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Covid-19: Demissão de Hélder Martins agita Moçambique

22 de fevereiro de 2021

O médico Hélder Martins deixa a Comissão Técnico-Científica para a Prevenção e Resposta à Pandemia da Covid-19 com uma certeza: "Uma epidemia não pode ser gerida por políticos". Mas as opiniões dividem-se.

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Foto: DW/C. A. Matsinhe

Após 11 meses como membro da Comissão Técnico-Científica para a Prevenção e Resposta à Pandemia da Covid-19, o médico Hélder Martins, decidiu pôr um "basta" a um acumular de acontecimentos que enumera numa extensa carta de demissão endereçada ao Presidente da República, Filipe Nyusi.

Um dos principais motivos do descontentamento do especialista em saúde pública prende-se com a não abertura da comissão quer à sociedade quer aos média.

Um ponto que também intriga a ativista Fátima Mimbire, que aplaude a decisão de Hélder Martins. "O que é que faz afinal essa comissão? Eu concordo, sim, que devia haver abertura da comissão científica", sublinha, em entrevista à DW África. 

"O que acontece é que nós não sabemos o que eles fazem, que tipo de recomendações fazem, se concordam ou não com as medidas. Há um fechamento de facto, as decisões não são transparentes", critica. "A Comissão Científica devia ser exposta ao crivo público. Criar-se espaço para que os cidadãos possam interagir diretamente com a comissão, colocando até questões".

CIP - Fatima Mimbire
Fátima Mimbire defende uma maior abertura da Comissão científica para a prevenção e resposta da pandemia da Covid-19 Foto: DW/L. Matias

Segundo a carta do antigo ministro da saúde, a não divulgação dos trabalhos da comissão abre espaço "para que o Governo possa livremente tomar decisões sem qualquer fundamentação científica e sem que ninguém saiba quais foram as recomendações da comissão".

Uma tese que Fátima Mimbire acaba por assinar por baixo: "Os políticos querem ter a hegemonia no acesso ao público. Querem ser eles os agentes e controladores do debate público. Tornar a comissão num órgão fechado, sem interação, sem exposição mediática legitima as decisões políticas que o Governo toma e muitas vezes não são as mais certas", considera.

Gestão politizada da pandemia

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A gestão da pandemia não pode ser outra coisa que não uma gestão politizada, diz Elísio Macamo Foto: DW/N. Issufo

No mesmo documento, Hélder Martins sublinhou que houve uma nítida intenção de introduzir fatores políticos no combate à Covid-19 o que o levou também a distanciar-se, uma vez que uma "epidemia não pode ser gerida por políticos".

Uma posição contrariada por Elísio Macamo. Em entrevista à DW, o sociólogo moçambicano, afirma que o desafio está em tornar as decisões políticas em medidas eficazes. "A gestão da pandemia não pode ser outra coisa que não uma gestão politizada. Quem deve tomar medidas são os políticos. E essas medidas nunca vão ser tomadas apenas tendo em conta a assessoria científica. Vão ser tomadas tendo em conta fatores políticos, porque é assim", frisa.

"Os políticos têm uma melhor visão sobre todo o conjunto de fatores que ter em conta no país. O que me parece fazer falta são mecanismos governamentais de tradução da assessoria científica para a política", considera. 

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Discurso de racismo e ódio

A demissão de Hélder Martins não passou despercebida no país e a sua decisão tem sido motivo de discussão nas redes sociais.

Fátima Mimbire condena certas acusações e, sem mencionar nomes, associa figuras de confiança do Governo a discursos de ódio e racismo.

"Quando não temos argumentos, infelizmente a nossa sociedade resvala para esse tipo de abordagem que é assassinar o carácter das pessoas, depreciá-las, insultá-las, incitar a violência, o ódio, sempre foi assim", lamenta. "Este país vive disso, não resolve o problema, não debate a essência dos problemas. Somos sempre conduzidos a combater as pessoas que levantam os problemas, que reivindicam ou que se opõem aos problemas".

A temática do racismo ganha protagonismo depois de Julião Cumbane, presidente do conselho de administração de uma empresa pública, se ter referido a Hélder Martins como "branco" num post nas redes sociais.

"Eu esperaria que a Procuradoria Geral da República agisse desta vez, porque estamos a chegar a um nível muito grave quando começamos a incluir questões raciais. O nosso Governo e a nossa justiça toleram isso por isso é que nunca agiram contra esses indivíduos. Isso é repugnante", conclui Fátima Mimbire.

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