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Ataques em Cabo Delgado: Precisa-se de "políticas públicas"

27 de agosto de 2020

O primeiro livro moçambicano sobre o terrorismo no país é lançado esta quinta-feira (27.08) e sugere que a resposta ao fenómeno em Cabo Delgado passa por políticas públicas com o objetivo de diminuir a marginalização.

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Symbolbild | Im Norden Mosambiks sind 50 Zivilisten von Dschihadisten ermordet worden
Foto: AFP/J. Nhamirre

"Terrorismo em África" é o primeiro livro moçambicano que aborda o terrorismo em Moçambique. De autoria do docente e investigador Rufino Sitoe, a obra é lançada esta quinta-feira (27.08) em Maputo e pretende contribuir para o entendimento do que está a acontecer em Cabo Delgado desde finais de 2017 -  quando ataques têm sido perpetrados por grupos armados, deixando 1.060 mortos e afetando 250 mil pessoas, segundo as Nações Unidas. 

O especialista em resolução de conflitos e políticas públicas defende no livro que a resposta a este fenómeno "incipiente” de terrorismo no norte do país passa precisamente pela formulação de políticas públicas. Rufino Sitoe entende que a descoberta do gás em Cabo Delgado pode contribuir para o aumento das desigualdades e do sentimento de exclusão nos distritos, um fator que é facilmente instrumentalizado por parte dos grupos terroristas e que tem de ser combatido rapidamente.

O novo livro salienta ainda que o terrorismo islâmico não pode ser analisado como um fenómeno localizado em Cabo Delgado, mas sim como um problema mais abrangente - que se estende do Médio Oriente a África. Rufino Sitoe alerta ainda que é necessário agir antes que o terrorismo se alastre para a província de Nampula.

Rufino Sitoe | Author Buch Terrorism in Africa
Foto: Privat

DW África: A situação no norte de Moçambique foi o rastilho para abordar o terrorismo no continente africano?

Rufino Sitoe (RS): Sem dúvida. Foi o fenómeno que despertou a necessidade de escrever este livro, por várias razões. A principal é que quando a coisa surgiu havia muito pouco conhecimento sobre o que é efetivamente terrorismo. Ainda existe um bocado essa falta de conhecimento. E é tanto do lado das Forças de Defesa e Segurança quanto do lado da Academia também, que muito do tratamento que dava puxava de fundamentos nas teorias gerais das ciências sociais, quando o terrorismo é uma ciência específica que tem de se guiar pelos seus próprios fundamentos.

E com a coisa de Cabo Delgado surgiu esta necessidade de aprofundar e trazer o debate para a sociedade com esta fundamentação teórica e científica e de esclarecimento de aspetos básicos para se entender o terrorismo islâmico.

Mosambik Flüchtlinge vor Angriffen in Cabo Delgado in Metuge untergebracht (DW/D. Anacleto )
Conflito tem deslocado pessoas pelo norte de MoçambiqueFoto: DW

DW África: O que o levou a alargar esta situação a outros países do continente?

RS: Primeiro porque não se pode ver o terrorismo como um fenómeno localizado ao nível da província de Cabo Delgado. É um fenómeno muito mais genérico com raízes fora de Moçambique. Tem raízes no Médio Oriente e depois expandiu-se para África. Começou pela África do norte e depois foi para a Nigéria e Somália. Compreender as manifestações [do terrorismo islâmico] nesses estados é muito importante para poder compreender a manifestação do fenómeno cá em Moçambique. E isso também melhora a capacidade de resposta das Forças de Defesa e Segurança e dos vários setores da sociedade que estão envolvidos nas medidas de prevenção e combate ao fenómeno.  

DW África: As informações que chegam são muitas vezes vindas de testemunhas no terreno ou da imprensa nacional e também estrangeira. Em que medida essas fontes terão contribuído para a sistematização ou para a realização do seu trabalho?

RS: Sem dúvida que foram uma fonte muito importante. Primeiro para identificar as linhas básicas da manifestação da violência porque o terrorismo islâmico tem a sua forma de ser e de se apresentar. E essas fontes de informação foram muito importantes para começar a fazer este mapeamento porque, primeiro, o debate era se efetivamente se tratava de terroristas ou não.

Buch Terrorism in Africa
Foto: Privat

DW África: Esta é uma guerra que ainda vai a meio. Há, portanto, ainda muito a se dizer em relação a ela. Qual foi a abordagem do seu livro sobre este confronto na medida em que é um processo contínuo?

RS: Primeiro, este livro surge depois de um artigo que eu publiquei falando especialmente para as políticas públicas como algumas das estratégias de prevenção e combate. E no combate não falo só da dimensão militar, falo também do combate de contra estratégias de mobilização destes grupos. É um fenómeno que está a acontecer e que está numa fase incipiente em Moçambique. Mas há algumas coisas que já devem ser feitas de modo a evitar que o fenómeno cresça e se expanda para outras províncias. A província mais provável é Nampula pela questão religiosa e geográfica.

Eu penso que o principal contributo deste livro é o tipo de medidas que devem ser olhadas como modalidade de resposta a este fenómeno nesta fase incipiente. Falo particularmente das políticas públicas, olhando também para o facto de que Cabo Delgado é uma província que tem estado a sofrer muitas transformações nos últimos tempos por causa da descoberta do gás. Portanto, a probabilidade de aumentar-se os níveis de desigualdade e que cresçam os sentimentos de exclusão e de marginalização – que já existem - é muito maior. Isto é um factor fácil de instrumentalização por parte dos grupos terroristas. Portanto, se nós queremos olhar para este fenómeno e evitar que este fenómeno cresça e que estes grupos conquistem algum nível de legitimidade ao nível da província de Cabo Delgado nós precisamos falar seriamente de políticas públicas.

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Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África
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