”, diz Dakolo, que é o líder local do clã dos ekpetiama nesta região.

A luta contra a poluição do ar é uma prioridade na sua agenda política. Conta que na maior parte das vezes a multinacional Shell, responsável pela exploração do petróleo, na maior parte das vezes nem sequer anuncia quando pretende operar a tocha: "E quando nos queixamos, não recebemos qualquer resposta”, acrescenta.

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Bubaraye Dakolo, líder comunitário dos EkpetiamaFoto: DW/Jan-Philipp Scholz

Todos sofrem

Assim que Dakolo aparece no centro da sua pequena localidade, aparecem logo populares para se queixarem ao chefe. Um jovem diz que o seu telhado novo de zinco enferrujou por causa da chuva. Outro habitante diz que a colheita foi novamente miserável. Todos pedem a Dakolo que fale com a Shell, para que possam voltar a viver normalmente.

O líder tradicional tenta acalmar os homens. Ele sabe que as expetativas em relação à sua pessoa são grandes. Mas também sabe que tem um adversário muito poderoso. Geralmente as multinacionais de petróleo podem contar com o apoio da maioria dos políticos, diz Dakolo. "A existência das tochas de gás é uma consequência direta da corrupção. Os políticos são pagos, e por isso não defendem os nossos interesses”, acusa.

A indústria do petróleo viola a lei

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Um bairro de YenagoaFoto: DW/Jan-Philipp Scholz

O mais forte aliado de Dakolo vive a poucos quilómetros de distância, na capital regional de Yenagoa. Há décadas que o ativista Alagoa Morris do "Niger Delta Resource Center” luta contra a destruição do delta do Níger pela indústria petrolífera. É um senhor já de idade que salienta que a queima do gás com tochas já é proibida na Nigéria há muitos anos.

O Tribunal Supremo concluiu em 2005 que a prática viola os direitos humanos dos habitantes do delta. "A indústria do petróleo nunca recorreu da sentença. Por isso é válida”, diz Morris. O problema é que a indústria só raras vezes é multada e muito pouco. Por isso os consórcios simplesmente ignoram as leis na Nigéria e já incluem o pagamento de poucas multas no planeamento do orçamento.

É algo que indigna Bolaji Babatunde. No seu pequeno escritório na Universidade de Port Harcourt, o bioquímico de renome internacional, que investigou as consequências da exploração de petróleo na região, fala de um verdadeiro escândalo.

Babatunde diz que a prática da queima provoca emissões maciças de gases de efeito estufa, que estão no topo da lista dos pecados contra o meio-ambiente. Mas isso não é tudo. Está provado que muitas das substâncias libertadas pela queima são nocivas para plantas, animais e pessoas na vizinhança.

A aldeia vai a tribunal

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Aldeões conversam com Bubaraye Dakolo (dir.)Foto: DW/Jan-Philipp Scholz

"Seria tão fácil transformar o gás em energia”, diz o investigador. "A maioria das pessoas ainda usa madeira para cozinhar. E eu tenho que usar um gerador aqui no meu escritório. Ao mesmo tempo desperdiçam-se três quartos do gás que podia produzir energia”, diz Babatunde. As razões são óbvias acrescenta: o Delta do Níger é uma região pobre e de acesso difícil. As empresas petrolíferas não contam com lucros suficientes para lhes merecer os investimentos necessários para uma solução limpa. 

A Shell recusou-se a comentar as acusações.  Apenas uma pequena empresa petrolífera regional mostrou disposição para falar abertamente sobre o tema. O vice-diretor da Balema Oil promete que a sua empresa, fundada há apenas cinco anos, renunciará completamente à queima de gás até 2019.

"É surpreendente que após tantos anos de exploração de petróleo ainda não haja na região sequer uma infraestrutura técnica básica”, diz Pedro Diaz. A Balema Oil, acrescenta, quer aprender dos erros dos grandes consórcios. 

Bubaraye Dakolo diz que só acreditará quando desaparecerem as tochas de gás. Desde criança que escuta as promessas incessantes da indústria petrolífera. Agora o líder comunitário começou a documentar todos os problemas de saúde da população local. E mostra-se decidido: "Se for preciso, levo os casos aos tribunais europeus”.