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HistóriaÁfrica

Pico Uhuru: Porque é que os nomes são importantes?

Cai Nebe
31 de janeiro de 2024

O domínio colonial europeu em África durou mais de 70 anos. Durante este período, os colonialistas tentaram apropriar-se das terras, não só através da força e da exploração, mas também mudando-lhes o nome.

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As Sombras do Colonialismo Africano - Episódio 5
Foto: Comic Republic

Durante séculos, o povo Chagga viveu nas encostas do Monte Kilimanjaro, a montanha mais famosa e mais alta de África a que chamam pico Kibo.

Mas durante grande parte da história moderna, as crianças tanzanianas aprenderam que o Kilimanjaro foi descoberto em 1848 por um missionário alemão chamado Johannes Rebmann. Quando lá chegou, em 1889, o geógrafo alemão Hans Meyer rebatizou o Kibo de Pico Kaiser Wilhelm.

A importância cultural do Kilimanjaro para os habitantes locais foi completamente ignorada. E este não é exemplo único. Convictos de que estavam em "África para civilizar os africanos", muitos exploradores europeus quiseram impor a sua identidade neste tipo de locais. Como consequência, os nomes locais foram desvalorizados e, nalguns casos, esquecidos.

O facto de, em 1964, para comemorar o nascimento da República Unida da Tanzânia, o Pico Kaiser Wilhelm, do Kilimanjaro, se ter transformado no Pico Uhuru, que significa "liberdade" em Kiswahili, revela isso mesmo.

Durante séculos, o povo Chagga viveu nas encostas do Monte Kilimanjaro
Durante séculos, o povo Chagga viveu nas encostas do Monte KilimanjaroFoto: DW/H. Mwilima

No Vale do Rift, na África Oriental, o Lago Vitória continua a ter o nome da monarca britânica do século XIX. A Namíbia, a única colónia de povoamento da Alemanha, continua cheia de nomes alemães. A cidade de Lüderitz, por exemplo, tem o nome do primeiro alemão a comprar vastas extensões de terra e a iniciar a expansão colonial na região. Recentemente, porém, houve algumas iniciativas para mudar o nome da cidade.

Mas a renomeação de marcos famosos fazia parte de algo mais obscuro.

As conotações negativas de "Lebensraum"

Geógrafos alemães da época como Friedrich Ratzel influenciaram o pensamento colonial ao proporem que a Alemanha, enquanto "nação forte", tinha o direito de se expandir para os chamados Estados "mais fracos". A ideologia do "Lebensraum", ou lugar de habitação, foi utilizada para justificar o colonialismo alemão, e as terras conquistadas tinham de ser adaptadas à cultura alemã. Mais tarde, o "Lebensraum" tornou-se um elemento-chave do pensamento nazi.

A eliminação da identidade de um povo, mesmo depois de os meios de subsistência terem sido destruídos pela repressão e violência coloniais, foi um fator decisivo para ter controlo total.

Como são recordados os colonos?

Recordar o período do colonialismo continua a ser um desafio. Hermann von Wissmann tem má fama na África Oriental. No início do séc. XX, os imperialistas alemães chamaram-lhe "O Maior Africano da Alemanha". Em 1905, foi erguida uma estátua sua em Dar es Salaam e, na capital alemã Berlim, como em outros sítios, houve ruas batizadas em sua honra.

No entanto, na África Oriental, Wissmann e os seus soldados eram conhecidos pelo terror e subjugação das populações locais. Em 1921, a estátua de Wissmann foi retirada pelos colonialistas britânicos, tendo aparecido em Hamburgo em meados do século passado. Em 1967, uma nova geração de estudantes alemães destruiu a estátua, protestando contra a glorificação da Alemanha imperial.

Porque é que os museus alemães têm tantos restos humanos de África?

Talvez o ponto mais sensível para os tanzanianos que confrontam a Alemanha sobre o passado colonial seja a questão dos artefactos roubados e dos restos mortais saqueados aos africanos da África Oriental e levados para a Alemanha como troféus de guerra e para investigação científica sobre racismo. Centenas de crânios africanos foram retirados dos campos de batalha da era colonial ou roubados de sepulturas e levados para a Alemanha, onde foram expostos em museus ou apodreceram em coleções privadas. Poucos destes restos mortais regressaram a casa para serem honrados de acordo com os hábitos locais.

Presidente alemão Frank-Walter Steinmeier visitou Songea
Presidente alemão Frank-Walter Steinmeier visitou Songea, na Tanzânia, em novembro de 2023Foto: Bernd von Jutrczenka/dpa/picture alliance

Os historiadores tanzanianos e os familiares das pessoas que foram assassinadas durante o colonialismo exigem há anos a devolução dos restos mortais. E, apesar de existirem poucos arquivos escritos que registem a era colonial de uma perspetiva tanzaniana, as histórias orais sobre o colonialismo alemão continuam a ser transmitidas de geração em geração.

Em novembro de 2023, o Presidente alemão Frank-Walter Steinmeier visitou Songea, na Tanzânia, para pedir perdão pelas atrocidades cometidas pela Alemanha durante a guerra de Maji Maji, na qual morreram entre 120 e 300 mil africanos. Steinmeier garantiu, na altura, que a Alemanha estava a trabalhar na devolução dos restos mortais às famílias.