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Médico moçambicano ajuda a combater o ébola na Libéria

Joyce Copstein4 de dezembro de 2014

Jeremias Naiene está desde outubro na pequena cidade de Greenville, a convite da Organização Mundial de Saúde. À DW África, revelou que atuar na Liberia é um meio de prevenir que a epidemia chegue ao próprio país.

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Foto: privat

Único médico africano de expressão portuguesa na pequena cidade de Greenville, na Libéria, Jeremias Naiene tem trabalhado incansavelmente no combate ao ébola. O moçambicano conversou com a DW África desde Monróvia, a capital daquele país, no qual, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), mais de três mil pessoas já morreram devido à epidemia.

DW África: O que o levou a ir trabalhar com a epidemia do ébola na Libéria?

Jeremias Naiene (JR): Eu sempre fui apaixonado por trabalhos humanitários. Já trabalhei em lugares muito remotos em Moçambique e em Angola e já estava mesmo a pensar em fazer um trabalho humanitário antes mesmo de surgir o surto de ébola. Eu estava a fazer o meu mestrado na Holanda e recebi três convites por parte da Organização Mundial de Saúde. Um era para a Guiné Equatorial, outro era para Angola. E depois surgiu este sobre o ébola, que eu não pensei duas vezes e decidi aceitar o convite.

DW África: Em que nível está essa ajuda humanitária entre países do continente africano?

JR: Eu acho que está num bom nível. Embora por parte de países de expressão portuguesa eu seja o único que está cá, em termos globais, a ajuda por parte dos outros países de África é muito forte, sim. Temos uma unidade de tratamento de Ébola conduzida por médicos ugandenses. E os outros estão colocados nos distritos, dando apoio em treinamentos e supervisões.

Mosambik - Arzt Jeremias Naiene
Especialista em medicina tropical, Naiene espera atuar na reconstrução do sistema de saúde da Libéria após fim do surtoFoto: privat

DW África: Quais são as principais dificuldades que encontra no combate ao ébola?

JR: São as vias de acesso. Temos recebido casos de lugares muito remotos e, quando surge algum caso de ébola, nós temos que listar nomes das pessoas que tiveram contato com esse caso. As vias de acesso são muito precárias, então muitas vezes temos dificuldades de alcançar essas localidades e ter informação diária desses casos. Outra dificuldade é em relação à comunicação. É muito difícil fazer ligações no lugar onde estou baseado, e a internet também é muito complicada. Além do próprio transporte dos doentes com o virus do ébola dos lugares remotos para a capital ser muito complicado.

DW África: E como a população tem reagido ao surto?

JR: A população denota algum medo em algumas situações e tenta esconder os sintomas. Têm medo de estarem isolados ou sentirem-se estigmatizados. A própria cultura também, aqui em África nós somos muito aproximados aos nossos familiares. E, no tempo do ébola, quando alguém morre não se pode tocar nos cadáveres. Algumas pessoas ainda tentam resistir e tocam nos cadáveres, o que constitui uma forte ideia de transmissão da epidemia.

DW África: O senhor não tem medo de se contaminar? Apesar de todos os cuidados, existe o risco também, não?

JR: Existe sim, mas não tenho medo. Este surto não é o primeiro de grande risco com que eu trabalho. Em Moçambique trabalhei num surto de febre tifóide que, ao princípio, não se sabia o que era, como eram as vias de transmissão. Mas, por instinto, eu fui lá. Neste surto, eu até estou de certo modo excitado por estar a trabalhar cá, porque é um trabalho de sonho que tenho. Claro que estou a tomar as precauções necessárias, mas medo, não.

DW África: O senhor fica na Libéria até quando?

JR: Fico até junho de 2015. Espero que até lá já não tenhamos o surto. Estarei já a ajudar o país na reconstituição do sistema de saúde, que ficou muito fragilizado. Muitos médicos morreram da própria doença. Os serviços básicos já não estão a funcionar, só funcionam os serviços de emergência. É preciso voltar tudo à normalidade, e isso vai levar algum tempo.

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DW África: Que mensagem o senhor deixa aos compatriotas moçambicanos e aos cidadãos dos outros PALOP?

JR: Que é preciso também prevenir que o ébola chegue lá. Este é um dos objetivos que me fez vir cá, porque uma das formas de defender o país é vir combater o ébola aqui na linha de frente. A mensagem que deixo é que reforcem as medidas de higiene, lavar as mãos ou usar o gel anti-séptico, reforçar o controlo dos viajantes que venham dos países afetados. E também uma mensagem para os meus colegas, profissionais de saúde, que também é preciso seguir as medidas de proteção. Não partilhar estetoscópios de um doente para outro, usar sempre luvas e equipamentos de proteção individual. E difundir informações sobre ébola e as vias de prevenção. Assim estaremos a prevenir que chegue também aos nossos países.