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Supremo angolano: Um obstáculo na luta contra a corrupção?

Manuel Luamba
30 de abril de 2021

Analistas afirmam que Tribunal Supremo angolano é um obstáculo na luta contra a corrupção por levar tempo a decidir sobre recursos que envolvem antigos titulares de cargos públicos. Porque não há quase ninguém na cadeia?

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Tribunal Supremo de Angola (foto de arquivo)

A celeridade processual no Tribunal Supremo está a ser questionada. Cerca de cinco anos depois do inicio da "cruzada contra a corrupção" pergunta-se porque não há quase ninguém na cadeia.O último a ser condenado no âmbito da luta contra corrupção e impunidade foi Manuel Rabelais, antigo diretor do Gabinete de Revitalização da Comunicação Institucional e Marketing da Administração (GRECIMA). 

À semelhança do antigo ministro da Comunicação Social de Angola, outros cidadãos envolvidos em processos de corrupção também aguardam pela decisão do Tribunal Supremo em liberdade.   

Esta realidade e a morosidade do Supremo em decidir sobre os recursos interpostos faz com que muitos cidadãos olhem para essa instância como um obstáculo à "cruzada contra a corrupção" do Presidente João Lourenço. Questionam, por exemplo, porque nenhum chamado "peixe graúdo" está na cadeia desde o início da luta contra a corrupção e impunidade em 2017.  

Falta de fiscalização

O advogado Manuel Pinheiro explica por que motivo há falta de celeridade processual no Supremo angolano. "Nos tribunais existem poucas condições de trabalho. E, por outro lado, há muitas férias judiciais. Os prazos das férias judiciais são muito longos."

Para além disso, o advogado aponta a falta de fiscalização como outra causa da morosidade. "A lei estabelece prazos, mas esses prazos não são fiscalizados. O Ministério Público, que deve defender os interesses do Estado junto dos tribunais, não promove sanções contra os diferentes operadores judiciais que provocam morosidade na tomada de decisões", afirma.

Manuel Antonio Rabelai
Manuel Rabelais, antigo diretor do GRECIMAFoto: Imago/Xinhua

A morosidade processual chega a levar mais tempo do que o imaginado. Por exemplo, o recurso da associação cívica de Cabinda Mpalabanda levou quase 15 anos para ser decidido pelo Supremo angolano. Os advogados de defesa recorreram da decisão do tribunal de primeira instância, em 2005, e apenas em finais de março foi tornado público o acórdão datado de 19 de dezembro de 2019, que extinguiu definitivamente a organização de defesa dos direitos humanos acusada de realizar actividades políticas, contrárias ao seu objeto social.

Excessiva dependência do Presidente?

O jurista Agostinho Canando diz que há uma excessiva dependência do Tribunal Supremo relativamente ao Presidente da República. "Quer queiramos quer não, o tribunal ainda está a mando do Presidente da República, tanto é que é essa última figura quem confirma e quem nomeia os venerandos juízes do Tribunal Supremo", lembra.

Segundo o jurista angolano, "alguns casos que pura e simplesmente não trazem nenhuma mais-valia para o Presidente da República, ou para os interesses políticos do país, ficam sem resposta."

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À espera de resposta do recurso interposto ao Tribunal Supremo está também o cidadão José Julino Kalupeteca, condenado a 28 anos de prisão efetiva, em abril de 2016. O responsável pela seita religiosa "A Luz do Mundo" foi acusado pelo Ministério Público da prática de homicídio de nove polícias, em abril de 2015. Volvidos cinco anos, faz-se silêncio sobre o caso no Supremo. 

O tribunal em causa "está cheio de pessoas que não têm um compromisso sério com a justiça", diz Agostinho Canando. "Porque os processos que vão parar ao Tribunal Supremo já foram analisados de facto, de direito e de mérito nos tribunais de primeira instância. Só falta verificar se aquela análise feita foi ou não de acordo com as normas. Só falta verificar se as matérias de direito foram mesma aquelas a serem aplicadas ou não. Então, em princÍpio, não devia e nem deve demorar", argumenta.

É preciso mais reconhecimento

"Não devia demorar" até porque há "bons servidores públicos no âmbito da justiça angolana", acrescenta Manuel Pinheiro, jurista angolano com cerca de 30 anos na atividade da advocacia. "Temos bons juízes, temos bons procuradores, temos boas advogadas e bons advogados, estudiosos que se preocupam com administração da justiça e que apesar das condições são pessoas que se dedicam mesmo à  administração da justiça", salienta.

Para além das condições materiais, Pinheiro propõe como solução para o sistema judicial o reconhecimento e respeito do papel desempenhado pelos advogados, bem como a formação permanente dos operadores de direito. 

"Quer seja juiz do Tribunal Supremo quer do Constitucional, quer de um tribunal de qualquer instância. Tudo isso deve ser previsto. E os cidadãos que trabalham nessa área também merecem ser reconhecidos", conclui.

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