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Falta de alimentos gera desespero e revolta em Cabinda

Madalena Sampaio11 de fevereiro de 2016

A população de Cabinda está cada vez mais desesperada com o aumento dos preços dos alimentos básicos, que começam a escassear. O acesso aos produtos já é limitado e as filas para comprar alimentos aumentam diariamente.

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Em 2010, ano em que esta fotografia foi tirada, Cabinda não enfrentava o problema da escassez de alimentosFoto: ISSOUF SANOGO/AFP/Getty Images

Há cada vez menos produtos nas prateleiras dos supermercados e armazéns na província mais a norte de Angola. As filas para os comprar aumentam, tal como a impaciência dos cidadãos, como revela um episódio ocorrido recentemente num dos principais centros de distribuição de produtos em Cabinda.

Um vídeo partilhado nas redes sociais mostra um grupo de populares a invadir o estabelecimento para tentar obter alimentos básicos como arroz, feijão, óleo ou farinha de milho. Os bens alimentares já começam a faltar na província e estão cada vez mais caros por causa da crise em que o país está mergulhado.

Atualmente, já ninguém pode comprar em grandes quantidades. Cada pessoa só pode levar para casa um saco de arroz, um quilo de açúcar ou um litro de óleo, por exemplo.

Karte Angola und Cabinda
Cabinda, a província mais a norte de Angola, é um enclave rico em petróleo

Há relatos de agressões por parte de populares, de cenas de violência e até de troca de tiros, confirma o ativista Bernardo Puati Tina. "O índice de invasões nos estabelecimentos comerciais nestes últimos dias aumentou muito. Há sempre roubos em todos os bairros por causa da fome. Há muita fome em Cabinda", conta.

O historiador e professor em Cabinda diz que também há pessoas que "já não conseguem andar com os seus meios de transportes pessoais por já não terem condições para os sustentar".

Filas desde madrugada

A maioria dos estabelecimentos comerciais já só abre uma ou duas horas por dia. Mas as filas de clientes começam logo pela madrugada. O economista António Panzo fez uma ronda pelos principais mercados de Cabinda e constatou que o cenário é "preocupante". "Consegui ler nos rostos de muita gente frustração por não conseguirem comprar os produtos que gostariam de comprar", relata à DW África.

Pessoas com quem conversou contaram-lhe que os comerciantes "estão a vender por cunha". Por isso, as pessoas estão "desesperadas" e dizem não estar a ser atendidas como deviam. "Mandam-nos ficar nas filas e não os atendem, mas vão atendendo as pessoas mais conhecidas".

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Por causa da diminuição das receitas com a exportação de petróleo, que fez com que entrassem menos divisas em Angola, a crise financeira, económica e cambial não pára de se agravar. Daí esta corrida aos alimentos. "Há escassez dos produtos nos mercados e isto faz com que os preços aumentem de forma vertiginosa", explica António Panzo.

O economista lembra que há escassez de produtos porque há uma redução do volume de importações e isto, de facto, dificulta a gestão dos stocks por parte dos importadores. "E a redução do volume das importações é uma consequência das dificuldades impostas no acesso às divisas".

Situação mais grave em Cabinda

A escassez de alimentos atinge várias zonas de Angola. Em Benguela, por exemplo, muitas pessoas passam a madrugada à porta dos armazéns, para tentar comprar alguns produtos. Também aqui, segundo o correspondente da DW África na província, os grandes armazéns não vendem alimentos em grandes quantidades - seguem uma orientação governamental para limitar a especulação e o mercado paralelo.

O ativista Bernardo Puati Tina considera que a situação é mais grave em Cabinda do que noutras províncias. O enclave rico em petróleo depende muito da importação de produtos dos vizinhos Congo-Brazzaville e República Democrática do Congo e tem de lidar com altas taxas alfandegárias.

Além disso, refere, "o maior empregador em Cabinda é o setor petrolífero e é neste setor que se está a registar o maior índice de desemprego". E essa faixa da população que está desempregada tem um leque de famílias que dependem dela. "Essas famílias também estão a ser sacrificadas. Muitos desses pais estão a retirar os filhos dos colégios privados e a transferi-los para o ensino público porque já não têm condições", conta o professor.

Angola Supermarket
Também em Benguela há longas filas à porta dos armazéns desde madrugadaFoto: DW/N. S. D´Angola

Não são apenas as camadas mais pobres a sofrer com a atual crise. A classe média emergente também está a ser afetada. Por isso, a contestação social pode vir a aumentar, diz o economista António Panzo. "A reação da classe média, que é a classe mais instruída, poderá ser maior, porque as pessoas não estão preparadas para este momento. E as suas reivindicações poderão aumentar, sem sombra de dúvidas".

Numa altura em que se teme um agravamento da escassez de alimentos, os especialistas dizem esperar do Governo "novas e boas políticas" para estancar a crise, que parece não ter fim à vista.

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