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"Liberdade de imprensa altamente ameaçada na Guiné-Bissau"

3 de março de 2022

A democracia está em risco na Guiné-Bissau, avisa em entrevista à DW, em Lisboa, a jornalista vítima do ataque à Rádio Capital FM, em fevereiro. Maimuna Bari prefere continuar em Portugal por razões de segurança.

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Foto: João Carlos/DW

"Não há democracia quando os órgãos de comunicação social não são livres, quando os jornalistas são perseguidos", alerta Maimuna Bari, da Rádio Capital FM, atacada no mês passado por homens armados, uma semana depois da falhada tentativa de golpe de Estado. 

"Atacando um órgão de comunicação social, atacando os jornalistas, significa que a democracia está em perigo. Não podemos fugir [a esta realidade], não podemos tapar o céu com a mão. Isto é uma verdade", diz. 

Em entrevista exclusiva à DW, a jornalista guineense conta o que aconteceu no dia 7 de fevereiro, quando, pelas 11 horas da manhã, um grupo de homens fardados e encapuzados entrou nas instalações da rádio privada em Bissau.

Maimuna Bari estava a apresentar o noticiário com a assistência técnica de um colega, que ouviu movimentações estranhas. Pouco depois, saiu do estúdio para perceber o que estava a acontecer. "Eu abri a porta e vi três homens a entrarem com armas. Estavam mascarados. Um deles estava a atirar nos computadores da administração e dei de cara logo com outro. Ele também me viu e apontou a arma contra mim", recorda.

O ataque estendeu-se à redação, adianta a jornalista, que não conseguiu identificar os invasores. Diz que os trabalhadores da Rádio Capital já desconfiavam antes que a qualquer momento podiam ser atacados.

Ataque à Rádio Capital FM aconteceu a 7 de fevereiro passado
Ataque à Rádio Capital FM aconteceu a 7 de fevereiro Foto: Privat

"Caí e perdi os sentidos"

"Conforme estavam a atirar, os colegas estavam a gritar. Entre estas pessoas que estavam a gritar, ninguém ficou ferido. Depois percebeu-se que foram lá para destruir os equipamentos. Mal chegaram, começaram a disparar", conta a jornalista.

Fora das instalações havia outro grupo de homens armados numa carrinha. Maimuna e o técnico decidiram fugir pela porta traseira do edifício. Foi durante a tentativa de fuga que ela caiu de um muro alto que separa a rádio da Missão Evangélica. A queda terá provocado danos no braço direito e na zona lombar, com sequelas para a sua mobilidade.

"Eu caí e perdi os sentidos. Caí em cima de ferros. Era um muro alto. Não me lembro como é que saí daquele lugar. Eu e o meu colega da administração fomos depois para um quarto, que estava aberto. Estávamos a ouvir sempre gritos e disparos. Ficámos lá desesperados, com medo que nos pudessem procurar ali. De repente, parámos de ouvir os disparos", recorda.

Três feridos no ataque a rádio privada em Bissau

Em ambiente de medo e desespero, seguiram-se outros episódios para escapar aos homens armados, até que Maimuna foi levada para o Hospital de Bissau e, dias depois, evacuada de urgência para Portugal com o apoio do Sindicato dos Jornalistas da Guiné-Bissau.

Uma voz crítica

A jornalista admite que os ataques à Rádio Capital estejam relacionados com a sua postura crítica e por dar voz aos cidadãos. O ataque aconteceu minutos depois do programa mais polémico, intitulado "Frequência Ativa", terminar.

"O programa começa às 08h30 e termina às 10h30. Depois disso eu entrei para apresentar o noticiário das 11h00, e às 11h00 aconteceu o ataque contra a rádio", conclui.

Para Maimuna Bari, os ataques à Rádio Capital têm um significado. "As coisas boas" que a estação faz para o bem da população "estão a inquietar algumas pessoas no país", acrescenta. "Vê-se que alguma coisa não está a agradar a quem está a dirigir o país."

Na sequência de vários ataques a jornalistas, Maimuna Bari afirma que a liberdade de imprensa na Guiné-Bissau está ameaçada. "E essa ameaça aumentou nos últimos tempos. Esses ataques contra a rádio ferem gravemente a liberdade de imprensa e de expressão no país", onde é cada vez mais notória a deterioração da vida política e social, sublinha.

A jornalista adverte que o futuro está nas mãos dos guineenses, mas é prudente quanto ao seu regresso a Bissau. "A minha segurança está ameaçada no país, mas eu gostaria de continuar a trabalhar como jornalista seja onde for. Portanto, por enquanto, eu vou ficar aqui", revela.

Reflexões Africanas: As ameaças à democracia da Guiné-Bissau