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HistóriaAlemanha

Dibobe: De objeto de exposição a ativista anticolonial

Cai Nebe
14 de fevereiro de 2024

Em meados de 1896, um camaronês fez parte de uma exposição para aumentar o entusiasmo pelo colonialismo alemão. Mal se sabia que este homem, Martin Dibobe, se tornaria um ativista pioneiro dos direitos humanos.

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Foto: Comic Republic

Quem foi Quane Martin Dibobe?

Dibobe nasceu perto de Douala, nos Camarões, em 1876. O o seu pai era um político local. Foi alfabetizado numa missão nos Camarões, onde aprendeu a ler e escrever em alemão. Veio para a Alemanha em meados dos anos 1890 para fazer parte da "Grande Exibição de Berlim".

Como foi a primeira exposição colonial alemã de 1896?

O objetivo da feira era mostrar que a Alemanha era uma "terra de oportunidades ilimitadas". Estava em curso um esforço concertado de propaganda para convencer os alemães de que era correto que a Alemanha tivesse colónias. Em exibição estavam também exposições etnológicas sobre o quotidiano nas colónias. Hoje, chamaríamos a isso de "zoológico humano".

Dibobe foi apenas um dos mais de 100 africanos que vieram a Berlim - alguns levados à força, outros atraídos por promessas de pagamento. Vieram de territórios ocupados por alemães na Namíbia, Togo, Tanzânia e Camarões - Hereros, Nama, Masai, todos levados do continente para a exibição. Dibobe era conhecido apenas como o "Número 76". Na realidade, ele e os outros nadam tinha a ver com o "nativo primitivo" apresentado nessas "aldeias artificiais".

Cerca de 7 milhões de alemães visitaram a exposição que durou seis meses, para ver Dibobe e os seus companheiros, enquanto eram forçados a representar uma vida imaginária - a cozinhar, a dançar e a caçar - numa falsa aldeia africana.

Inauguração de um memorial em homenagem a Martin Dibobe na Alemanha
Inauguração de um memorial em homenagem a Martin Dibobe na Alemanha Foto: picture-alliance/dpa/T. Rückeis

Dibobe e muitos outros foram obrigados a submeter-se a exames corporais humilhantes realizados por estudantes da recente ciência racial alemã, com o objetivo de provar a entretanto desacreditada pseudo-ciência da eugenia.

O que fez Dibobe depois da exposição?

Dibobe ficou em Berlim, o que não era incomum. Os poucos africanos eram frequentemente aceites em espaços cosmopolitas e podiam arranjar empregos ou fazer formações profissionais. Dibobe tornou-se artesão antes de entrar na companhia ferroviária de Berlim. Casou-se com a filha do seu senhorio depois de o missionário que o batizou nos Camarões ter confirmado a sua identidade.

Em 1902, Dibobe tornou-se maquinista do metro de Berlim - um emprego de prestígio na época - e tornou-se uma espécie de celebridade.

Mais tarde escreveu: "Com diligência e uma conduta impecável, ganhei uma posição de confiança".

 Martin Dibobe e os seus colegas maquinistas na Alemanha
Martin Dibobe e os seus colegas maquinistas na Alemanha Foto: BVG Archiv

Dibobe voltou aos Camarões?

As autoridades coloniais enviaram-no de volta aos Camarões em 1907 para prestar consultoria na construção de uma linha férrea. As infrestruturas alemãs nos Camarões continuam de pé até hoje. E alguns historiadores falam de uma "nostalgia" da era alemã, especialmente quando comparada às práticas exploradoras dos franceses e britânicos, que assumiram o controlo das colónias alemãs depois de 1919.

No entanto, Dibobe ficou chocado com os espancamentos, expropriações, racismo e maus-tratos que os camaroneses sofreram às mãos das empresas alemãs.

Qual era o estatuto dos súbditos coloniais alemães?

De volta à Alemanha, Dibobe participou em greves de trabalhadores, apoiadas pelos sociais-democratas, e pertenceu à Liga dos Direitos Humanos, uma organização criada em 1914. E à medida que os negros chegavam a Berlim, Hamburgo e Bremen, Dibobe e muitos outros que permaneceram na Alemanha encontravam-se em terreno desconhecido no que diz respeito à cidadania.

As autoridades, no entanto, não tinham intenção de lhes dar os mesmos direitos que tinham os cidadãos alemães, pois isso significaria que a lei teria de ser aplicada igualmente nas colónias.

Assim, em 1919, em nome dos africanos a viverem nas colónias alemãs, Dibobe e outros 17 afro-alemães apresentaram uma petição ao Governo a solicitar, entre 32 pontos, direitos iguais e o fim do trabalho forçado, ao mesmo tempo que juravam lealdade ao Governo alemão da República de Weimar.

O memorial é na casa onde o ativista Dibobe viveu na Alemanha
O memorial é na casa onde o ativista Dibobe viveu na AlemanhaFoto: picture-alliance/dpa/T. Rückeis

O que aconteceu à petição de Dibobe? 

Como a Alemanha cedeu as suas colónias a outras nações europeias, no âmbito do Tratado de Versalhes, as exigências da petição nunca foram reconhecidas.

Dibobe perdeu o emprego de maquinista. Tentou regressar aos Camarões, em 1922, mas o novo colonizador francês recusou-lhe a entrada por acreditar que ele causaria distúrbios. Em vez disso, Dibobe, com 45 anos, mudou-se para a Libéria e não se sabe o que lhe aconteceu. Presume-se que tenha morrido lá.

Como resultado, Dibobe não é muito conhecido nos Camarões, já que a maior parte do seu legado é reconhecido na Alemanha.

Mas um século depois, a sua petição é considerada um dos documentos políticos mais importantes dos migrantes africanos da primeira metade do século XXI. 

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