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Governo de Moçambique terá "carta branca" para decidir sobre projetos de gás

Madalena Sampaio 18 de agosto de 2014

Esta terça-feira (19.08) o Parlamento moçambicano vai apreciar e aprovar a legislação que autoriza o Executivo a estabelecer um regime especial para o desenvolvimento dos projetos de gás. O projeto tem o sim da RENAMO.

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Navio de prospeção de hidrocarbonetos Saipem 10K a operar no norte de MoçambiqueFoto: ENI East

Na semana passada, a bancada da RENAMO, o maior partido da oposição, votou a favor da aprovação na generalidade da proposta de lei, em prol do “desenvolvimento do país”. Já a bancada do MDM, a segunda maior força da oposição, reprovou o projeto. Por seu lado, a sociedade civil continua a pedir mais transparência.

O Governo de Moçambique já tem “carta branca” para decidir sobre o negócio de gás. Na semana passada, a Assembleia da República aprovou, na generalidade, a proposta de lei que autoriza o Executivo a estabelecer um regime especial para o desenvolvimento dos projectos de liquefação do gás natural nas áreas 1 e 4 da bacia do Rovuma.Uma zona no norte do país onde na última década se descobriram um dos maiores depósitos mundiais de gás natural.

Com este instrumento legal, o Governo vai poder tomar decisões, como o estabelecimento de incentivos, sem ter de recorrer à consulta parlamentar, sobre os projectos que envolvem as multinacionais Anadarko e ENI. O Executivo alega que o decreto-lei é fundamental para proteger os investidores e os financiadores.

O sim da RENAMO

Além da bancada da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), no poder, também a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) votou a favor do projeto. Arnaldo Chalaua, porta-voz do grupo parlamentar da RENAMO explica que o seu partido não podia votar contra “uma prerrogativa que assiste por direito ao Governo” para resolver os problemas da população e da economia nacional.

Schiffsplattform Saipem 10K
Saipem 10K é operado pela empresa ENI na Bacia do Rovuma, província de Cabo DelgadoFoto: ENI East

“A RENAMO deu um voto de confiança, um voto favorável porque pensamos que nada obsta a que o Governo, no âmbito das suas competências, consiga ultrapassar aquelas que são as questões que preocupam os moçambicanos, sobretudo o empresariado e a economia nacional", justifica.

"Nem tudo reprovamos, mas há questões que temos que aprovar para o desenvolvimento do nosso país. O país tem que avançar. E autorizamos, assim, o Governo para resolver pontualmente as questões que, de alguma maneira, preocupam a todos", acrescentou o porta-voz.

A matéria volta agora à especialidade. Mas, segundo Arnaldo Chalaua, a aprovação da RENAMO só será viabilizada se as propostas apresentadas pelo partido forem “respeitadas”.

O porta-voz do grupo parlamentar da RENAMO também assegura que a questão da transparência nos contratos que envolvem hidrocarbonetos – e que tem sido uma das maiores exigências das organizações não-governamentais moçambicanas – continua a ser uma grande preocupação para o maior partido da oposição.

Aliás, lembra, a RENAMO não aprovou a Lei do Petróleo, agora promulgada pelo Presidente Armando Guebuza.

Primeiro aprovação da lei de acesso à informação

Arnaldo Chalaua revela que “há muito secretismo, não só para as organizações da sociedade civil, como também para os partidos políticos. Contratos e qualquer outra questão que tenha a ver com a área económica não são tornados públicos."

Para o líder parlamentar da RENAMO, "é isto que preocupa todos os moçambicanos. Há uma lei, que é a lei de acesso à informação, que a Assembleia da República devia aprovar, para os moçambicanos se poderem informar sobre vários negócios, contratos e projectos do Governo e não só.”

Lutero Simango, Mitglied der MDM-Partei
Lutero Simango, líder parlamentar do MDMFoto: DW/R.daSilva

Já a bancada do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) reprovou a proposta legislativa. Lutero Simango, chefe da bancada parlamentar da terceira força política moçambicana, explica porquê: “Em algum momento da fundamentação, o Governo alega a existência de cerca de 300 milhões de metros cúbicos de gás, mas é preciso anexar uma informação técnica e um certificado que confirme a existência dessas quantidades."

Lutero Simango revela que "o Governo não facultou a documentação técnica para poder convencer-nos, de facto, que mereciam ou não esta autorização legislativa." Por isso, o MDM decidiu que não estava "em condições de garantir um cheque em branco ao Governo.”

Parlamento dececiona sociedade civil

Organizações da sociedade civil continuam a reclamar mais transparência. Fátima Mimbire, do Centro de Integridade Pública (CIP), esperava que o Parlamento exigisse, pelo menos, mais detalhes sobre o que pretende regular o decreto-lei. Ou condicionasse a aprovação a consultas à sociedade civil e académicos.

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Afirma ainda que o decreto-lei é um instrumento legal usado de “forma abusiva” pelo Governo: “É claro que as empresas se aproveitam dessas fraquezas todas para impor as suas condições. E não há dúvidas que um decreto-lei é uma imposição."

Segundo explicações de Mimbiri, "houve um oportunismo das empresas e obviamente do Governo de negociar paralelamente esses benefícios fiscais, essas isenções." E a colaboradora do CIP questiona: "Porque é que não se diz o que se pretende extamente atribuir? Porque obviamente são mais benefícios para as empresas do que para o Estado."

Fátima Mimbiri não esconde a sua desconfiança relativamente ao Executivo moçambicano: "Os decretos-lei são uma forma que o Governo usa, para além de abusivamente, para retirar o poder de legislação do Parlamento para si.”

A organização não-governamental moçambicana, que contesta o tratamento especial dado às multinacionais petrolíferas, pediu já um debate público sobre os pormenores dos projetos de gás natural.

A DW África contactou o presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e da Legalidade, Teodoro Waty, membro sénior da FRELIMO, que preferiu prestar declarações quando for feito o relatório na especialidade, o que provavelmente acontecerá esta terça-feira (19.08).

Mosambiks Parlament
Parlamento moçambicano em MaputoFoto: DW/L.Matias
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