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Tortura e agressões contra "crianças bruxas" na Nigéria

Adrian Kriesch / Jan-Philipp Scholz / ac22 de junho de 2016

Em muitos países africanos, dezenas de milhares de crianças são sistematicamente acusadas de bruxaria. Recém-nascidos, crianças com problemas psicológicos ou menores que sofrem de fobias são torturados e abandonados.

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Burundi Schule in Bujumbura
Foto: Getty Images/AFP/C. De Souza
Joseph, de apenas 10 anos de idade, está num campo de futebol improvisado na pequena cidade de Eket, no sudeste da Nigéria, uma das regiões mais afetadas pelos ataques a crianças acusadas de bruxaria.

Quando tira a camisola, os colegas ficam verdadeiramente assustados, pois o peito e as costas de Joseph evidenciam inúmeras e enormes cicatrizes.

Algumas das marcas são recentes, conta o rapaz. Depois da morte da sua mãe, há algumas semanas, o padrasto torturou-o com um ferro quente, pois estava convencido de que ele, o filho, era o culpado pela morte da mãe.

"Agrediu-me e acusou-me repetidamente de feitiçaria”

Nigeria Joesph Enobong Hexenverfolgung
Joseph mostra as marcas das agressões do padrastoFoto: DW/Kriesch/Scholz
Já antes da morte da mãe o rapaz fora vítima de várias agressões, recebendo, nomeadamente, chicotadas com cabos elétricos.

"Às vezes a minha mãe tentava proteger-me, mas o meu padrasto continuava a agredir-me e até dava pontapés na barriga da minha mãe."

O caso de Joseph não é um caso isolado. Os peritos dizem que centenas de crianças nigerianas são acusadas regularmente de feitiçaria. Muitas dessas crianças pagam amargamente a superstição dos adultos com a sua própria vida.

Um estudo referente à África Ocidental, encomendado pela União Europeia, chega à conclusão de que o fenómeno é antigo: sempre existiram naquela região pessoas que acusam crianças de feitiçaria ou bruxaria. É um fenómeno bastante comum, sobretudo no Estado de Akwa Ibom, no sudeste da Nigéria.

Flagelo relacionado com a religião

Arukaino Umukoro é um dos poucos jornalistas nigerianos que se debruçaram sobre o assunto. Segundo o redator no diário nigeriano "Punch" é muito difícil erradicar a superstição, pois ela existe há muitos séculos e mistura-se mesmo com a religião.

Nigeria Straßenszene in Eket Hexenverfolgung
Publicidade à igreja em Eket, no sudeste da NigériaFoto: DW/Kriesch/Scholz
Segundo Umukoro, "muitas pessoas, sobretudo em zonas rurais, responsabilizam ‘crianças bruxas’ por acidentes ou doenças como a sida. As crianças também são consideradas culpadas de outros problemas, como desemprego ou azar nos negócios".

"Esse tipo de superstição é muito comum e o que torna a questão ainda mais escandalosa é que algumas igrejas locais, em vez de combater o fenómeno, até o apoiam”, considera o jornalista.

Alguns pastores dizem às famílias “tragam a criança e vamos curá-la numa só semana”. As curas têm, no entanto, que ser pagas e não são nada baratas. Muitas pessoas acreditam nas histórias que lhes contam. Diz-se, por exemplo, que quando um bebé chora a noite inteira, é porque é um "bebé bruxo".

Bruxaria infantil é parte da tradição em muitas sociedades africanas. O assunto constitui ainda um grande tabu. Joseph, o menino de 10 anos, torturado pelo padrasto, teve sorte. As autoridades atuaram: prenderam o malfeitor, o padrasto, e colocaram Joseph num asilo especializado, onde recebe tratamento psicológico específico.

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