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Preços em Angola poderão subir mais de 40% ainda este ano

Glória Sousa29 de julho de 2016

A moeda angolana deverá ser desvalorizada mais de 20% até final do ano, segundo o documento de suporte à revisão do Orçamento Geral do Estado de 2016. O que aumentará o custo de vida, adianta economista angolano.

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Angola Markt in Viana
Foto: DW/P. Borralho

A taxa de câmbio do kwanza deverá sofrer duas desvalorizações até ao final de 2016, passando dos atuais 165,883 kwanzas para 215,477 kwanzas por dólar. A informação, avançada pela imprensa, consta do documento de Reprogramação Macroeconómica Executiva, cujas projeções servirão de base ao Orçamento retificativo de 2016.

A crise financeira e económica em Angola deve-se à forte quebra (cerca de 50%) das receitas com a exportação de petróleo por causa da redução da cotação internacional do barril de crude. A conjuntura nacional conduziu a uma forte quebra na entrada de divisas no país e a limitações no acesso a moeda estrangeira aos balcões dos bancos, dificultando as importações.

A DW África ouviu o economista angolano Francisco Miguel Paulo, do Centro de Estudos e Investigaçao Científica da Universidade Católica de Angola, que adianta que, em consequência, a taxa de inflação deverá subir mais de 40% ainda este ano.

DW África: O que vai significar para os angolanos esta contínua desvalorização do kwanza até ao final do ano?

Francisco Miguel Paulo (FMP): Vai significar um aumento do custo de vida, aumento da inflação e também escassez. O país tem tido dificuldade em importar por falta de divisas. É óbvio que com o Banco Nacional de Angola (BNA) a aumentar a taxa de câmbio os importadores terão de dar mais kwanzas para obter os mesmo dólares e eles vão, com certeza, repercutir os custos aos preços.

Angola Francisco Paulo CEIC
Economista Francisco Miguel PauloFoto: DW/G. C. Silva

O documento a que a imprensa teve acesso, que antecipa que o Governo vai fazer a desvalorização faseadamente, prevê que a taxa de inflação chege aos 44% até ao final de 2016. Há estimativas que dizem que pode ser muito mais, que a taxa de inflação pode chegar quase até aos 50%, o que terá consequências sobre a taxa de pobreza.

DW África: A desvalorização do kwanza está relacionada com o baixo preço do petróleo nos mercados internacionais?

FMP: É óbvio que o objetivo do Governo e do Banco Central é conter ao máximo as reservas internacionais líquidas. O país vive essencialmente das importações e precisa de divisas para importar. Então, uma forma de conter as reservas internacionais líquidas é aumentando o preço da divisa, ou seja, desvalorizando [o kwanza].

Desde janeiro que o BNA não desvaloriza o kwanza de uma forma significativa. Em janeiro de 2016 houve uma desvalorização na ordem dos 15%. Em fevereiro, a desvalorização foi apenas na ordem dos 2%, em março 1%, em abril 3%, em maio e junho não houve nenhuma desvalorização oficial do BNA. Só não estão a fazer mais cedo [a desvalorização], creio eu, devido à taxa de inflação que está muito elevada, para que esta não suba de uma forma descontrolada. Dados de junho demonstram que a taxa de inflação acumulada era de 21,74%, enquanto que a inflação homóloga, ou seja dos últimos 12 meses, está a volta de 31%.

Ölproduktion in Angola
Angola continua refém da exportação do petróleo, em queda nos mercados internacionaisFoto: MARTIN BUREAU/AFP/Getty Images

DW África: Tendo em conta que o kwanza já se desvalorizou várias vezes este ano, até quando se pode esperar que a moeda angolana continue a desvalorizar-se?

FMP: A desvalorização vai continuar porque o kwanza ainda está muito sobrevalorizado. O próprio Governo e o BNA sabem disso. Se fossemos às regras do mercado, é óbvio que a nossa moeda estaria muito mais desvalorizada do que está agora. Enquanto o país não conseguir aumentar as suas receitas em termos de divisas, não há outro caminho para aumentar as reservas internacionais líquidas a não ser a desvalorização do kwanza.

DW África: Porque é que o kwanza continua sobrevalorizado?

FMP: No país é mais barato importar produtos já acabados do que produzi-los internamente. Isso, em parte, devido à política cambial que se tem seguido, porque o agente económico obtém mais lucros, em termos imediatos, comercializar produtos importados no país do que produzir para comercializar. O BNA tende a controlar a taxa de câmbio para controlar a taxa de inflação.

Em Angola há uma correlação muito forte entre e a taxa de inflação a taxa de câmbio. E o BNA usa sempre a taxa de câmbio, ou as reservas internacionais líquidas, como âncora para poder estabilizar a taxa de inflação. O que faz com que a nossa moeda esteja sobrevalorizada. A taxa de câmbio real, ainda que não haja estimativas certas, acreditamos que estaria nos 180-190 kwanzas por dólar.

DW África: Na sua opinião, o que é necessário fazer para travar a contínua desvalorização da moeda?

FMP: A solução de médio e longo prazo seria a diversificação das nossas exportações. Porque se tivessemos produtos alternativos ao petróleo, é óbvio que o país não se iria ressentir tanto com a diminuição do preço [do petróleo] no mercado internacional, pois teriamos outros produtos exportados que poderiam ser fontes de divisa. Enquanto não houver uma diversificação das nossas exportações, o país vai continuar a viver o problema da desvalorização do kwanza.

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E economicamente, se tivessemos uma produção interna relevante, essa desvalorização do kwanza seria uma vantagem para os produtores nacionais.Assim, os estrangeiros iriam achar mais barato comprar coisas em Angola, porque com o mesmo dólar teriam mais kwanzas do que se a taxa de câmbio estivesse valorizada. Mas como não temos produção interna exportável, nós não conseguimos beneficiar desta desvalorização do kwanza.

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