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Ucrânia: A Europa está a começar a mudar de estratégia?

Frank Hoffmann
7 de fevereiro de 2024

Líderes da NATO alertam para ameaça crescente da Rússia atacar um país-membro da aliança nos próximos anos e pressionam os governos a investir em defesa e na capacidade de produção de armas na Europa.

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Especialistas defendem que potencial de dissuasão militar da NATO está ligado ao fornecimento de armas à UcrâniaFoto: Diego Herrera Carcedo/AA/Picture Alliance

Vários oficiais de alta patente da NATO alertaram, recentemente e quase em simultâneo, que a aliança militar se deve preparar para um conflito com a Rússia.

"Temos de compreender que não podemos dar por garantido que vivemos em paz", avisou o almirante holandês e presidente do Comité Militar da NATO, Rob Bauer, numa conferência de imprensa realizada após uma reunião de dois dias do comité no final de janeiro.

O comandante das Forças Armadas norueguesas, Eirik Kristoffersen, considera que existe uma "janela de oportunidade, talvez com a duração de um, dois ou três anos", para que os países-membros da aliança "invistam na sua defesa". Também, na Suécia, o comandante-chefe Micael Bydén apelou à sociedade e ao governo para que passem da "compreensão à ação".

Apelo dos militares aos políticos

Especialistas veem estas declarações com um apelo dos militares aos governos europeus para que mudem de estratégia no conflito com a Rússia. A esperança de que, com a imposição de sanções e o fornecimento de armas por parte do Ocidente, a guerra na Ucrânia fosse curta não se concretizou, diz à DW o especialista alemão em segurança Nico Lange.

Almirante holandês Rob Bauer
"Temos de compreender que não podemos dar por garantido que vivemos em paz", avisou o almirante holandês Rob BauerFoto: NATO/IMS

O que preocupa os militares e os analistas é, sobretudo, a falta de novos equipamentos de guerra e munições e a fraca capacidade de produção militar na Europa.

O potencial de dissuasão militar da NATO está intimamente ligado ao fornecimento de armas à Ucrânia. No ano passado, a União Europeia prometeu fornecer a Kiev um milhão de granadas até março de 2024. O plano falhou.

Nico Lange
Nico Lange, especialista alemão em segurançaFoto: DW

Um dos motivos, diz Nico Lange, foi a demora do governo alemão em dar garantias de compra aos fabricantes de armamentos.

"Isso está a ser feito agora, passados dois anos" de guerra, diz o especialista em defesa. "A procura não é apenas elevada na Ucrânia, mas também nos depósitos de munições vazios dos países da NATO", acrescenta.

Investir na produção de armamento

Outros especialistas alertam que, na melhor das hipóteses, a NATO tem cerca de cinco anos para recompor o seu arsenal, de forma a que este sirva para dissuadir a Rússia de um ataque contra um país da aliança.

Este cálculo já tinha sido avançado, no final de 2023, pelo diretor do Centro de Segurança e Defesa do Conselho Alemão de Relações Externas, Christian Mölling, numa análise muito conceituada entre os meios militares e políticos alemães.

Christian Mölling
Christian Mölling, diretor do Centro de Segurança e Defesa do Conselho Alemão de Relações ExternasFoto: DGAP

Também numa análise recente, Gustav Gressel, do Centro Europeu sobre Relações Internacionais (ECFR), afirmou que "o Ocidente, e os europeus em particular, devem rever os seus regulamentos financeiros e criar economias de escala para promover radicalmente a produção de drones, munições, veículos de combate blindados e muito mais".

Gressel considera que a estratégia de abastecer a Ucrânia com velhas armas de produção soviética, provenientes dos armazéns dos países do Leste europeu, terminou. "Não há mais nada disponível", afirma. A solução seria elevar a capacidade de produção de armas - tanto para a Ucrânia como para os países europeus da NATO.

Desvantagem ucraniana

Neste segundo inverno de guerra na Ucrânia, tanto os militares, como os analistas dizem-se preocupados com a inferioridade das Forças Armadas ucranianas em batalhas de artilharia com a Rússia - que aparentemente consegue preencher algumas lacunas com fornecimentos da Coreia do Norte, enquanto a Ucrânia tem estado a economizar disparos.

Atualmente, o rácio é de um projétil ucraniano por cada cinco projéteis russos disparados, diz o analista Michael Kofman, do Centro de Estudos Militares norte-americano CNA, no podcast "War on the Rocks". As análises mais pessimistas falam de um rácio de um para dez.

Militares ucranianos disparam projéteis nas proximidades de Avdiivka
Militares ucranianos disparam projéteis nas proximidades de AvdiivkaFoto: Ozge Elif Kizil/AA/picture alliance

Michael Kofman acredita que é possível que os ucranianos tenham de abandonar a muito disputada cidade de Avdiivka, no leste da Ucrânia. Existe também a ameaça de um grande ataque russo à cidade de Kupjansk, mais a norte.

Torna-se assim cada vez mais claro que a demora do Ocidente em fornecer munições e equipamento de guerra nos últimos dois anos está agora a levar a Ucrânia a ter de se retirar de territórios que havia conseguido reconquistar, observa o especialista Mölling.

Mudança de estratégia

No entanto, Nico Lange considera ter havido indícios de uma mudança na estratégia europeia pouco antes da Conferência de Segurança de Munique, que voltará a reunir numerosos especialistas militares ocidentais em meados de fevereiro deste ano.

Esta mudança, diz, é fruto da situação militar na Ucrânia e das análises de especialistas e militares ocidentais, que estão cientes da falta de armamento das suas próprias Forças Armadas.

Líderes da NATO pressionam governos a investir em defesa
Líderes da NATO pressionam governos a investir em defesaFoto: Funke Foto/IMAGO

O que é importante é o "desenvolvimento estruturado e de longo prazo das capacidades das Forças Armadas ucranianas, que estamos agora a abordar", disse recentemente o major-general alemão Christian Freuding, numa entrevista a jornais alemães.

Numa análise para a emissora norte-americana CNN, no início de fevereiro, o comandante-chefe das Forças Armadas ucranianas, Valerii Zaluzhnyi, deu conta de qual é, na sua opinião, "o fator decisivo" para esta guerra.

"São estes sistemas não tripulados - como os drones - juntamente com outros tipos de armas avançadas, que constituem a melhor forma de a Ucrânia evitar ser arrastada para uma guerra de trincheiras na qual não estaremos em vantagem", disse.

Valerii Zaluzhnyi, comandante-chefe das Forças Armadas ucranianas
Valerii Zaluzhnyi, comandante-chefe das Forças Armadas ucranianasFoto: Ukrainian Presidential Press Service/REUTERS

Para os cerca de 50 aliados da Ucrânia, liderados pelos Estados Unidos, isto significa fornecer cada vez mais armas de alta tecnologia.

Desde o início de fevereiro, os EUA estão a fornecer às tropas de Zaluzhnyi as chamadas bombas de precisão GLSDB, fabricadas pela empresa Boeing-Saab, com um alcance de 150 quilómetros. Isto significa que a principal rota de abastecimento do Exército russo na faixa costeira entre a Crimeia e a cidade ucraniana de Mariupol, no sul do país, está ao alcance dos ucranianos.

Há mais de um ano que Kiev esperava ter esta arma de precisão, disse Nico Lange à DW.

Para a Ucrânia, "estão a acontecer algumas coisas neste momento que vão na direção certa", acrescenta o mesmo especialista.

Resta saber se a mudança de estratégia impulsionada pelos estrategas militares ocidentais e ucranianos será realmente adotada pelos políticos europeus, que terão de garantir o financiamento para os fornecimentos de armas à Ucrânia nos próximos anos, bem como para o aumento da capacidade europeia de produção de armas.

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