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Moçambique aguarda por uma nova PGR imparcial e atuante

23 de janeiro de 2019

Quem contava com pedido de demissão de Beatriz Buchili, frustrou-se. Não faz parte da cultura das lideranças moçambicanas. Meados de 2019 é a chance de se credibilizar a PGR e a responsabilidade é do Presidente Nyusi.

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Beatriz Buchili, Procuradora-geral da República de MoçambiqueFoto: DW/J. Carlos

Há anos que a Procuradoria-Geral da República (PGR) de Moçambique perdeu a confiança de muitos moçambicanos devido à sua inoperância diante de crimes envolvendo principalmente as elites políticas. A sua credibilidade já bateu no chão e daí não passa.

E o caso Manuel Chang foi a gota de água. Este órgão, liderado por Beatriz Buchili, para além de ter reagido tardiamente, pelo menos publicamente, à detenção do ex-ministro das Finanças mandatada pela justiça dos EUA deu igualmente tarde o ponto de situação sobre o caso das dívidas ocultas, processo relacionado e envolvendo a mesma pessoa.

Depois disso o jurista Vicente Manjate aguardava por uma atitude mais firme de Beatriz Buchili: "Eu esperava que amanhã ou na segunda-feira ela pedisse demissão, que renunciasse ao cargo. Não esperava até junho."

Muito provavelmente frustrou-se Vicente Manjate e muitos outros moçambicanos, pois Buchili nem deu sinais disso. E é preciso lembrar que em Moçambique não há a cultura de assumir erros e muito menos de pedir demissão em casos de erros, incompetência, incapacidade, crimes ou algo que se assemelhe.

Moçambique aguarda por uma nova PGR imparcial e atuante

Beatriz Buchili: Mandato desastroso?

Mas o caso Manuel Chang pode ser o pontapé de saída para a reviravolta, entende Manjate: "Acho que devíamos construir essa cultura começando deste caso [Manuel Chang]. Espero que daqui para frente a PGR se aperceba que a sociedade está a mais atenta a este processo e aos outros."

A lista dos casos sem desfecho ou que seguem a passo de tartaruga é infindável, defraudando as expetativas dos moçambicanos sendentos de justiça. Exemplos disso são os raptos de empresários, os casos Odebrecht e Embrarer, em que apesar dos dados disponibilizados pela justiça de outros países não desencadearam ações a altura, a ausência de ação criminal contra gestores que levaram bancos da praça a falência.

Convidado a avaliar a PGR durante o mandato de Beatriz Buchili o jurista Rodrigo Rocha comentou "primeiro o facto de nunca ter concluído ações que visassem efetivamente atacar pessoas junto do poder político. Houve efetivamente ministros que foram levados à barra da justiça, inclusivamente foram condenados. E houve casos de corrupção bastante fortes que de algum a foram tiveram um desfecho mais ou menos esperado pela sociedade civil."

E o jurista recorda que "também houve processos que não tiveram um desfecho tão satisfatório."

Rodrigo Rocha, Rechtsanwalt aus Mosambik
Rodrigo Rocha, juristaFoto: Privat

Futuro procurador deve ser  livre de amarras política

Beatriz Buchili foi nomeada pelo ex-Presidente de Moçambique, Armando Guebuza, e por isso considerada como "obediente" aos seus interesses. E o caso Manuel Chang, por exemplo, envolve figuras do mandato de Guebuza.

Mas o mandato de Buchili termina em meados de 2019 e a esperança é de que o Presidente Filipe Nyusi nomeie alguém sem amarras políticas e a altura da posição. Julho será a oportunidade para a revitalizar a PGR.

E o facto de ser um ano de eleições gerais várias correntes acreditam que Nyusi ver-se-á obrigado a satisfazer tais expetativas, sob risco de ser penalizado nas urnas.

"Deverá se encontrar alguém que não tenha qualquer conotação política e que não tenha tido uma má qualificação ou avaliação na própria PGR, mas também não via com maus olhos se fosse indicado para este cargo pessoas que já tenham sido procuradores, juízes e que estejam neste momento numa situação de jubilares", considera Rodrigo Rocha.

E concluindo afirma que "o que é preciso é que haja uma credibilização fundamental deste órgão da justiça moçambicana, uma pessoa com experiência e credibilidade dentro do panorama jurídico moçambicano."

Mosambik Präsident Filipe Nyusi
Filipe Nyusi, Presidente da RepúblicaFoto: DW/B. Jequete

Filipe Nyusi chamado à responsabilidade

Em Moçambique, a Constituição confere demasiados poderes ao Presidente da República, o que é igualmente contestado por alguns setores. É que entende-se que nalguns casos isso não garante independência e imparcialidade de atuação de alguns órgãos.

Enquanto isso permanece apenas no nível do debate, Vicente Manjate sublinha: "Quem tem a competência de nomear a procuradora também se aperceba que se não for a partir de um processo interno virá alguém fazer isso por nós. E não me parece que seja essa a vontade do Presidente da República."

E o jurista Vicente Manjate chama o Presidente da República à responsabilidade pelo menos no que se refere ao futuro da PGR: "E é necessário que se olhe para este momento como ponto de viragem da credibilidade do sistema de justiça e percepção que os cidadãos têm sobre o papel do Chefe de Estado na credibilização da justiça."

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África