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Eleições em Angola: "Regime escolheu árbitro, VAR e campo"

Borralho Ndomba
1 de setembro de 2021

O Parlamento angolano aprovou na globalidade a alteração à lei orgânica das eleições gerais, que prevê pleito em 2022. Oposição votou contra, temendo fraude eleitoral, e a sociedade civil contesta a lei.

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UNITA
Foto: UNITA

A alteração da lei orgânica sobre as eleições gerais em Angola foi aprovada nesta quarta-feira (01.09), no Parlamento, com 126 votos dos deputados do grupo parlamentar do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder) e com 52 votos contra da oposição e uma abstenção da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA).

A retirada da contagem dos votos nos municípios é um dos pontos que divide o Parlamento, o MPLA e a oposição, em particular a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA, maior partido na oposição). O deputado Benedito Daniel disse em declaração de voto que o Partido de Renovação Social (PRS) votou contra o projeto de lei, porque a referida norma não se adequa ao modelo de eleições que se pretende em Angola.

"Todo o esforço que se empreendeu no sentido de buscar consensos, não resultou. Apenas se conseguiu o mínimo, acabando por confirmar a lei num prisma muito desajustado à realidade do nosso processo eleitoral, o que de certeza, a sua aplicação trará graves consequências", argumenta Benedito.

O deputado do PRS afirma ainda que votou contra porque não se produziu uma lei que possa corresponder às exigências eleitorais e estar à medida do desejo dos angolanos.

Para a CASA-CE, o voto do MPLA vai desacreditar o processo eleitoral de Angola. O deputado Justino Pinto de Andrade afirma que a lei vai constituir um obstáculo ao voto consciente. 

Pinto de Andrade entende que a lei aprovada irá levantar "uma série de dúvidas" sobre a veracidade do processo eleitoral. "Isto não beneficia nem Angola e nem os angolanos", frisa.

Angola Luanda | Unita
Liberty Chiyaka, líder do grupo parlamentar da UNITA, durante a votação.Foto: Borralho Mdomba/DW

"Traição à vontade dos angolanos"

O presidente do grupo parlamentar da UNITA, Liberty Chiyaka, afirma que a lei do "suicídio democrático" aprovada pelo partido no poder é uma traição à vontade dos angolanos de construírem um Estado democrático e de direito livre, próspero e moderno.

"A lei da fraude facilita o voto múltiplo e legaliza o voto desigual. O regime quer legalizar a prática fraudulenta que utilizou em 2017, quando mandou a CNE divulgar resultados que os comissários da CNE (Comissão Nacional Eleitoral) não apuraram. Para não ser acusado de violar a lei, o regime desafia o povo soberano de Angola, transformando a prática fraudulenta", diz o parlamentar do Galo Negro.

Liberty Chiyaka lembra que, para além de rejeitar manter o apuramento municipal e o apuramento provincial dos votos, o MPLA também rejeitou a proposta de controlo dos boletins de voto e centros de escrutínio pela Comissão Nacional Eleitoral e não por agentes da Casa de Segurança do Presidente da República.

"O regime escolheu o árbitro, o VAR, o campo, quer escolher o adversário e agora, quer determinar o resultado do jogo", afirma Chiyaka, pedindo ao povo angolano que seja vigilante para controlar e defender o voto em nome da transparência e verdade eleitoral.

Angola Luanda | Unita
Foto: Borralho Mdomba/DW

MPLA lamenta "birra" da UNITA

Em resposta, o deputado do MPLA Tomás da Silva diz que dos 129 artigos da lei revista, discutida na especialidade, 91% dos artigos foram aprovados por consenso.

Tomás da Silva diz que o voto contra da UNITA só pode ser por birra ou por "fantasma da fraude e desconfiança nas instituições".

"A presente lei, que aprovamos defende corretamente que a Comissão Municipal e Provincial eleitoral, apesar de não terem competências de apuramento das eleições, são-lhe reservadas outras competências no ato eleitoral, como responsável pela comunicação entre a assembleia de voto e a CNE, acompanhamento e verificação da conformidade do escrutínio", defende o deputado Tomás da Silva. 

O parlamentar do MPLA desafia a UNITA a explicar se quer eleições no próximo ano: "Assim, o partido UNITA, após votar contra a presente lei deve explicar ao povo se deseja ou não a realização das eleições gerais de 2022".

Angola Luanda | Unita
Fernando SakuayelaFoto: Borralho Mdomba/DW

Pouca chance para oposição

A discussão de diplomas eleitorais na Assembleia Nacional foi contestada pela sociedade civil angolana que, em petição pública remetida àquela instituição, exige uma CNE "totalmente independente e escrutínio em cada mesa de voto".

Os mais de 400 signatários da petição, afetos ao denominado "movimento cívico em defesa do voto justo e verdade eleitoral", exigem que o escrutínio "deve ser feito em cada mesa de voto". Na segunda-feira (30.08), vários jovens foram detidos por exigirem na portaria da Assembleia Nacional uma lei que garante eleições justas.

O coordenador do Projeto Agir, Fernando Sakuayela, diz que com esta lei há poucas oportunidades de a oposição derrotar o partido no poder: "Perspetivar a possibilidade de a oposição vencer as eleições neste quadro legal é uma hipótese muito arriscada e remota, na medida que temos um sistema bastante articulado para a fraude e a lei vem dar um brio cada vez mais sólido".

O ativista Nelson Dembo, conhecido como Gangsta, um dos detidos na manifestação da segunda-feira, lança o apelo à população para que exija a contagem dos votos nas assembleias.

"Ninguém vai sair das urnas. Vamos contar lá os votos. A nossa geração não pode falhar. Ainda que nos custe sangue, cadeia, porrada, não podemos falhar. 2022 vai ser o ano dos filhos de Angola que nasceram após a independência. João Lourenço em 2022, fora!", defende o ativista.

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