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Histórias de Fuga em Cabo Delgado: "A fuga"

Delfim Anacleto
2 de janeiro de 2023

Desde o início dos ataques terroristas em Cabo Delgado, em outubro de 2017, mais de 1 milhão de pessoas foram obrigadas a fugir das suas zonas de origem.

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Symbolbild I Flucht und Migration
Foto: Alfredo Zuniga/AFP

Os ataques e a fuga é algo que ninguém esquece. O trauma da violência e o desespero da procura por um local seguro deixam uma marca permanente nos deslocados.

Hoje trazemos as histórias de duas pessoas - Issufo Mussa e Lamo Bishehe - que contam como conseguiram escapar dos terroristas, durante um ataque à aldeia de Nanduli, distrito de Ancuabe, em junho de 2022.

Issufo Mussa, vítima de terrorismo, conta na primeira pessoa o "terror" da fuga.

Os terroristas entraram na aldeia de Nanduli ao início da noite. E começaram com os estragos.

"Vinham da direção de Giote e entraram na aldeia quando eram 18 horas. Começaram a queimar. Não tivemos outra alternativa senão fugir."

Foi no dia 5 de junho de 2022. Os terroristas bateram à porta de Issufo Mussa, de 45 anos de idade. Até aí, ele ouvira sempre os relatos das barbaridades cometidas noutros locais. Durante quatro anos, as ofensivas terroristas confinaram-se aos distritos mais a norte de Cabo Delgado, algumas eram no centro da província. 

Symbolbild I Flucht und Migration
Deslocados vivem no dilema "entre salvar a própria vida ou deixar tudo para trás".Foto: Alfredo Zuniga/AFP

A única saída

Mas, em junho de 2022, os ataques espalharam-se para o extremo sul de Cabo Delgado. Issufo Mussa diz que tinha em casa muitos excedentes agrícolas - e havia produtos ainda por colher nos campos de cultivo – mas tudo ficou lá. Salvar a própria vida, da sua esposa e dos seus seis filhos foi a única saída.

"Os maiores tinham a missão de carregar ao colo os mais novos. Para além de levar ao colo as crianças, levámos também vestuário, mas uma pequena quantidade, aquilo que podíamos aguentar o peso. A minha esposa conseguiu levar roupa e carregar um dos bebés."

O destino era o posto administrativo de Metoro, onde se concentrava muita gente na altura. Sem transporte, a família teve de fugir a pé.

"Percorremos a pé até uma aldeia chamada Maputo. Continuámos a caminhada noite adentro até que conseguimos alcançar a zona de Naphutha. Mas não parámos por aí, seguimos até Mbonge, Ntele até Miriangone. Finalmente chegámos a Metoro. Passámos um dia completo a fugir e, em Metoro, conseguimos apanhar um transporte que nos trouxe até Pemba", contou.

Issufo Mussa diz que os terroristas lhe incendiaram a casa, mas o mais importante foi terem sobrevivido – ele e a família. 

Symbolbild I Flucht und Migration
Vítimas do terrorismo em Cabo Delgado contam na primeira pessoa o terror da fuga.Foto: Alfredo Zuniga/AFP

Deixar tudo e seguir…

Mussa partilha a residência onde foi acolhido com Lamo Bishehe, outra vítima do terrorismo.

Lamo Bishehe, de 38 anos de idade, vem da aldeia de Nannoa, um distrito rico em recursos naturais como o grafite.

À semelhança do que aconteceu a Issufo Mussa, a comunidade de Lamo Bishehe também foi atacada pelos terroristas. E Lamo Bishehe e a família também tiveram de fugir a pé.

"Andámos a pé carregados na cabeça com poucos pertences que conseguimos recolher durante a agitação. Só conseguimos levar roupa para usar. Enxada e alimentos não conseguimos levar, deixámos”, contou.

Lamo Bishehe diz que tudo o que deixou atrás não escapou, foi queimado ou saqueado. Hoje vive em Pemba. Com ele vieram 10 membros da família, incluindo a esposa, os filhos e outros parentes. 

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