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Tribunal Internacional para o Ruanda cessa funções

António Cascais / DPA / AFP / fq / br30 de dezembro de 2015

O Tribunal Penal Internacional para o Ruanda fecha as portas a 31 de dezembro. Observadores pedem para que se continue a apurar responsabilidades sobre o genocídio de 1994, como aconteceu na terça-feira na Alemanha.

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Sede do TPIR em ArushaFoto: picture-alliance/dpa/L. Lee Beck

Um tribunal alemão condenou na terça-feira (29.12) um ruandês a prisão perpétua por participar ativamente num massacre de centenas de refugiados tutsis numa igreja em Kiziguro, no nordeste do Ruanda, durante o genocídio de 1994.

Rwabukombe era, na altura, edil da cidade de Muvumba, a cerca de 80 quilómetros de Kiziguro. Segundo o Tribunal Regional de Frankfurt, Rwabukombe "agiu de forma deliberada", ordenando, em conjunto com outras pessoas, o assassinato de mais de 400 refugiados tutsis e orientando o transporte dos cadáveres para uma vala.

Tribunal Penal Internacional para o Ruanda cessa funções

Em 1994, no espaço de 100 dias, mais de 800 mil pessoas da minoria tutsi e hutus moderados foram perseguidos e mortos, segundo estimativas das Nações Unidas. O resto do mundo assistiu a tudo, de mãos atadas.

Após o derramamento de sangue, em novembro de 1994, foi criado o Tribunal Penal Internacional para o Ruanda (TPIR), com sede em Arusha, na Tanzânia, para julgar os responsáveis do genocídio. 21 anos depois, o tribunal fecha as portas.

"Tivemos muitos casos", diz Boubacar Diallo, até agora Procurador-Geral no TPIR. "O tribunal conseguiu levar à Justiça chefes militares e membros do Governo do Ruanda envolvidos no genocídio. Também criámos precedentes que servem hoje a tribunais nacionais e internacionais. Agora podem continuar a luta contra a impunidade nesse mundo."

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Observadores são unânimes quando dizem que, no geral, o Tribunal Penal Internacional para o Ruanda cumpriu com o seu objetivo.

Em 1998, o TPIR foi o primeiro tribunal internacional a julgar um acusado de genocídio. Quatro em cada cinco acusados de envolvimento no genocídio de 1994 foram presos nos anos seguintes e puderam ser levados à Justiça. O tribunal indiciou 93 pessoas. 61 foram julgadas e condenadas, 14 foram postas em liberdade. Outras morreram ou foram remetidas a tribunais nacionais.

Geraldine Mattioli-Zeltner, da organização dos direitos humanos Human Rights Watch, confirma que o TPIR contribuiu para o desenvolvimento de um sistema internacional de perseguição penal a autores de crimes contra a humanidade. "Foi o precursor do Tribunal Penal Internacional em Haia", diz. Ainda assim, não foi possível levar nove acusados a Arusha:

"O nosso balanço do trabalho deste tribunal é um misto de positivo e negativo. Mas de uma coisa temos a certeza: uma instituição muito importante está a fechar as portas. O TPIR mudou a forma de se reagir à violação dos direitos humanos na comunidade internacional. O Conselho de Segurança das Nações Unidas chegou à conclusão que genocídios como esse no Ruanda não podem ficar impunes. Os envolvidos têm de ser detidos e julgados."

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Cerimónia em Kigali em memória das vítimas do genocídio, 20 anos depoisFoto: Reuters

Papel de rebeldes tutsis por apurar

Mattioli-Zeltner lembra que o papel de antigos rebeldes tutsis, que ocupam hoje posições de topo no Ruanda, ficou por esclarecer. A ativista refere que o TPIR também tinha a responsabilidade de investigar os rebeldes da minoria tutsi, mas isso nunca aconteceu.

"A nossa principal crítica é que o tribunal nunca investigou o papel dos rebeldes da Frente Patriótica Ruandesa (FPR), um grupo armado liderado por Paul Kagame para acabar com o genocídio, que esta no poder até hoje. Mesmo que os crimes cometidos pelos tutsis talvez tenham sido em menor escala, não deixam de ser crimes. Consideramos problemático que esse outro lado do genocídio não tenha sido trabalhado, o que acaba por colocar em dúvida a legitimidade do Tribunal Penal Internacional em Arusha, principalmente aos olhos do povo ruandês."

E agora?

O que acontecerá agora após o fecho do TPIR, a 31 de dezembro? No Ruanda, arrastam-se os processos relativos ao genocídio, sobretudo contra civis. A ativista da Human Rights Watch, Geraldine Mattioli-Zeltner, diz que é preciso continuar a apurar responsabilidades:

"Depois do genocídio de 1994, muitos dos responsáveis fugiram para outros países. É importante que os Estados continuem atentos. E se há uma suspeita de que alguém esteve envolvido no genocídio, países terceiros também podem investigar estes casos e levar os acusados a tribunal."

Foi o que aconteceu a Onesphore Rwabukombe, cujo processo terminou esta terça-feira na cidade alemã de Frankfurt. Rwabukombe vive desde 2002 na Alemanha e foi detido há cerca de cinco anos, depois de as autoridades ruandesas e a Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol) emitirem mandados de captura.